
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5005334-48.2021.4.03.6183
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. LEILA PAIVA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: HORI ESTER LEAL SILVA
Advogado do(a) APELADO: VICTOR HUGO COELHO MARTINS - SP417247-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5005334-48.2021.4.03.6183
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. LEILA PAIVA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: HORI ESTER LEAL SILVA
Advogado do(a) APELADO: VICTOR HUGO COELHO MARTINS - SP417247-A
R E L A T Ó R I O
A Senhora Desembargadora Federal Leila Paiva (Relatora):
Trata-se de apelação interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) em demanda previdenciária que visa à concessão de aposentadoria por idade.
A r. sentença julgou procedente o pedido formulado, nos seguintes termos (ID 260886481):
“Com essas considerações, com espeque no inc. I do art. 487 do Código de Processo Civil, julgo procedente o pedido formulado pela parte autora, HORI ESTER LEAL DA SILVA, nascida em 27-11-1955, inscrita no Cadastro de Pessoas Físicas do Ministério da Fazenda sob o nº 034.563.348-26, em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS. Julgo procedente o pedido de concessão de aposentadoria por idade, requerida em 05-05-2017 (DER) - NB 41/183.088.350-7. Antecipo a tutela jurisdicional e determino imediata implantação do benefício de aposentadoria por idade. Valho-me do disposto no art. 300, do Código de Processo Civil. Fixo termo inicial do benefício na data do requerimento administrativo, acima citada. O extrato previdenciário da parte autora – CNIS, e a planilha de contagem de tempo de serviço acompanham a presente sentença. Atualizar-se-ão os valores conforme critérios de correção monetária e juros de mora previstos na Resolução n.º 134/2010 e normas posteriores do Conselho da Justiça Federal. Condeno a autarquia ao pagamento de honorários advocatícios arbitrados em 10% (dez por cento) sobre a soma das parcelas devidas até a data da prolação da sentença, excluídas as vincendas. Atuo com arrimo no art. 85, do Código de Processo Civil. A presente sentença não está sujeita ao reexame necessário, consoante o art. 496, § 3º, do Código de Processo Civil. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Oficie-se.”
Concedida a antecipação de tutela.
O INSS apelante alega, em síntese, que:
- a autora não preenche os requisitos para concessão da aposentadoria por idade, visto que o período de 03/1991 a 03/1996 prestado como empregada doméstica não pode ser incluído na contagem da carência, em razão de as contribuições terem sido vertidas extemporaneamente;
- o segurado empregado doméstico deve comprovar o efetivo recolhimento das contribuições relativas ao período de carência, o qual se inicia com o pagamento da primeira contribuição sem atraso, como regra geral; e
- qualquer vínculo previdenciário que não conste do Cadastro Nacional de Informações Sociais – CNIS não pode ser considerado, a não ser que comprovado documentalmente, o que não ocorreu na espécie.
Requer o provimento do recurso, para julgar improcedente o pedido de aposentadoria por idade, com a inversão dos ônus da sucumbência.
Com contrarrazões, os autos subiram a esta E. Corte Regional.
É o relatório.
lns
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5005334-48.2021.4.03.6183
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. LEILA PAIVA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: HORI ESTER LEAL SILVA
Advogado do(a) APELADO: VICTOR HUGO COELHO MARTINS - SP417247-A
V O T O
A Senhora Desembargadora Federal Leila Paiva (Relatora):
Trata-se de ação previdenciária objetivando concessão do benefício de aposentadoria por idade.
O recurso de apelação preenche os requisitos de admissibilidade e merece ser conhecido.
Da aposentadoria por idade
A aposentadoria por idade é assegurada na forma do artigo 201, § 7º, inciso II, da Constituição da República (CR), com redação da Emenda Constitucional n. 103, de 12/11/2019, publicada em 13/11/2019, que dispõe:
Art. 201. (...)
§ 7º É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, obedecidas as seguintes condições: (Redação dada pela EC nº 20, de 1998)
I - 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 62 (sessenta e dois) anos de idade, se mulher, observado tempo mínimo de contribuição; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019)
II - 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, para os trabalhadores rurais e para os que exerçam suas atividades em regime de economia familiar, nestes incluídos o produtor rural, o garimpeiro e o pescador artesanal.
