Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0000448-94.2019.4.03.6334
Relator(a)
Juiz Federal LUCIANA JACO BRAGA
Órgão Julgador
15ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
23/11/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 26/11/2021
Ementa
E M E N T A
BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. PARTE QUE TEVE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ
CESSADA ADMINISTRATIVAMENTE. LAUDO NEGATIVO. PERDA AUDITIVA BILATERAL.
PERMANECEU EM BENEFÍCIO DEFERIDO JUDICIALMENTE POR CERCA DE DOZE ANOS.
FALTA DE ALTERAÇÃO SUBSTANCIAL DO QUADRO. INCAPACIDADE PARCIAL
CONFIGURADA. SÚMULA 47 DA TNU. BAIXA ESCOLARIDADE, TRABALHADORA BRAÇAL E
IDADE RELATIVAMENTE AVANÇADA. IRREAL PROBABILIDADE DE RETORNO AO
MERCADO DE TRABALHO. QUALIDADE DE SEGURADO E CARÊNCIA TAMBÉM
ATENDIDAS. RESTABELECIMENTO DO BENEFÍCIO CESSADO. SENTENÇA REFORMADA.
RECURSO DA PARTE AUTORA PROVIDO. TUTELA DE URGÊNCIA CONCEDIDA.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
15ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000448-94.2019.4.03.6334
RELATOR:45º Juiz Federal da 15ª TR SP
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RECORRENTE: SANDRA LUCIA SERRA CARDOSO
Advogados do(a) RECORRENTE: MARCIA PIKEL GOMES - SP123177-A, DANIELA
CAROLINE PIEDADE MENDES - SP405831-A, ALEXANDRE PIKEL GOMES EL KHOURI -
SP405705-A, LAILA PIKEL GOMES EL KHOURI - SP388886-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000448-94.2019.4.03.6334
RELATOR:45º Juiz Federal da 15ª TR SP
RECORRENTE: SANDRA LUCIA SERRA CARDOSO
Advogados do(a) RECORRENTE: MARCIA PIKEL GOMES - SP123177-A, DANIELA
CAROLINE PIEDADE MENDES - SP405831-A, ALEXANDRE PIKEL GOMES EL KHOURI -
SP405705-A, LAILA PIKEL GOMES EL KHOURI - SP388886-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A parte autora ajuizou a presente ação na qual requereu a concessão/restabelecimento de
benefício por incapacidade.
O juízo singular proferiu sentença e julgou improcedente o pedido.
Inconformada, a demandante interpôs o presente recurso. Alegou preliminar de cerceamento de
defesa. No mérito, pleiteou a ampla reforma da sentença.
Sem contrarrazões.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000448-94.2019.4.03.6334
RELATOR:45º Juiz Federal da 15ª TR SP
RECORRENTE: SANDRA LUCIA SERRA CARDOSO
Advogados do(a) RECORRENTE: MARCIA PIKEL GOMES - SP123177-A, DANIELA
CAROLINE PIEDADE MENDES - SP405831-A, ALEXANDRE PIKEL GOMES EL KHOURI -
SP405705-A, LAILA PIKEL GOMES EL KHOURI - SP388886-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Passo à análise do recurso.
A concessão do benefício previdenciário auxílio-doença exige, nos termos da legislação
específica (Lei 8.213/1991, art. 59 e ss.), a presença dos seguintes requisitos: (i) incapacidade
laborativa temporária superior a 15 (quinze) dias; (ii) prova da condição de segurado e sua
manutenção à época do início da incapacidade; (iii) que a doença incapacitante não seja
preexistente à filiação do segurado ao RGPS, exceto nos casos de progressão e agravamento;
e (iv) carência de 12 contribuições mensais (à exceção de algumas hipóteses).
Já para a concessão da aposentadoria por invalidez se exige, além dos referidos requisitos
previstos para a concessão de auxílio-doença, que a incapacidade seja total e permanente,
insuscetível de reabilitação do segurado para atividade diversa que lhe garanta a sobrevivência,
nos termos do que dispõem os art. 42 e ss. da Lei 8.213/1991.
