
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5013931-46.2021.4.03.6105
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. JOÃO CONSOLIM
APELANTE: MARCOS ANTONIO DE SOUZA OLIVEIRA
Advogados do(a) APELANTE: ANA PAULA SILVA OLIVEIRA - SP259024-A, MATHEUS VINICIUS NAVAS BERGO - SP409297-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5013931-46.2021.4.03.6105
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. JOÃO CONSOLIM
APELANTE: MARCOS ANTONIO DE SOUZA OLIVEIRA
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OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Excelentíssimo Desembargador Federal JOÃO CONSOLIM (Relator):
Trata-se de agravo interno interposto pela parte autora, MARCOS ANTONIO DE SOUZA OLIVEIRA, visando à reforma da decisão monocrática (Id 323702978) que, em razão de o pleito aduzido na petição inicial recair sobre o restabelecimento do benefício por incapacidade temporária NB 31/629.077.312-0 desde a respectiva cessação (8.4.2021), deu parcial provimento ao seu recurso de apelação para restabelecer o mencionado benefício e convertê-lo em aposentadoria por incapacidade permanente desde a cessação (8.4.2021), deixando de acolher o pedido de fixação da DIB do benefício convertido na DER do benefício NB 31/623.652.090-2 (21.6.2018), por aplicação do princípio da adstrição.
Em suas razões recursais, a parte agravante alega que: restou comprovado que o início da sua incapacidade total e permanente para o trabalho ocorreu em 4.5.2018; esteve em gozo do benefício por incapacidade temporária ininterruptamente, sendo que, quando cessado o mencionado benefício (NB 31/623.652.090-2), em 5.8.2019, foi imediatamente implantado o benefício NB 31/629.077.312-0, com DIB em 6.8.2019; a jurisprudência do colendo Superior Tribunal de Justiça é pacífica no sentido de admitir a fungibilidade de benefícios; essa fungibilidade deve ser estendida à fixação da DIB na data do início da incapacidade permanente, uma vez que nas ações previdenciárias a definição do benefício adequado se dá ao final, de acordo com as características da incapacidade apresentada, não havendo a estrita vinculação aos limites do pedido; e que o cálculo da RMI do benefício por incapacidade permanente, com observância das regras da Emenda Constitucional n. 103/2019, acarreta significativo prejuízo financeiro em desfavor do segurado. Pugna pelo provimento do agravo, para que seja reformada a decisão monocrática e fixada a DIB da aposentadoria por incapacidade permanente na DER do benefício NB 31/623.652.090-2 (21.6.2018), devendo o cálculo do benefício observar os regramentos do artigo 29, inciso II, da Lei n.8.213/1991 (Id 326192070).
Intimado, o INSS não apresentou manifestação quanto ao agravo interno.
É o relatório.
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5013931-46.2021.4.03.6105
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. JOÃO CONSOLIM
APELANTE: MARCOS ANTONIO DE SOUZA OLIVEIRA
Advogados do(a) APELANTE: ANA PAULA SILVA OLIVEIRA - SP259024-A, MATHEUS VINICIUS NAVAS BERGO - SP409297-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
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OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Excelentíssimo Desembargador Federal JOÃO CONSOLIM (Relator):
É cabível o agravo interno contra decisum proferido pelo Relator, sendo submetida a decisão unipessoal ao respectivo órgão colegiado, nos termos do artigo 1.021 do CPC.
Da tempestividade do recurso
Não se vislumbra, no caso em tela, hipótese de intempestividade recursal.
Da fungibilidade entre benefícios previdenciários e da teoria da primazia do acertamento judicial
O Direito Previdenciário é orientado por princípios fundamentais de proteção social, o que viabiliza a fungibilidade entre benefícios, bem como a flexibilização do pedido formulado inicialmente, sendo possível ao magistrado conceder benefício diverso, ainda que mais vantajoso e ausente pedido expresso, desde que preenchidos os requisitos legais.