No plano infraconstitucional, a aposentadoria por idade encontra-se regulamentada nos artigos 48 a 51 da Lei n. 8.213, de 24/07/1991, a Lei de Benefícios da Previdência Social (LBPS), e 51 a 54 do Decreto n. 3.048, de 06/05/1999. Por oportuno, confira-se o disposto no “caput” do artigo 48 da Lei n. 8.213/1991:
Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher. (Redação dada pela Lei nº 9.032/95)
Dos pressupostos à aposentadoria por idade
São dois os pressupostos à aposentação por idade: o requisito etário e o cumprimento do período de carência do benefício.
1. O primeiro consiste na idade mínima de 65 (sessenta e cinco) anos, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher, conforme as regras insertas no artigo 48 da Lei n. 8.213, de 24/07/1991. Anotando-se que, em face à EC n. 103, de 12/11/2019, o requisito de idade sobe para 62 (sessenta e dois) anos para as mulheres, observada, evidentemente, a regra de transição e o direito adquirido.
2. O segundo pressuposto diz respeito ao cumprimento da carência prevista nos artigos 25, inciso II, e 142 da LBPS, que se refere à necessidade de demonstração de períodos de contribuições na atividade urbana, correspondente ao ano do perfazimento do requisito etário, ainda que posteriormente (Súmula 44/TNU). O Egrégio Superior Tribunal de Justiça defende o mesmo entendimento no sentido de que a carência exigida deve levar em conta a data em que o segurado implementou as condições necessárias à concessão do benefício e não a data do requerimento administrativo, também chamada de “carência congelada”.
Vale a pena destacar as palavras dos professores Carlos Alberto de Castro e João Batista Lazzari sobre o tema: “No que diz respeito à apuração dos requisitos para a concessão da aposentadoria por idade, a jurisprudência da TNU é no sentido de ser o momento em que o requisito etário é implementado ou aquele em que o requerimento administrativo é protocolizado. No caso em referência, o relator do processo, Juiz Federal Otávio Port, considerou que levar em conta a data em que a pessoa formulou o requerimento administrativo seria uma afronta ao princípio da isonomia uma vez que distinguiria, de forma indevida, duas pessoas que, embora tendo a mesma idade e o mesmo tempo de contribuição, formularam seus requerimentos administrativos em momentos distintos (Proc. 2005.72.95.01.7041-4, DJ de 13.10.2009).” (Manual de Direito Previdenciário, 23 ed. Ed. Forense, 2020, p. 559)
Registre-se, por fim, o teor da Súmula 73/TNU: “O tempo de gozo de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez não decorrentes de acidente de trabalho só pode ser computado como tempo de contribuição ou para fins de carência quando intercalado entre períodos nos quais houve recolhimento de contribuições para a previdência social.”
Da dispensa de simultaneidade do cumprimento dos requisitos
O § 1º do artigo 102 da Lei n. 8.213/1991, incluído pela Lei n. 9.528/1997, preconiza “§ 1º A perda da qualidade de segurado não prejudica o direito à aposentadoria para cuja concessão tenham sido preenchidos todos os requisitos, segundo a legislação em vigor à época em que estes requisitos foram atendidos.”
Merece destaque o teor do § 1º do artigo 3º da Lei n. 10.666/2003:
Art. 3o A perda da qualidade de segurado não será considerada para a concessão das aposentadorias por tempo de contribuição e especial.
§ 1o Na hipótese de aposentadoria por idade, a perda da qualidade de segurado não será considerada para a concessão desse benefício, desde que o segurado conte com, no mínimo, o tempo de contribuição correspondente ao exigido para efeito de carência na data do requerimento do benefício.
Dos dispositivos legais mencionados, conclui-se que os requisitos para concessão da aposentadoria por idade urbana não precisam ser preenchidos simultaneamente. Assim, a perda da qualidade de segurado não constitui óbice para o deferimento do benefício previdenciário desde que cumprido o requisito etário para aposentadoria por idade e devidamente demonstrado ter contribuído pelo período de carência necessário ao logo de sua vida laboral.
Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR IDADE URBANA. PREENCHIMENTO SIMULTÂNEO DOS REQUISITOS. DESNECESSIDADE. REGRA DE TRANSIÇÃO DO ART. 142 DA LEI DE BENEFÍCIOS. PRECEDENTES. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO.
1. Tendo a parte recorrente sido filiada ao sistema antes da edição da Lei 8.213/1991, a ela deve ser aplicada, para fins de cômputo de carência necessária à concessão da aposentadoria por idade, a regra de transição disposta no art. 142 da Lei de Benefícios.