Incapacidade total indica que o segurado não tem condições de exercer qualquer atividade
laboral; incapacidade permanente denota que não há prognóstico de que o segurado possa
recuperar a capacidade de trabalho para a mesma ou outra atividade.
No caso concreto, o extrato do CNIS revela que a parte autora se encontrava no gozo de
aposentadoria por invalidez, com DIB em 25/10/2007 e DCB em 16/10/2019 (NB 1516184057).
Não obstante, recebeu alta administrativa e ajuizou a presente ação com o objetivo de
restabelecimento da aposentadoria.
O estudo dos autos revela também que a aposentadoria da demandante foi deferida
judicialmente (processo n. 0001064-64.2007.4.03.6116), mediante acordo homologado em
juízo, e pela mesma doença que deu ensejo ao pedido de restabelecimento.
No caso em análise, a perícia médica, realizada em 04/12/2019, por especialista em Clínica
Geral, concluiu que a parte autora, nascida em 11/09/1965 (54 anos na data do exame), é
portadora de perda auditiva moderada, do tipo misto, com prótese auditiva. No entanto, frisou
que a demandante não se encontra incapacitada para suas atividades habituais, nos seguintes
termos:
“(...) 8.0 – Discussão e Conclusão:
Trata-se de pericianda que, de acordo com o Item “Histórico de Saúde do Laudo Pericial”,
apresenta:
“Queixa e duração: Refere importante queda da acuidade auditiva (2002 – aproximadamente.
Refere que fez cirurgia (2004). Refere que usa prótese auditiva, há cerca 12 anos.
Data de agravamento: Em 2005.
História pregressa da moléstia atual: Refere que sente dificuldade de audição, mal cheiro no
ouvido, prurido local. Refere que tem tontura e zumbidos.
Tratamentos já realizados: cirúrgico, prótese auditiva, fonoaudióloga”.
Refere estar em uso dos medicamentos: Nimesulida e cetoprofeno e venlafaxina.
De acordo com Exame Físico Pericial do Laudo:
Neurológico, “Ausência de déficits. Glasgow de 15. Pupilas Isofotorreagentes. Musculatura
ocular extrínseca sem alteração. Elevação de Pálato. Mobilidade de Língua preservada.
Pragmatismo preservado.
Otoscopia: orelha direita com presença de trabeculações, possível ver membrana timpânica
translúcida. Orelha esquerda com rolha de cerume atrapalhando a visualização de membrana
timpânica que se apresenta mais opacificada. Ausência de hiperemia de conduto.
Dor referida à palpação de região mastoide.
Malanpatti I. Mobilidade cervical preservada, cadeias linfonodais não palpáveis (cervical anterior
e posterior).
Prova de rommberg negativo ausência de nistagmo. Prova index sem alterações.
Pericianda capaz de ouvir a intensidade de voz discretamente aumentada. Capaz de ouvir
comando sem a prósteses com a voz com maior intensidade. Pericianda fala com a voz com
intensidade aumentada. Capaz de ouvir e falar com próteses auditivas. ”.
De acordo com anexo 23, página 29 de processo:
- “ (...)Data Exame: 28/05/2018. História: Exame Físico: empregada domestica, portadora de
disacusia bialteral, esteve em tratamento,segundo relatorio medico dra vanessa nogueira, no
amb de otorrino da famema. Que informa adaptação de protese auditiva com sucesso. Exame
Físico: Periciada em bom estado geral , sinais vitais preservados, corada , hidratada , acianótica
, anictérica , eupneica , afebril, orientada no tempo e no espaço, colaborativa ao exame
deambulando normalmente e entrando só na sala de perícia. Asseada e devidamente trajada.
Mantem conversação em tom coloquial sem dificuldades. Considerações: Considerando exame
físico, adaptação de prótese auditiva com sucesso e relatório medico apresentado reúne
condições de exercer atividade laboral declarada. Resultado: Não existe incapacidade
laborativa (...)”
Pericianda, de acordo com item 3.0 de laudo pericial com perda auditiva moderada, do tipo
misto, com prótese auditiva. De acordo com anexo 23 página 29 (com adaptação a prótese
auditiva).
