
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002435-25.2023.4.03.6113
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: ANDREIA CRISTINA DA ROCHA RODRIGUES
Advogado do(a) APELANTE: LEONARDO PEDROSA OLIVEIRA - SP330483-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002435-25.2023.4.03.6113
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: ANDREIA CRISTINA DA ROCHA RODRIGUES
Advogado do(a) APELANTE: LEONARDO PEDROSA OLIVEIRA - SP330483-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Cuida-se de apelação interposta em face de sentença, não submetida a reexame necessário, que julgou procedente o pedido de auxílio por incapacidade temporária, desde a data da perícia e mantido pelo período mínimo de seis meses, discriminados os consectários legais, antecipados os efeitos da tutela. Ademais, julgou improcedente o pedido de indenização por danos morais, condenando ambas as partes ao pagamento de honorários advocatícios.
Nas razões recursais, a parte autora impugna o termo inicial do benefício, requerendo sua retroação para o dia seguinte ao da cessação do benefício NB 635.660.582-4.
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
O Ministério Público Federal manifestou-se pela desnecessidade de sua intervenção e pelo prosseguimento do feito.
É o relatório.
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002435-25.2023.4.03.6113
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: ANDREIA CRISTINA DA ROCHA RODRIGUES
Advogado do(a) APELANTE: LEONARDO PEDROSA OLIVEIRA - SP330483-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Conheço da apelação, em razão da satisfação de seus pressupostos de admissibilidade.
Discute-se nos autos o direito da parte autora a benefício por incapacidade laboral.
A cobertura do evento incapacidade para o trabalho é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II, da Seguridade Social, especialmente no artigo 201, I, da Constituição Federal (CF/1988), cuja redação atual é dada pela Emenda Constitucional n. 103, publicada em 13/11/2019 (EC n. 103/2019):
“Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma do Regime Geral de Previdência Social, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, na forma da lei, a: I - cobertura dos eventos de incapacidade temporária ou permanente para o trabalho e idade avançada; (...)”.
Já a Lei n. 8.213/1991, aplicando o princípio da distributividade (artigo 194, parágrafo único, III, da CF/1988), estabelece as condições para a concessão desse tipo de benefício.
A aposentadoria por invalidez, atualmente denominada aposentadoria por incapacidade permanente (EC n. 103/2019), é devida ao segurado que for considerado permanentemente incapaz para o exercício de quaisquer atividades laborativas, não sendo possível a reabilitação em outra profissão.
Por sua vez, o auxílio-doença, atualmente denominado auxílio por incapacidade temporária (EC n. 103/2019), é devido ao segurado que ficar temporariamente incapacitado para o trabalho e, à luz do disposto no artigo 59 da Lei n. 8.213/1991, "não para quaisquer atividades laborativas, mas para (...) sua atividade habitual" (Direito da Seguridade Social, Simone Barbisan Fortes e Leandro Paulsen, Livraria do Advogado e Esmafe, Porto Alegre, 2005, p. 128).
São requisitos para a concessão desses benefícios, além da incapacidade laboral: a qualidade de segurado, a carência de 12 (doze) contribuições mensais, quando exigida, bem como a demonstração de que o segurado não estava previamente incapacitado ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social.
Caso reconhecida a incapacidade apenas parcial para o trabalho, o juiz deve analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de benefício por incapacidade permanente ou temporária. Pode, ainda, conceder auxílio-acidente, na forma do artigo 86 da Lei n. 8.213/1991, se a parcial incapacidade decorre de acidente de trabalho, ou de qualquer natureza, ou ainda de doença profissional ou do trabalho (artigo 20, I e II, da mesma lei).
O reconhecimento da incapacidade laboral, total ou parcial, depende da realização de perícia médica, por perito nomeado pelo Juízo, nos termos do Código de Processo Civil (CPC). Contudo, o Juiz não está adstrito unicamente às suas conclusões, podendo valer-se de outros elementos pessoais, profissionais ou sociais para a formação de sua convicção, desde que constantes dos autos.
Alguns enunciados da Turma Nacional de Uniformização (TNU) são pertinentes a esse tema.
Súmula 47 da TNU: “Uma vez reconhecida a incapacidade parcial para o trabalho, o juiz deve analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por invalidez”.
Súmula 53 da TNU: “Não há direito a auxílio-doença ou a aposentadoria por invalidez quando a incapacidade para o trabalho é preexistente ao reingresso do segurado no Regime Geral de Previdência Social”.
Súmula 77 da TNU: “O julgador não é obrigado a analisar as condições pessoais e sociais quando não reconhecer a incapacidade do requerente para a sua atividade habitual”.