2. Deve beneficiar-se da regra de transição o segurado que estava vinculado ao Regime Geral da Previdência Social, mas que, por ocasião da nova Lei não mantivesse a qualidade de segurado, desde que retorne ao sistema.
3. A implementação dos requisitos para a aposentadoria por idade urbana pode dar-se em momentos diversos, sem simultaneidade. Mas, uma vez que o segurado atinja o limite de idade fixado, o prazo de carência está consolidado, não podendo mais ser alterado. A interpretação a ser dada ao art. 142 da referida Lei deve ser finalística, em conformidade com os seus objetivos, que estão voltados à proteção do segurado que se encontre no período de transição ali especificado, considerando o aumento da carência de 60 contribuições para 180 e que atinjam a idade nele fixada.
4. Com o advento da Lei 10.666/2003, que passou a disciplinar especificamente a questão da dissociação dos requisitos para obtenção do benefício, a nova sistemática não faz distinção entre o tempo anterior e o posterior à perda da qualidade de segurado.
5. O acórdão recorrido deve ser reformado, porque está em dissonância com a jurisprudência do STJ que admite a aplicação do art. 142 combinado com o § 1º do art. 3º da Lei 10.666/2003. Observância do incidente de uniformização de jurisprudência, Pet 7.476/PR.
6. O segurado que não implementa a carência legalmente exigida quando atingido o requisito etário, pode cumprí-la posteriormente pelo mesmo número de contribuições previstas para essa data. Não haverá nesta hipótese um novo enquadramento na tabela contida no art. 142 da Lei 8.213/1991, como entendeu o Tribunal a quo.
7. Recurso especial conhecido e provido, determinando-se ao INSS que refaça a contagem da carência com base na data em que a segurada atingiu a idade mínima. Inversão do ônus da sucumbência. Honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da condenação.
(REsp 1412566/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 27/03/2014, DJe 02/04/2014)
Sobre a questão, vale rememorar o teor da Súmula 2 da Turma Regional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais da 4ª Região: "Para a concessão da aposentadoria por idade, não é necessário que os requisitos da idade e da carência sejam preenchidos simultaneamente."
Da comprovação do tempo de serviço
Preconiza o artigo 55 da Lei n. 8.213/91, in verbis:
Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento, compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de segurados de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado:
I - o tempo de serviço militar, inclusive o voluntário, e o previsto no § 1º do art. 143 da Constituição Federal, ainda que anterior à filiação ao Regime Geral de Previdência Social, desde que não tenha sido contado para inatividade remunerada nas Forças Armadas ou aposentadoria no serviço público;
II - o tempo intercalado em que esteve em gozo de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez;
III - o tempo de contribuição efetuada como segurado facultativo; (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)
IV - o tempo de serviço referente ao exercício de mandato eletivo federal, estadual ou municipal, desde que não tenha sido contado para efeito de aposentadoria por outro regime de previdência social; (Redação dada pela Lei nº 9.506, de 1997)
V - o tempo de contribuição efetuado por segurado depois de ter deixado de exercer atividade remunerada que o enquadrava no art. 11 desta Lei;
VI - o tempo de contribuição efetuado com base nos artigos 8º e 9º da Lei nº 8.162, de 8 de janeiro de 1991, pelo segurado definido no artigo 11, inciso I, alínea "g", desta Lei, sendo tais contribuições computadas para efeito de carência. (Incluído pela Lei nº 8.647, de 1993)
§ 1º A averbação de tempo de serviço durante o qual o exercício da atividade não determinava filiação obrigatória ao anterior Regime de Previdência Social Urbana só será admitida mediante o recolhimento das contribuições correspondentes, conforme dispuser o Regulamento, observado o disposto no § 2º. (Vide Lei nº 8.212, de 1991)
§ 2º O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento.