Em exame físico pericial não evidenciada ataxia, déficits motores.
Mediante aos elementos obtidos, nesta perícia médica, nesta data, no entender deste perito:
- Apesar de patologia, não foi possível se obter elementos para se comprovar incapacidade
laborativa para as atividades referidas, no momento e no entender do perito.
- Não é possível se estabelecer nexo de causalidade ou concausalidade entre as atividades
laborais e as referidas lesões.
- Não há incapacidade para atos da vida civil.
- Não há dependência de terceiros para as atividades do dia a dia.
(...)”
Pois bem.
Os laudos dos médicos particulares, anexados ao feito no evento 02, corroboram a doença da
parte autora e indicam que não houve alteração significativa do quadro. A bem da verdade,
embora tenha havido adaptação da autora com o longo período em uso de prótese auditiva, não
houve recuperação da audição.
Ademais, colhe-se do laudo que a demandante conta com 56 anos de idade, baixa escolaridade
e trabalhou nos últimos anos em atividades braçais como empregada doméstica e atualmente
dona de casa. Recebeu aposentadoria por invalidez deferida judicialmente mediante
homologação de acordo de 2007 a 2019, quando o benefício foi cessado.
Não há nos autos notícia de alteração substancial do quadro de saúde da parte autora desde o
deferimento judicial da prestação.
De outro lado, dificilmente a parte autora conseguirá retornar ao mercado de trabalho em uma
função compatível com suas limitações. Sem mencionar a evidente estigmatização social
decorrente dos sintomas aparentes da patologia descrita. Dessa forma, e considerando ainda o
longo período de permanência em benefício, reputo caracterizada ao menos a incapacidade
parcial.
Preconiza a Súmula 47 da Turma Nacional de Uniformização:
“Uma vez reconhecida a incapacidade parcial para o trabalho, o juiz deve analisar as condições
pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por invalidez”.
As condições pessoais e sociais da parte autora, conforme já analisado, lhe são desfavoráveis.
De outro lado, anoto que no caso em análise a parte autora está com o mesmo quadro de
saúde que tinha na época da aposentadoria, concedida judicialmente.
Essa circunstância, aliada à falta de demonstração de alteração do quadro fático, enseja a
manutenção do benefício, única solução possível para a preservação da autoridade da coisa
julgada formada no processo anterior.
Nestes termos, quer pela falta de demonstração de alteração fática do quadro desde a data da
formação da coisa julgada no processo anterior, quer pelas condições sociais desfavoráveis, o
benefício deve ser mantido.
Estando a demandante em gozo de benefício previdenciário até 16/10/2019, mantém sua
qualidade de segurada (art. 15, I, da Lei 8.213/1991).
A carência de 12 contribuições mensais também foi atendida (art. 25, I).
Preenchidos os requisitos legais, deve ser restabelecida a aposentadoria por invalidez, em seu
valor integral.
Em relação à data de início do benefício, observo que se trata de segurada que teve o benefício
de aposentadoria por invalidez indevidamente cessado, devendo, dessa forma, ser
restabelecida a prestação com pagamento de todas as verbas devidas desde então, inclusive
as decorrentes do decréscimo da parcela mensal em virtude da incidência do artigo 47 da Lei
8.213/91.
Nestes termos, dou provimento ao recurso da parte autora, para reformar a sentença e
restabelecer a aposentadoria por invalidez NB 32/1516184057, a partir de sua cessação, com
indenização de todo o período no qual a segurada recebeu o benefício de forma parcial em
virtude da implantação da mensalidade de recuperação (art. 47 da Lei 8.213/91).
O INSS pagará as diferenças acumuladas, corrigidas monetariamente desde o vencimento das
prestações até a data do efetivo pagamento, observada a prescrição quinquenal, valor a ser
apurado pela Contadoria do Juízo.
Considerando o disposto no art. 3º da Lei nº 10.259/01, combinado com art. 292, §§ 1º e 2º do
Código de Processo Civil, a soma do valor das prestações em atraso e doze parcelas vincendas
não pode exceder a 60 (sessenta) salários mínimos, considerada a data do ajuizamento da
demanda, ficando tal soma, se excedente, limitada a tal valor. Não se limitam, porém, as
demais parcelas vencidas no curso da ação. Tratando-se de critério de competência absoluta,
não há óbice à aplicação da limitação de ofício.