No caso em análise, em observância ao princípio do tantum devolutum quantum appellatum (artigo 1.013 do Código de Processo Civil - CPC), a controvérsia recursal cinge-se ao termo inicial do benefício.
A perícia médica judicial, realizada em 14/12/2023, constatou a incapacidade laboral total e temporária da autora (nascida em 1978, sapateira/pespontadeira), por ser portadora de síndrome pós laminectomia.
O perito esclareceu:
"No caso da parte autora, baseado no exame físico realizado e documentos de interesse médico pericial anexados aos autos, é possível concluir que o quadro patológico diagnosticado apresenta sinais e sintomas de agudização, descompensação e incapacidade laboral temporária, devendo a parte autora ser mantida em tratamento conforme orientação do médico assistente, com provável adequação da medicação específica e posteriormente reavaliada.
Quanto as demais queixas apresentadas pelo Patrono na inicial, não há no exame físico atual sinais de descompensação e/ou complicações.
A PARTE AUTORA ESTÁ TOTAL E TEMPORARIAMENTE INCAPAZ PARA O TRABALHO A PARTIR DE 24/08/2023, DATA NO RELATÓRIO MÉDICO ANEXADO AO LAUDO. A PARTE AUTORA DEVERÁ SER AFASTADA DO TRABALHO POR UM PERÍODO DE 6 MESES A PARTIR DA DATA DA PERÍCIA MÉDICA JUDICIAL (14/12/2023), PARA SER SUBMETIDA AO TRATAMENTO PROPOSTO PELO MÉDICO ASSISTENTE E POSTERIORMENTE REEXAMINADA PELA PERÍCIA MÉDICA DO INSS"
Lembro, por oportuno, que o magistrado não está adstrito ao laudo pericial.
Cabe destacar que, conquanto o perito tenha fixado a data de início da incapacidade (DII) em 24/8/2023, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) firmou entendimento no sentido de que a prova técnica prestar-se-ia unicamente para nortear o convencimento do juízo quanto à pertinência do novo benefício, mas não para atestar o efetivo momento em que a moléstia incapacitante se instalou.
Confira-se (g.n):
“PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. AUSÊNCIA DE REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. CITAÇÃO VÁLIDA. MATÉRIA JÁ DECIDIDA SOB O RITO DO ART. 543-C DO CPC.
1. O tema relativo ao termo inicial de benefício proveniente de incapacidade laborativa já foi exaustivamente debatido nesta Corte, a qual, após oscilações, passou a rechaçar a fixação da Data de Início do Benefício - DIB a partir do laudo pericial, porquanto a prova técnica prestar-se-ia unicamente para nortear o convencimento do juízo quanto à pertinência do novo benefício, mas não para atestar o efetivo momento em que a moléstia incapacitante se instalou.
2. Atualmente a questão já foi decidida nesta Corte sob o rito dos recursos repetitivos (art. 543-C do CPC), restando pacificada a jurisprudência no sentido que "A citação válida informa o litígio, constitui em mora a autarquia previdenciária federal e deve ser considerada como termo inicial para a implantação da aposentadoria por invalidez concedida na via judicial quando ausente a prévia postulação". (REsp 1.369.165/SP, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, Primeira Seção, DJe 7/3/2014).
3. Recurso especial parcialmente provido”. (REsp 1311665/SC, Rel. Ministro ARI PARGENDLER, Rel. p/ Acórdão Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02/09/2014, DJe 17/10/2014)
Nesse passo, o termo inicial do benefício ora mantido fica fixado em 2/12/2021, dia seguinte ao da cessação do benefício NB 635.660.582-4, por estar em consonância com os demais elementos de prova apresentados, e com a jurisprudência dominante.
Nesse sentido, cito os precedentes:
"PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. AUXÍLIO-DOENÇA OU APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE LABORATIVA TEMPORÁRIA. DIB. MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
1. O perito concluiu pela incapacidade parcial e temporária.
2. Assim sendo, não é devido o benefício de aposentadoria por invalidez, porque não há prova da incapacidade permanente, nos termos dos artigos 42, da Lei Federal nº. 8.213/91.
3. De outro lado, há prova de incapacidade temporária, a autorizar a implantação de auxílio-doença, conforme artigo 59, da Lei Federal nº. 8.213/91.
4. Conforme jurisprudência consolidada, o termo inicial do benefício deve ser fixado na data do seu pedido administrativo e, na sua ausência, na data da citação (Súmula nº 576, do Superior Tribunal de Justiça). Deve ser fixada a data de início do benefício (DIB) em 31/01/2022.
5. Apliquem-se para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, os critérios estabelecidos pelo Manual De Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta de liquidação até a edição da EC 113/2021, a partir de quando será aplicada exclusivamente à taxa Selic.