§ 3º A comprovação do tempo de serviço para os fins desta Lei, inclusive mediante justificativa administrativa ou judicial, observado o disposto no art. 108 desta Lei, só produzirá efeito quando for baseada em início de prova material contemporânea dos fatos, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, na forma prevista no regulamento. (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)
§ 4º Não será computado como tempo de contribuição, para efeito de concessão do benefício de que trata esta subseção, o período em que o segurado contribuinte individual ou facultativo tiver contribuído na forma do § 2º do art. 21 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, salvo se tiver complementado as contribuições na forma do § 3o do mesmo artigo. (Incluído pela Lei Complementar nº 123, de 2006)
No que tange à prova do tempo de serviço urbano, dispõe o artigo 62, §§ 1º e 2º, I, do Decreto n. 3.048/1999 que:
Art. 62. A prova de tempo de serviço, considerado tempo de contribuição na forma do art. 60, observado o disposto no art. 19 e, no que couber, as peculiaridades do segurado de que tratam as alíneas "j" e "l" do inciso V do caput do art. 9º e do art. 11, é feita mediante documentos que comprovem o exercício de atividade nos períodos a serem contados, devendo esses documentos ser contemporâneos dos fatos a comprovar e mencionar as datas de início e término e, quando se tratar de trabalhador avulso, a duração do trabalho e a condição em que foi prestado.(Redação dada pelo Decreto nº 4.079, de 2002)
§ 1º As anotações em Carteira Profissional e/ou Carteira de Trabalho e Previdência Social relativas a férias, alterações de salários e outras que demonstrem a sequência do exercício da atividade podem suprir possível falha de registro de admissão ou dispensa. (Redação dada pelo Decreto nº 4.729, de 2003)
§ 2º Subsidiariamente ao disposto no art. 19, servem para a prova do tempo de contribuição que trata o caput: (Redação dada pelo Decreto nº 6.722, de 2008).
I - para os trabalhadores em geral, os documentos seguintes: (Redação dada pelo Decreto nº 6.722, de 2008).
a) o contrato individual de trabalho, a Carteira Profissional, a Carteira de Trabalho e Previdência Social, a carteira de férias, a carteira sanitária, a caderneta de matrícula e a caderneta de contribuições dos extintos institutos de aposentadoria e pensões, a caderneta de inscrição pessoal visada pela Capitania dos Portos, pela Superintendência do Desenvolvimento da Pesca, pelo Departamento Nacional de Obras Contra as Secas e declarações da Secretaria da Receita Federal do Brasil; (Incluído pelo Decreto nº 6.722, de 2008).
b) certidão de inscrição em órgão de fiscalização profissional, acompanhada do documento que prove o exercício da atividade; (Incluído pelo Decreto nº 6.722, de 2008).
c) contrato social e respectivo distrato, quando for o caso, ata de assembleia geral e registro de empresário; ou (Incluído pelo Decreto nº 6.722, de 2008).
d) certificado de sindicato ou órgão gestor de mão-de-obra que agrupa trabalhadores avulsos; (Incluído pelo Decreto nº 6.722, de 2008).
Cumpre ressaltar que os dados constantes no Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS) concernentes a vínculos, remunerações e contribuições têm valor probatório no tocante à filiação à previdência social, ao tempo de contribuição e aos salários-de-contribuição, consoante se extrai da legislação de regência (artigo 29-A da LBPS, com redação dada pela LC n. 128/2008 e artigo 19 do Decreto n. 3.048/1999, com redação dada pelo Decreto n. 6.722/2008).
Da veracidade dos vínculos em CTPS
Há que se considerar as anotações da carteira de trabalho gozam de presunção juris tantum de veracidade, cujo ônus da prova para desconstituição cabe à parte que a alega, no caso, ao INSS, que tem o dever de provar que a anotação não corresponde à verdade.
Esse é o entendimento do C. STJ: AgRg no REsp 1.150.515/SP, Rel. Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, j. 28/08/2012, DJe: 05/09/2012; AREsp 1.269.067/SP, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, j. 19/05/2020, DJe: 21/05/2020; REsp 1.836.247/SP, Rel. Ministro Sérgio Kukina, j. 09/09/2019, DJe: 12/09/2019; AREsp 1.538.837/PR, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, j. 21/08/2019, DJe: 02/09/2019.
Nesse mesmo sentido, a Súmula 75/TNU: “A Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) em relação à qual não se aponta defeito formal que lhe comprometa a fidedignidade goza de presunção relativa de veracidade, formando prova suficiente de tempo de serviço para fins previdenciários, ainda que a anotação de vínculo de emprego não conste no Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS).”
Por outro lado, na qualidade de empregado, eventual não recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias devidas nos períodos não pode ser atribuída ao segurado, nos termos do artigo 30, I, da Lei n. 8.212/91, mas tão somente do empregador, a quem compete ao ente autárquico fiscalizar.
Na falta de prova documental contemporânea, admite-se declaração do empregador ou seu preposto, atestado de empresa ainda existente, certificado ou certidão de entidade oficial dos quais constem os dados previstos no caput do artigo 62 do Decreto n. 3.048/1999, desde que extraídos de registros efetivamente existentes e acessíveis à fiscalização da Autarquia Previdenciária.
Do Empregado Doméstico
O empregado doméstico não era segurado obrigatório da Previdência Social anteriormente à Lei n. 5.859/1972. Somente após tal diploma legal, com a regulamentação do trabalho da empregada doméstica, passou a ser obrigatório o registro em carteira, sendo-lhes assegurados os benefícios da previdência social:
"Art. 4º - Aos empregados domésticos são assegurados os benefícios e serviços da Lei Orgânica da Previdência Social na qualidade de segurados obrigatórios."
A legislação estabeleceu, em seu artigo 5º, a responsabilidade do empregador pelos recolhimentos das contribuições previdenciárias para o custeio dos benefícios:
“Art. 5º - Os recursos para o custeio do plano de prestações provirão das contribuições abaixo, a serem recolhidas pelo empregador até o último dia do mês seguinte àquele a que se referirem e incidentes sobre o valor do salário-mínimo da região:
I - 8% (oito por cento) do empregador;
II - 8% (oito por cento) do empregado doméstico."
Com relação ao período anterior à mencionada legislação, o C. Superior Tribunal de Justiça pacificou não ser exigível o recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias (AgRg no REsp 1.103.970/SP, Quinta Turma, Relator Ministro Jorge Mussi, DJE de 19/10/2009; AgRg no REsp 931.961/SP, Quinta Turma, Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJE de 25/5/2009).
Consigne-se que o artigo 36 da Lei n. 8.213/1991 determina que incumbe à demandante tão somente comprovar o labor desempenhado na condição de empregada doméstica, dispensada para fins de concessão da aposentadoria pleiteada a demonstração do recolhimento de contribuições.
Assim, comprovado o tempo de serviço como empregada doméstica, é de rigor computá-lo, ainda que não haja prova de recolhimento das contribuições, vez que é do empregador a obrigação de recolher as contribuições previdenciárias (Lei n. 5.859/1972, artigo 5º; Decreto n. 71.885/1973, artigo 12; Lei n. 8.212/1991, artigos 30, V e 33, § 5º).
Noutras palavras, não se pode privar o empregado doméstico do benefício previdenciário por ausência de recolhimentos de contribuições, computando-se o período de labor comprovado para fins de carência.
No tocante ao período anterior à obrigatoriedade do registro em CTPS, é possível o reconhecimento do labor demonstrado por início de prova material, como declaração do ex-empregador, certidões de nascimento, casamento e da justiça eleitoral.
Da data do início do benefício (DIB)
Uma vez realizada a idade mínima e cumprido o período de carência, a aposentadoria por idade é devida ao segurado empregado, inclusive o doméstico, a partir da data do desligamento do emprego (quando requerida até noventa dias depois deste) ou da data do requerimento administrativo (quando não houve desligamento do emprego ou quando requerida após noventa dias). Para os demais empregados, tem-se como devida desde a data da entrada do requerimento.
Postas as balizas, passa-se ao exame do caso dos autos.
Do caso concreto
A parte autora nascida em 27/11/1955 cumpriu o requisito etário em 27/11/2015, quando completou 60 (sessenta) anos de idade, devendo comprovar a carência de 180 (cento e oitenta) meses.
O requerimento administrativo do benefício de aposentadoria por idade foi protocolado em 05/05/2017.
A Autarquia Previdenciária reconheceu administrativamente o total de 126 (cento e vinte e seis) meses de contribuição (ID 260886435 - Pág. 46/54).
A questão controversa nesta seara recursal refere-se à possibilidade do cômputo do período em que a autora esteve laborando como empregada doméstica (de 01/03/1991 a 30/03/1996), anotado em CTPS (ID 260886435 – Pág. 26), porém com indicação de recolhimento das contribuições de forma extemporânea e em valor abaixo do mínimo.
Destaco que, quanto ao fato do vínculo constante da CTPS não constar integralmente do CNIS, caberia ao INSS comprovar a falsidade dos períodos devidamente registrados em carteira e de suas informações, em face da presunção de veracidade de que goza referido registro. Em não o fazendo, mantem incólume e apto à formação da convicção do magistrado no exercício de sua função judicante, uma vez que a carteira de trabalho goza de presunção juris tantum de veracidade, consoante preconiza o Enunciado 13/TST e a Súmula 225/STF.
Outrossim, os recolhimentos das contribuições previdenciárias decorrentes de vínculo empregatício doméstico são devidos pelo empregador, cabendo ao INSS, e não ao empregado doméstico, a fiscalização, ainda que sejam anteriores à vigência da Lei Complementar n. 150/2015.
Nesse sentido, segue a jurisprudência:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE URBANA. ART. 48, "CAPUT", E § 3º DA LEI 8.213/91. RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES DO EMPREGADO DOMÉSTICO. ÔNUS DO EMPREGADOR. CARNÊS DE RECOLHIMENTO CONFIRMADOS POR MICROFICHAS. REQUISITOS PREENCHIDOS. BENEFÍCIO DEVIDO.
1. O benefício de aposentadoria por idade urbana do segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social até a data de entrada em vigor da Emenda Constitucional n° 103/2019, observada a regra de transição prevista em seu art. 18, passa, necessariamente, pela consideração de dois requisitos: a) idade mínima de 65 anos, se homem, ou de 60 anos, se mulher, acrescida, neste caso, a partir de 1° de janeiro de 2020, em 6 meses a cada ano, até atingir 62 anos; e b) período de carência (art. 48, "caput", da Lei nº 8.213/91).
2. Quanto aos segurados filiados ao Regime Geral de Previdência Social após a entrada em vigor da Emenda Constitucional n° 103/2019, até que lei disponha sobre o tempo de contribuição a que se refere o inciso I do § 7º do art. 201 da Constituição Federal, a aposentadoria por idade urbana passa pela consideração dos seguintes requisitos: a) idade mínima, de 65 anos, se homem, ou 62 anos, se mulher; e b) tempo de contribuição, de 15 anos, se mulher, e 20 anos, se homem.
3. No caso de segurada empregada doméstica com vínculo empregatício devidamente anotado em CTPS, o dever de recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias é ônus do empregador, ainda que sejam anteriores a LC nº 150/2015, não havendo que se falar em dever do empregado doméstico em fiscalizar a tempestividade do primeiro recolhimento.
4. Assim, a eventual desídia do empregador não pode ser imputada em desfavor do empregado, de modo que o art. 27, inciso II, da Lei n° 8.213/91 não se aplica à hipótese aventada para o fim de afastar a possibilidade de cômputo do período reconhecido para efeito de carência.
5. No mais, os carnês de recolhimento com rasuras e sobrescritos foram confirmados por provas complementares, quais sejam as microfichas anexadas à exordial.
4. Apelação desprovida.
(TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000362-89.2020.4.03.6144, Rel. Desembargador Federal NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR, julgado em 19/04/2022, Intimação via sistema DATA: 29/04/2022)
Assim, há que se computar integralmente como carência o período laborado pela autora como empregada doméstica de 01/03/1991 a 30/03/1996.
Somados o vínculo como empregada doméstica de 01/03/1991 a 30/03/1996 ao período já reconhecido administrativamente (126 contribuições), alcança-se a carência necessária para aposentação, nos termos vindicados, totalizando 14 (quatorze) anos, 11 (onze) meses e 6 (seis) dias, correspondentes a 187 (cento e oitenta e sete) meses de carência na DER, conforme a planilha: https://planilha.tramitacaointeligente.com.br/planilhas/HZ6W9-FXBZN-GT927.
Desse modo, verifica-se que a parte autora cumpriu o período de carência previsto na Lei de Benefícios, fazendo jus ao benefício previsto no artigo 48 da Lei n. 8.213/1991.
O termo inicial da concessão do benefício deve ser fixado na data do pedido na esfera administrativa (05/05/2017 - ID 260886435 - Pág. 53/54), nos termos do artigo 49 da LBPS.
As prestações vencidas deverão ser corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora.
Ajuizada a presente ação em 05/05/2021, decorrido menos de 5 (cinco) anos da data do indeferimento administrativo, em 30/08/2017 (ID 260886435 - Pág. 53/54), inocorrente, in casu, a prescrição quinquenal.
Atente-se que os valores pagos, na via administrativa ou por força de decisão judicial, a título de benefícios inacumuláveis no período, deverão ser integralmente abatidos do débito.