Nesse sentido: “em matéria previdenciária, é possível ao magistrado flexibilizar o exame do pedido veiculado na peça exordial, e, portanto, conceder benefício diverso do que foi inicialmente pleiteado, desde que preenchidos os requisitos legais para tanto, sem que tal técnica configure julgamento extra ou ultra petita” (STJ, AgInt no AREsp 1.706.804, Primeira Turma, Relator Ministro GURGEL DE FARIA, DJe 29.6.2021).
Cabe anotar que a aplicação do princípio da fungibilidade no âmbito do direito previdenciário decorre da garantia ao direito ao melhor benefício a que o segurado tiver direito, nos termos da norma do artigo 122 da Lei n. 8.213/1991:
"Art. 122. Se mais vantajoso, fica assegurado o direito à aposentadoria, nas condições legalmente previstas na data do cumprimento de todos os requisitos necessários à obtenção do benefício, ao segurado que, tendo completado 35 anos de serviço, se homem, ou trinta anos, se mulher, optou por permanecer em atividade. (Restabelecido com nova redação pela Lei nº 9.528, de 1997)."
Ademais, observa-se que por ocasião do julgamento do REsp 1.727.063, o colendo Superior Tribunal de Justiça firmou a tese atinente ao Tema 995, consagrando a aplicabilidade da teoria do acertamento, orientada pelo princípio da primazia do acertamento da relação jurídica de proteção social, idealizada pelo Juiz Federal e Professor Doutor José Antônio Savaris. Porque relevantes, colaciono excertos da fundamentação do aludido julgado:
“O presente caso levanta a questão da maior efetividade no reconhecimento do direito aos segurados. Assim, na busca de integração da decisão a um sistema judicial coerente, o processo civil deve estar voltado à concretização do direito material.
Mais do que isso, o dever de coerência tem que estar atrelado à justiça do caso concreto, vale dizer, assim como o direito material, o direito processual também não pode ignorar a realidade.
A duração razoável do processo, para o reconhecimento do direito fundamental é opção política da Constituição de 1988 e também do Novo CPC. Assim, o processo deve ser o instrumento eficaz nessa concretização. Vale-se aqui das palavras de José Antonio Savaris no sentido de que, um bem jurídico previdenciário corresponde à ideia de uma prestação indispensável à manutenção do indivíduo (José Antonio Savaris. Direito processual previdenciário, 5ª ed. Curitiba: Alteridade, 2014, p. 50)
Deveras, é preciso conduzir o processo civil previdenciário adequadamente à relação jurídica de proteção social. Neste ponto, é preciso reafirmar a orientação de que o pedido inicial na demanda previdenciária deve ser compreendido e interpretado com certa flexibilidade. O bem jurídico tutelado, de relevância social, de natureza fundamental, legitima a técnica do acertamento judicial.
A reflexão maior do caso consiste em saber se é razoável um novo ajuizamento de ação previdenciária para ver reconhecido um tempo de trabalho ou apreciada uma prova da procedência do pedido, considerando que o fato superveniente pode ser reconhecido no curso do processo em andamento.
Nessa medida, o pedido previdenciário ajuizado pode ser fungido, pois há um núcleo comum no ordenamento jurídico-previdenciário voltado à concessão do benefício previdenciário, reparadora do risco social vivido pelo autor da ação.
(...)
O princípio da economia processual é muito valioso, permite ao juiz perseguir ao máximo o resultado processual que é a realização do direito material, com o mínimo dispêndio. Assim, o fato superveniente a ser acolhido não ameaça a estabilidade do processo, pois não altera a causa de pedir e o pedido.
Aplicável, portanto, o artigo 493 do CPC/2015 em temas previdenciários, desde que mantida a causa de pedir, pois, assim como elucidado pelo Ministério Público Federal em seu parecer, é vedada a mutação dos fatos nucleares da demanda, durante seu curso.