6. “Sucumbência recursal. Inteligência do artigo 85, §3º, do Código de Processo Civil e Súmula 111, do Superior Tribunal de Justiça.”
7. Alterado, de ofício, os critérios de correção monetária e juros de mora.
8. Apelação da parte autora provida."(TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5002639-51.2023.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal JEAN MARCOS FERREIRA, julgado em 19/07/2023, DJEN DATA: 26/07/2023)
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ/AUXÍLIO-DOENÇA. REQUISITOS PREENCHIDOS. BENEFÍCIO RESTABELECIDO. SENTENÇA REFORMADA. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.
1. A concessão de aposentadoria por invalidez reclama que o requerente seja segurado da Previdência Social, tenha cumprido o período de carência de 12 (doze) contribuições, e esteja incapacitado, total e definitivamente, ao trabalho (art. 201, I, da CR/88 e arts. 18, I, "a"; 25, I e 42 da Lei nº 8.213/91). Idênticos requisitos são exigidos à outorga de auxílio-doença, cuja diferença centra-se na duração da incapacidade (arts. 25, I, e 59 da Lei nº 8.213/91).
2. Já o auxílio-acidente, previsto no artigo 86 da mesma Lei, é devido ao segurado, como indenização, quando, "após consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem sequelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia".
3. In casu, a controvérsia recursal restringe-se à incapacidade laborativa da parte autora, considerando que a qualidade de segurado e cumprimento da carência foram reconhecidos pelo juízo sentenciante, não sendo objeto de pedido recursal.
4. No que se refere ao requisito da incapacidade, o laudo pericial elaborado em 14/05/2018 (ID 95060208), atesta que a autora, nascida em 25/03/1967, 2º grau completo, empregada doméstica, é portadora de pós-operatório tardio de fratura de radio esquerdo distal consolidada com encurtamento importante e desvio radial do punho, concluindo pela sua incapacidade laborativa parcial e temporária, havendo “limitação funcional parcial no uso deste membro superior por causar dor articular, principalmente em casos de necessitar de esforços físicos intensos com o membro superior esquerdo”, desde 04/02/2015, sendo possível sua melhora através de tratamento cirúrgico, o qual a autora aguarda ser realizado no SUS, sugerindo reavaliação a partir de 1 ano da data da perícia.
6. Em que pese a incapacidade de a autora ser parcial, nota-se que para a atividade habitual de empregada doméstica essa limitação passa a ser total, pois a impede de realizar seu labor de forma que não lhe traga dor ou agravamento de sua doença.
7. O fato de a autora ter permanecida trabalhando após o início da incapacidade, de 2015 a 2018 (CNIS), não é obstáculo para a concessão do benefício por incapacidade.
8. Assim, positivados os requisitos legais, reconhece-se o direito da parte autora ao restabelecimento do auxílio-doença, a partir do dia seguinte ao da cessação do benefício, em 15/10/2015, com DCB em 14/05/2019.
9. Impõe-se, portanto, a reforma da r. sentença para o julgamento de parcial procedência dos pedidos.
10. Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, aplicam-se os critérios estabelecidos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta de liquidação, observado o quanto decidido pelo C. STF por ocasião do julgamento do RE 870947, sendo que a partir da promulgação da EC nº 113/2021, publicada em 09/12/2021, haverá a incidência da taxa Selic para fins de atualização monetária e compensação da mora, inclusive do precatório, uma única vez, até o efetivo pagamento, acumulado mensalmente.
11. A verba honorária de sucumbência incide no montante de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, conforme entendimento desta Turma (artigo 20, § 3º, do Código de Processo Civil), aplicada a Súmula 111 do C. Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual os honorários advocatícios, nas ações de cunho previdenciário, não incidem sobre o valor das prestações vencidas após a data da prolação da sentença.
12. Apelação parcialmente provida." (TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000530-58.2018.4.03.6113, Rel. Desembargador Federal MARCELO VIEIRA DE CAMPOS, julgado em 05/07/2023, DJEN DATA: 10/07/2023)
Diante do exposto, dou provimento à apelação para, nos termos da fundamentação deste julgado, alterar o termo inicial do benefício.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO POR INCAPACIDADE TEMPORÁRIA. TERMO INICIAL.
- O termo inicial da concessão do benefício por incapacidade é a prévia postulação administrativa ou o dia seguinte ao da cessação do auxílio por incapacidade temporária. Ausentes a postulação administrativa e o auxílio por incapacidade temporária, o termo a quo para a concessão do referido benefício é a citação. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
- Apelação provida.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADORA FEDERAL