Finalmente, quanto ao eventual prequestionamento suscitado, assinalo não haver qualquer infringência à legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
Custas e despesas processuais
A Autarquia Previdenciária é isenta do pagamento de custas e emolumentos no âmbito da Justiça Federal e nas ações processadas perante a Justiça Estadual de São Paulo, por força do artigo 4º, I, da Lei Federal n. 9.289/1996, e do artigo 6º da Lei Estadual paulista n. 11.608/2003.
A isenção, por sua vez, não a exime do reembolso das despesas judiciais eventualmente recolhidas pela parte vencedora, desde que devidamente comprovada nos autos, consoante o parágrafo único do referido artigo 4º da Lei n. 9.289/1996.
Quanto às demandas aforadas no Estado de Mato Grosso do Sul, a isenção prevista nas Leis Estaduais sul-mato-grossenses ns. 1.135/1991 e 1.936/1998 foi revogada pela Lei Estadual n. 3.779/2009 (artigo 24, §§ 1º e 2º), razão pela qual cabe ao INSS o ônus do pagamento das custas processuais naquele Estado.
Por fim, caberá à parte vencida arcar com as despesas processuais e as custas somente ao final, na forma do artigo 91 do CPC.
Consectários legais
A correção monetária e os juros de mora incidirão conforme a legislação de regência, observando-se os critérios preconizados pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal.
Quanto aos juros, destaque-se que são devidos até a data da expedição do ofício precatório ou da requisição de pequeno valor (RPV), conforme o Tema 96/STF, cristalizado pelo C. STF no julgamento do RE 579.431, observando-se, a partir de então, o teor da Súmula Vinculante 17/STF.
Dos honorários advocatícios
Em razão da sucumbência recursal, majoro os honorários advocatícios fixados na r. sentença em 2% (dois pontos percentuais), observadas as normas do artigo 85, §§ 3º, 5º e 11, do CPC.
Da tutela antecipada
Mantenho a tutela antecipada concedida por ocasião da r. sentença.
Na hipótese da necessidade de outras medidas executivas, estas devem ser requeridas perante o r. Juízo de origem, competente para tanto, ainda que o processo esteja nesta instância.
Dispositivo
Ante o exposto, nego provimento à apelação do INSS, nos termos da fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. EMPREGADA DOMÉSTICA. VÍNCULOS ANOTADOS EM CTPS. PRESUNÇÃO DE VERACIDADE. CARÊNCIA IMPLEMENTADA. BENEFÍCIO DEVIDO.
- São dois os pressupostos à aposentação por idade: o requisito etário e o cumprimento do período de carência do benefício.
- A idade mínima é de 65 (sessenta e cinco) anos, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher, conforme as regras insertas no artigo 48 da Lei n. 8.213, de 24/07/1991. Anotando-se que, em face à EC n. 103, de 12/11/2019, o requisito de idade sobe para 62 (sessenta e dois) anos para as mulheres, observada, evidentemente, a regra de transição e o direito adquirido.
- A carência é prevista nos artigos 25, inciso II, e 142 da LBPS, que se refere à necessidade de demonstração de períodos de contribuições na atividade urbana, correspondente ao ano do perfazimento do requisito etário, ainda que posteriormente (Súmula 44/TNU).
- As anotações da carteira de trabalho gozam de presunção juris tantum de veracidade, cujo ônus da prova para desconstituição cabe à parte que a alega, no caso, ao INSS, que tem o dever de provar que a anotação não corresponde à verdade.
- Comprovado o tempo de serviço como empregada doméstica, é de rigor computá-lo, ainda que não haja prova de recolhimento das contribuições, vez que é do empregador a obrigação de recolher as contribuições previdenciárias (Lei n. 5.859/1972, artigo 5º; Decreto n. 71.885/1973, artigo 12; Lei n. 8.212/1991, artigos 30, V e 33, § 5º).
- No presente caso, a parte autora nascida em 27/11/1955 cumpriu o requisito etário em 27/11/2015, quando completou 60 (sessenta) anos de idade, devendo comprovar a carência de 180 (cento e oitenta) meses.
- Na espécie, somados o vínculo como empregada doméstica de 01/03/1991 a 30/03/1996 ao período já reconhecido administrativamente (126 contribuições), alcança-se a carência necessária para aposentação.
- Apelação do INSS desprovida.