Deveras, a causa de pedir não pode ser alterada no curso do processo. Mas este ponto exige um pronunciamento pormenorizado adicional. A identidade entre a causa de pedir e o fato a ser considerado no pronunciamento judicial, isto é, o fato superveniente, deve existir. Mas, não impede que o juiz previdenciário flexibilize o pedido do autor, para, sob uma interpretação sistêmica, julgar procedente o pedido, reconhecendo ao jurisdicionado um benefício previdenciário diverso do requerido.
Acerca da possibilidade de ser flexibilizado o pedido, na interpretação sistêmica direcionada à proteção do risco vivido pelo autor, no âmbito do direito previdenciário, é firme o posicionamento do STJ de que em matéria previdenciária deve-se flexibilizar a análise do pedido contido na petição inicial, não se entendendo como julgamento extra ou ultra petita a concessão de benefício diverso do requerido na inicial.
(...)
Oportuno apontar a motivação contida na decisão da lavra do Ministro Jorge Mussi, no ARESP 75.980/SP, DJe 5/3/2012 no sentido de que não pode o Magistrado, se reconhecer devido o benefício, deixar de concedê-lo ao fundamento de não ser explicito o pedido, tendo em vista o caráter eminentemente protetivo e de alto alcance social da lei previdenciária. Assim, não se viola o princípio da congruência, se se flexibilizar a interpretação do pedido previdenciário. O que realmente deve prevalecer é a concretização de uma prestação previdenciária (REsp n. 1.727.063/SP, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 23/10/2019, DJe de 2/12/2019.)”
Em outras oportunidades, o Superior Tribunal de Justiça já havia se pronunciado acerca da flexibilização da análise do pedido inicial, em matéria previdenciária: “É firme a orientação desta Corte de que não incorre em julgamento extra ou ultra petita a decisão que considera de forma ampla o pedido constante da petição inicial, para efeito de concessão de benefício previdenciário” (REsp 1.584.771/RS, Primeira Turma, Relatora Ministra Regina Helena Costa, DJe 30.5.2019); “O Superior Tribunal de Justiça tem o entendimento consolidado de que não constitui julgamento extra ou ultra petita a decisão que, em atenção aos termos da congruência, concede providência jurisdicional diversa da requerida, por interpretação lógico-sistemática da peça inicial” (AgInt no REsp 1.749.671/SP, Primeira Turma, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, DJe 4.4.2019); e “Este STJ tem firme entendimento, no sentido de que diante da relevância social e alimentar dos benefícios previdenciários, pode o julgador conceder benefício diverso ao pleiteado na inicial, desde que preenchidos os requisitos legais para tanto” (AgInt no AREsp 1.292.976/RJ, Primeira Turma, Relator Ministro Sérgio Kukina, DJe 18.9.2018).
Ainda importa anotar que a teoria do acertamento também se aplica a casos de revisão de benefício previdenciário. Nesse sentido: TRF/3ª Região, ApCiv 5003103-14.2022.4.03.6183, Décima Turma, Relatora Desembargadora Federal Leila Paiva Morrison, DJEN 18.6.2024.
Da compensação de valores recebidos a título de benefícios não acumuláveis à luz do Tema 1207 do Superior Tribunal de Justiça
A compensação de valores atinentes a benefício previdenciário recebido pelo segurado se distingue da devolução. Com efeito, diversamente da compensação, a devolução somente ocorre nos casos em que nenhum benefício é devido ao segurado.
A compensação entre o valor pago, administrativamente, pelo INSS com aquele decorrente de condenação judicial, atinentes a períodos coincidentes, se mostra adequada, pois obsta o duplo pagamento e, consequentemente, o enriquecimento ilícito.
A Lei n. 8.213/1991 veda a acumulação de benefícios previdenciários, ressalvando as hipóteses de permissão legal:
"Art. 124. Salvo no caso de direito adquirido, não é permitido o recebimento conjunto dos seguintes benefícios da Previdência Social:
I - aposentadoria e auxílio-doença;
II - mais de uma aposentadoria;
III - aposentadoria e abono de permanência em serviço;
IV - salário-maternidade e auxílio-doença;
V - mais de um auxílio-acidente;
VI - mais de uma pensão deixada por cônjuge ou companheiro, ressalvado o direito de opção pela mais vantajosa.
Parágrafo único. É vedado o recebimento conjunto do seguro-desemprego com qualquer benefício de prestação continuada da Previdência Social, exceto pensão por morte ou auxílio-acidente."
Acerca do tema, a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU) decidiu, por maioria, negar provimento ao Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei n. 5068010-43.2016.4.04.7100, fixando a seguinte tese: “no cálculo das parcelas atrasadas do benefício concedido judicialmente, devem ser compensados todos os valores recebidos em período concomitante em razão de benefício inacumulável, sendo que a compensação deve se dar pelo total dos valores recebidos, não se podendo gerar saldo negativo para o segurado” (Tema 195).
Tal entendimento se coadunava com o posicionamento do colendo Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que o cumprimento do título judicial deveria passar pela compensação integral dos positivos e negativos em todas as competências e, caso fosse apurado um resultado negativo, ou seja um débito do segurado, este estaria desincumbido de proceder à devolução de valores pagos por erro da administração e percebidos de boa-fé (STJ, REsp n. 1416903/PR, Segunda Turma, Relator Ministro OG FERNANDES, DJe 23.8.2017), bem como de que não se revelava ilegal a utilização dos chamados “juros negativos” para fins de posterior compensação, revelando-se mero artifício contábil (STJ, AgRg no AREsp n. 608.564/RS, relator Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 18.12.2014, DJe de 3.2.2015).
Frise-se que este julgador filiava-se ao entendimento acima, pois a técnica de simplesmente "zerar" o resultado negativo, obtido mês a mês, não se mostra adequada, pois ela resulta em aumento do valor devido ao segurado, em comparação com o cálculo realizado pela técnica de dedução ao final (no montante integral). Na primeira hipótese, a consequência seria a violação da regra matemática da “propriedade comutativa” (a ordem não altera o resultado) a qual dá sustentação à possibilidade de aplicação de qualquer uma das técnicas mencionadas, dedução mês a mês ou ao final, em seu montante integral.
Todavia, o colendo Superior Tribunal de Justiça, em sede de julgamento dos REsp 2039614/PR, 2039616/PR e 2045596/RS, como representativo de controvérsia, submeteu a julgamento a questão, para definir se a dedução deverá abranger todo o quantum recebido ou ter como teto o valor referente à parcela decorrente do benefício concedido judicialmente. E em recente julgamento, acórdão publicado em 28.6.2024, firmou a tese de que “A compensação de prestações previdenciárias, recebidas na via administrativa, quando da elaboração de cálculos em cumprimento de sentença concessiva de outro benefício, com elas não acumulável, deve ser feita mês a mês, no limite, para cada competência, do valor correspondente ao título judicial, não devendo ser apurado valor mensal ou final negativo ao beneficiário, de modo a evitar a execução invertida ou a restituição indevida”.
Em consulta ao sítio eletrônico do Superior Tribunal de Justiça, verifica-se que o acórdão foi publicado em 28.6.2024 e transitou em julgado em 7.4.2025.
O artigo 927 do CPC determina que os acórdãos em resolução de demandas repetitivas e recursos extraordinário e especial repetitivos sejam observados pelos juízes e tribunais.
Do caso dos autos
Na inicial, a parte autora pleiteou o restabelecimento do benefício de auxílio por incapacidade temporária (NB 31/629.077.312-0), desde a data em que foi cessado, bem como a respectiva conversão em aposentadoria por incapacidade permanente.
Foi proferida sentença que julgou parcialmente procedente o pedido para restabelecer o benefício de auxílio por incapacidade temporária, desde a data da respectiva cessação, o que ocorreu em 8.4.2021, e para convertê-lo em aposentadoria por incapacidade permanente, a partir de 10.5.2023, data da juntada do laudo pericial (Ids 300400598 e 300400608).
E sede de apelação, a decisão Id 323702978, ora agravada, deu parcial provimento ao recurso da parte autora, para restabelecer o benefício de auxílio por incapacidade temporária e convertê-lo em aposentadoria por incapacidade permanente a partir de 8.4.2021, data da cessação do benefício convertido.
Nas suas razões recursais, a parte agravante pleiteia o reconhecimento do seu direito à aposentadoria por incapacidade permanente, a partir da DER do benefício por incapacidade temporária NB 31/623.652.090-2 (21.6.2018), com a consequente aplicação das regras contidas no artigo 29, inciso II, da Lei n. 8.213/1991 ao cálculo da renda do benefício.
Feitas essas considerações, observo que o laudo pericial constatou a incapacidade total, permanente e omniprofissional da parte agravante, fixando a data de início da incapacidade em 4.5.2018, quando ocorreu a sua 1ª cirurgia, na qual houve a amputação de hálux e 1º metatarso (Id 300400586, p. 7).
A conclusão da perícia judicial acerca do início da incapacidade encontra respaldo no registro contido no laudo pericial administrativo do exame realizado em 13.7.2018, que, embora não a qualifique como total e permanente, indica que o início da incapacidade ocorreu em 3.5.2018 (Id 300400482, p. 3). No mesmo documento ainda consta a anotação de CID E105 (Diabetes mellitus insulino-dependente - com complicações circulatórias periféricas), bem como “segurado em incapacidade laborativa tendo em vista antecedente patológico e cirúrgico que o impede de suas atividades”.
A data de início da incapacidade em 3.5.2018, sem qualquer menção à totalidade e permanência, ainda consta nos laudos periciais administrativos dos exames realizados em 18.2.2019, 8.8.2019, 21.10.2019, 28.2.2020, 8.4.2021, sendo que, no último laudo, ainda consta “segurado em B31 há 3 anos por amputação transtársica do pé direito por pé diabético infectado”; “apresentou demora na cicatrização do coto de amputação, com infecções recorrentes” (Id 300400482, p. 4-9).
Resta demonstrado, portanto, que a parte autora atendeu a todos os requisitos que autorizam a concessão da aposentadoria por incapacidade permanente em 4.5.2018.
Importa anotar que, na inicial, a parte autora não pleiteou a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez desde a constatação da incapacidade permanente. Apenas em sede de apelação foi pleiteado que a aposentadoria por invalidez retroagisse à data da concessão do auxílio-doença NB 31/623.652.090-2, ou seja, ao dia 21.6.2018.
Nesta oportunidade, cabe reiterar que, por ocasião do julgamento do REsp 1.727.063 (Tema 995), o Superior Tribunal de Justiça, consagrando a aplicabilidade da teoria do acertamento, consignou que: “é preciso conduzir o processo civil previdenciário adequadamente à relação jurídica de proteção social”; “o pedido inicial na demanda previdenciária deve ser compreendido e interpretado com certa flexibilidade”; o acolhimento de fato superveniente não ameaça a estabilidade do processo, pois não altera a causa de pedir e o pedido; ao processo civil previdenciário aplica-se a norma do artigo 493 do Código de Processo Civil (Se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito influir no julgamento do mérito, caberá ao juiz tomá-lo em consideração, de ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a decisão); e que a flexibilização da análise do pedido inicial para reconhecer, ao jurisdicionado, direito diverso do requerido, deve decorrer de interpretação sistêmica.
Assim, a conclusão do laudo pericial, que fixou a data de início da incapacidade permanente em 4.5.2018, é fato a ser considerado para que o processo civil previdenciário seja conduzido adequadamente à relação jurídica de proteção social.
No caso concreto, portanto, há elementos que autorizam a fixação da DIB em data diversa da requerida, o que pode ser feito por analogia ao princípio da fungibilidade e com observância à da teoria do acertamento.
Nesse contexto e considerando que a parte autora pleiteou o benefício por incapacidade NB 31/623.652.090-2 em 21.6.2018 (Id 300400485); e que o termo inicial da incapacidade permanente foi fixado em 4.5.2018, é possível o restabelecimento do benefício de auxílio por incapacidade temporária e a sua conversão em aposentadoria por incapacidade permanente, com DIB em 21.6.2018.
Os valores recebidos a título de auxílio por incapacidade temporária a partir de 21.6.2018 deverão ser compensados, nos termos da tese firmada no julgamento do Tema STJ n. 1.207.
Por fim, anoto que a Renda Mensal Inicial – RMI do benefício deve calculada na forma da legislação vigente na data em que foram atendidos os requisitos para a respectiva concessão. Com efeito, o artigo 3º da Emenda Constitucional n. 103/2019 assegura, aos segurados do RGPS e do RPPS e a seus dependentes, o direito de terem observados os critérios da legislação vigente na data em que foram atendidos os requisitos para a concessão da aposentadoria ou da pensão por morte.
Ante o exposto, dou provimento ao agravo interno interposto pela parte autora, para que lhe seja concedida a aposentadoria por incapacidade permanente, com DIB fixada na DER do benefício NB 31/623.652.090-2 (21.6.2018), com a compensação dos valores já percebidos, nos termos da fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO. APOSENTADORIA. INCAPACIDADE PERMANENTE. TEORIA DO ACERTAMENTO. RMI. CÁLCULO. LEGISLAÇÃO VIGENTE NA ÉPOCA DO IMPLEMENTO DOS REQUISITOS.
1. É cabível o agravo interno contra decisum proferido pelo Relator, sendo submetida a decisão unipessoal ao respectivo órgão colegiado, nos termos do artigo 1.021 do CPC.
2. O Direito Previdenciário é orientado por princípios fundamentais de proteção social, o que viabiliza a fungibilidade entre benefícios, bem como a flexibilização do pedido formulado inicialmente, sendo possível ao magistrado conceder benefício diverso, ainda que mais vantajoso e ausente pedido expresso, desde que preenchidos os requisitos legais.
3. Por ocasião do julgamento do REsp 1.727.063 (Tema 995), o Superior Tribunal de Justiça, consagrando a aplicabilidade da teoria do acertamento, consignou que: “é preciso conduzir o processo civil previdenciário adequadamente à relação jurídica de proteção social”; “o pedido inicial na demanda previdenciária deve ser compreendido e interpretado com certa flexibilidade”; o acolhimento de fato superveniente não ameaça a estabilidade do processo, pois não altera a causa de pedir e o pedido; ao processo civil previdenciário aplica-se a norma do artigo 493 do Código de Processo Civil (Se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito influir no julgamento do mérito, caberá ao juiz tomá-lo em consideração, de ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a decisão); e que a flexibilização da análise do pedido inicial para reconhecer, ao jurisdicionado, direito diverso do requerido, deve decorrer de interpretação sistêmica.
4. A compensação entre o valor pago, administrativamente, pelo INSS com aquele decorrente de condenação judicial, atinentes a períodos coincidentes, mostra-se adequada, pois obsta o duplo pagamento e, consequentemente, o enriquecimento ilícito.
5. Em sede de apelação foi pleiteado que a aposentadoria por invalidez retroagisse à data da concessão do benefício NB 31/623.652.090-2 (21.6.2018).
6. A conclusão do laudo pericial, que fixou a data de início da incapacidade permanente em 4.5.2018, é fato a ser considerado para que o processo civil previdenciário seja conduzido adequadamente à relação jurídica de proteção social.
7. No caso concreto, há elementos que autorizam a fixação da DIB em data diversa da requerida, o que pode ser feito por analogia ao princípio da fungibilidade e com observância à da teoria do acertamento.
8. O artigo 3º da Emenda Constitucional n. 103/2019 assegura, aos segurados do RGPS e do RPPS e a seus dependentes, o direito de terem observados os critérios da legislação vigente na data em que foram atendidos os requisitos para a concessão da aposentadoria ou da pensão por morte.
9. Agravo interno da parte autora provido.
ACÓRDÃO
Desembargador Federal