Sobre os atrasados incidirão juros de mora, desde a citação, bem como correção monetária,
nos termos da Resolução nº 267/2013 do CJF.
Eventuais pagamentos administrativos ou judiciais a mesmo título deverão ser descontados das
parcelas devidas.
Por derradeiro, passo a apreciar o pedido de tutela provisória.
Para a concessão de tutela provisória de urgência (art. 294 do CPC), o art. 300, caput, exige
cumulativamente: (i) a probabilidade do direito (fumus boni iuris); e (ii) o perigo de dano ou o
risco ao resultado útil do processo (periculum in mora).
No caso concreto, ambos os requisitos foram atendidos.
Mais do que simples fumus boni iuris, tem-se a certeza do direito da autora, pois a questão foi
aqui apreciada em cognição exauriente.
O periculum in mora se faz presente em virtude do caráter alimentar do benefício.
Nesse quadro, defiro a tutela de urgência, determinando que o INSS restabeleça a
aposentadoria por invalidez em favor da parte autora, no prazo de 45 dias, sob pena de multa
diária de R$ 500,00, limitado o total a R$ 10.000,00, nos termos do art. 537 do CPC.
Esclareço que essa determinação é restrita à obrigação de fazer, não abrangendo, portanto, o
pagamento de parcelas vencidas antes e durante o curso do processo, que será feito após o
trânsito em julgado, com expedição de precatório ou requisição de pequeno valor, em
observância ao art. 100 da Constituição Federal e ao art. 17 da Lei 10.259/2001.
Acrescento que os recursos cabíveis contra este acórdão (embargos de declaração, pedido de
uniformização e recurso extraordinário) não são dotados de efeito suspensivo (arts. 995, 1.026,
caput e § 1º, e 1.029, § 5º, do CPC). Por conseguinte, o acórdão irradia efeitos desde a sua
publicação.
Ante todo o exposto, dou provimento ao recurso da parte autora, nos termos da fundamentação
acima.
Oficie-se ao INSS para que cumpra a tutela provisória de urgência aqui deferida.
Fixo os honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação (ou da
causa, na ausência daquela), devidos pela parte recorrente vencida. A parte ré ficará
dispensada desse pagamento se a parte autora não for assistida por advogado ou for assistida
pela DPU (Súmula 421 STJ). Na hipótese de a parte autora ser beneficiária de assistência
judiciária gratuita e recorrente vencida, o pagamento dos valores mencionados ficará suspenso
nos termos do § 3º do art. 98 do CPC – Lei nº 13.105/15.
Dispensada a elaboração de ementa na forma da lei.
É o voto.
E M E N T A
BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. PARTE QUE TEVE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ
CESSADA ADMINISTRATIVAMENTE. LAUDO NEGATIVO. PERDA AUDITIVA BILATERAL.
PERMANECEU EM BENEFÍCIO DEFERIDO JUDICIALMENTE POR CERCA DE DOZE ANOS.
FALTA DE ALTERAÇÃO SUBSTANCIAL DO QUADRO. INCAPACIDADE PARCIAL
CONFIGURADA. SÚMULA 47 DA TNU. BAIXA ESCOLARIDADE, TRABALHADORA BRAÇAL
E IDADE RELATIVAMENTE AVANÇADA. IRREAL PROBABILIDADE DE RETORNO AO
MERCADO DE TRABALHO. QUALIDADE DE SEGURADO E CARÊNCIA TAMBÉM
ATENDIDAS. RESTABELECIMENTO DO BENEFÍCIO CESSADO. SENTENÇA REFORMADA.
RECURSO DA PARTE AUTORA PROVIDO. TUTELA DE URGÊNCIA CONCEDIDA.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Quinta Turma
Recursal de São Paulo decidiu, por unanimidade, dar provimento ao recurso da parte autora,
nos termos do voto da Relatora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA