
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5632980-50.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. CRISTINA MELO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA JOSE DA SILVA MORAIS
Advogado do(a) APELADO: JOSE ANTONIO DOS SANTOS - SP74516-N
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5632980-50.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. CRISTINA MELO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA JOSE DA SILVA MORAIS
Advogado do(a) APELADO: JOSE ANTONIO DOS SANTOS - SP74516-N
R E L A T Ó R I O
A EXCELENTÍSSIMA DESEMBARGADORA FEDERAL CRISTINA MELO (RELATORA): Trata-se de ação movida pela parte autora contra o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), cujo objetivo é a concessão de aposentadoria, com base nos arts. 48 e seguintes, da Lei 8.213/91 (Lei de Benefícios da Previdência Social – LBPS).
Em síntese, a parte autora, Sra. Mari José da Silva Morais, em sua petição inicial (ID 60656718), sustenta que conta com mais de 55 anos de idade e que exerceu atividade rural, por mais de 15 anos, ou seja, por período superior ao exigido para a concessão de aposentadoria por idade ao trabalhador rural.
Processado o feito, a demanda foi julgada PROCEDENTE pela r. sentença (ID 60656705), nos seguintes moldes:
“(...) Ante o exposto, julgo procedente o pedido formulado para o fim de condenar a autarquia ao pagamento da aposentadoria por idade, prevista no artigo 143 da Lei nº 8.213/91, no valor de um salário mínimo a partir da data do requerimento administrativo (NB nº. 182.516.407-7 – 15 de março de 2018 – fl. 15), condenando-o ao pagamento das prestações vencidas desde então, com a incidência de correção monetária a partir do inadimplemento e juros de mora a contar da citação, atentando-se aos limites do quanto pacificado pelo Supremo Tribunal Federal (RE 870.947, julg. 20.09.2017), a saber, correção monetária calculada com base no IPCA e juros de mora estabelecidos pela lei vigente no período (art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 seguida pela Lei 11.960/09, para os débitos não tributários; Taxa SELIC para os débitos tributários).”
Inconformado, o INSS interpôs apelação (ID 60656711), alegando que o início de prova material trazido aos autos somente comprova atividade rural em período distante do implemento do requisito etário para a concessão da aposentadoria por idade ao trabalhador rural e que, por isso, a decisão de primeira instância teria se fundamentado exclusivamente na prova testemunhal. Assim, pretende a reforma da r. sentença e a devolução das parcelas recebidas a título de tutela provisória.
Com contrarrazões da parte autora (ID 60656718), os autos foram remetidos a este E. Tribunal Regional Federal.
Nesta instância, foi proferida decisão monocrática (ID 287201889), que negou provimento à apelação do INSS.
Como reação, a autarquia previdenciária interpôs o presente agravo interno (ID 292664238), no qual sustenta que não houve comprovação da atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo.
Intimada, a parte autora não apresentou contrarrazões.
É o relatório.
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5632980-50.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. CRISTINA MELO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA JOSE DA SILVA MORAIS
Advogado do(a) APELADO: JOSE ANTONIO DOS SANTOS - SP74516-N
V O T O
A EXCELENTÍSSIMA DESEMBARGADORA FEDERAL CRISTINA MELO (RELATORA): Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame das insurgências propriamente ditas.
Tenho que o agravo interposto não merece acolhimento, uma vez que as razões ventiladas no presente recurso não têm o condão de infirmar a decisão impugnada, em conformidade com a legislação e entendimento jurisprudencial assente na 9ª Turma.
Em relação ao preenchimento dos requisitos necessários para concessão da benesse pleiteada, assim constou do decisum (ID 285879695):
“Quanto à comprovação da atividade rural, alega a parte autora que a exerceu de forma habitual e por período superior aos exigidos na legislação previdenciária.
De fato, é o que se verifica a partir dos elementos de prova colhidos neste processo.
Inicialmente, observa-se que a parte autora juntou documentos que buscavam comprovar sua qualidade de segurada especial decorrente de atividade rural. Dentre esses, somente dois documentos possuem indicação de labor rural do marido da parte autora, Sr. Sérgio de Morais. O primeiro, a Certidão exarada pela Justiça Federal (ID 60656672), não possui força probante, uma vez que extemporânea aos fatos e posterior ao óbito do marido da parte autora (Enunciado 34 da TNU). Entretanto, o segundo documento, Certificado de dispensa militar (ID 60656673), traz expressamente a atividade de lavrador do Sr. Sérgio.
Sobre este ponto, cumpre esclarecer dois pontos. Primeiro, tal documento constitui início de prova material, de acordo com a jurisprudência dominante, a seguir exposta: "Enunciado 06 da Súmula da TNU: A certidão de casamento ou outro documento idôneo que evidencie a condição de trabalhador rural do cônjuge constitui início razoável de prova material da atividade rurícola. " (Grifo nosso).
Segundo, é importante frisar que a exigência para a obtenção da aposentadoria por idade é a comprovação da atividade rural em período imediatamente anterior à implementação dos requisitos (arts. 39, I, 48 e 143, LBPS). Isso significa que o acervo probatório formado nos autos tem que indicar tal condição, e não que o início de prova, necessariamente, seja imediatamente anterior a tal marco temporal, muito menos que corresponda a todo o período de atividade laboral.
Outrossim, embora haja registro de atividade urbana no histórico contributivo do marido da parte autora, tal fato não é o suficiente para afastar a verificação de atividade rural em regime familiar (Enunciado 46 da Súmula da Turma Nacional Uniformizadora – TNU).
Logo, conclui-se que, nestes autos, a parte autora conseguir trazer início de prova material sobre o exercício de atividade rural.
Atrelados a tal documentação, tem-se que os depoimentos das testemunhas foram uníssonos ao corroborar que a parte autora exerceu atividade rural em regime de economia familiar, por período superior aos 15 anos exigidos, inclusive, imediatamente antes do implemento dos requisitos legais e dos pedidos administrativos. É o que se depreende da prova testemunhal, representada pelo seguinte trecho da r. sentença que traz a síntese dos depoimentos:
“A testemunha Helena de Almeida aduziu que conhece a autora desde criança, ela devia ter uns 18 anos. Ela trabalhava na roça, hoje ainda trabalha na roça. Trabalha para o Adelino atualmente. Já trabalhou junto com ela. Conheceu Sérgio, esposo dela. Conheceu os pais dela e irmão também. Eles trabalharam sempre na lavoura, plantando feijão e milho, toda a vida. O marido dela a mesma coisa.
A testemunha Adelino Cubas da Cunha afirmou que conhece a autora há mais de vinte anos. Trabalha com plantação de milho, feijão, roçado. O depoente é produtor e arrendatário. Maria trabalha para o depoente, na lavoura que ele tem. O marido dela trabalhou no sítio também. Maria continua trabalhando para ele, na lavoura mesmo. Ela vive do dinheiro que ganha no sítio. Ela trabalha para ele há mais de vinte anos. Sérgio trabalhava na roça também.
A testemunha Neusa Aparecida Pinheiro da Cunha relatou que conhece a autora há vinte e cinco anos. Conheceu o esposo dela também. Ele se chamava Sérgio. A atividade dele era na lavoura, plantava milho e feijão. Ela continua trabalhando até hoje plantando e carpindo. Ela trabalha com seu esposo, Adelino. O esposo da depoente tem plantações de milho, feijão e vegetais. Teve uma época que Sérgio trabalhou com outra coisa, mas foi há muitos anos. ”
Assim, por todos elementos de prova colhidos nos autos, é possível concluir que a parte autora exerceu atividade rural em regime de economia familiar, na qualidade de segurada especial, por período superior a 15 anos, conforme as exigências da LBPS. ”
Como é possível observar, o início de prova material e a prova testemunhal evidenciaram que a parte autora se manteve em atividade rural em regime de economia familiar no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo. Mais que isso, os depoimentos uniformemente afirmaram que, até aquele momento, a parte autora explorava pequena produção rural.
Assim, assevera-se do teor da fundamentação acima colacionada que a decisão recorrida abordou, de forma satisfatória e exauriente, os pontos assinalados pela parte agravante. Eventual questionamento quanto a inviabilidade do julgamento monocrático, em conformidade ao disposto no art. 932 do Código de Processo Civil, resta superado face à submissão do inteiro teor do decidido à consideração do Colegiado dessa C. 9ª Turma.
Por fim, quanto ao prequestionamento suscitado, assinalo não haver qualquer infringência à legislação federal ou a dispositivos constitucionais, muito menos a precedente vinculante das Cortes superiores.
De rigor a manutenção do decisum agravado.
Ante o exposto, nego provimento ao agravo interno.
É o voto.
DECLARAÇÃO DE VOTO
A Exma. Sra. Desembargadora Federal Daldice Santana: A Desembargadora Federal Cristina Melo, ao negar provimento ao agravo interno do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), manteve a decisão monocrática que negou provimento a sua apelação.
Não obstante os judiciosos fundamentos expostos no voto de Sua Excelência, ouso divergir, pelas seguintes razões.
Discute-se o preenchimento dos requisitos para a concessão de aposentadoria por idade ao rurícola, consoante o disposto na Lei n. 8.213/1991.
A comprovação de atividade rural, para o segurado especial e para os demais trabalhadores rurais, inclusive os denominados “boias-frias”, deve ser feita por meio de início de prova material, a qual possui eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o posterior à sua data de referência, desde que corroborado por robusta prova testemunhal (Súmula n. 149 do Superior Tribunal de Justiça e Recursos Especiais Repetitivos n. 1.348.633 e 1.321.493).
No mais, segundo o entendimento firmado no REsp n. 1.354.908, pela sistemática de recurso representativo da controvérsia (Código de Processo Civil/1973, art. 543-C), faz-se necessária a comprovação do tempo de atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento ou à aquisição da idade:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO. REGRA DE TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991. REQUISITOS QUE DEVEM SER PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. Tese delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo 48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito. Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu ambos os requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício. 2. Recurso especial do INSS conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência. Observância do art. 543-C do Código de Processo Civil.” (RECURSO ESPECIAL Nº 1.354.908 - SP (2012/0247219-3), RELATOR: MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES, DJ 9/9/2015)
Em relação às contribuições previdenciárias, é assente o entendimento de serem elas desnecessárias, bastando a comprovação do efetivo exercício de atividade no meio rural (STJ, REsp 207.425, 5ª Turma, j. em 21/9/1999, v.u., DJ de 25/10/1999, p. 123, Rel. Ministro Jorge Scartezzini; STJ, RESP n. 502.817, 5ª Turma, j. em 14/10/2003, v.u., DJ de 17/11/2003, p. 361, Rel. Ministra Laurita Vaz).
No caso em discussão, o requisito etário restou preenchido em 4/10/2014, quando a autora completou 55 (cinquenta e cinco) anos de idade.
A autora alega que desde tenra idade exerce atividades rurais, cumprindo, assim, a carência exigida na Lei n. 8.213/1991.
Para comprovação do alegado, foi juntada aos autos a seguinte documentação: (i) certidão eleitoral, a qual não possui força probante, uma vez que extemporânea aos fatos e posterior ao óbito do marido da parte autora; e (ii) certificado de dispensa de incorporação (1974), com registro da profissão de lavrador do futuro marido.
Frise-se que o casamento da autora apenas se realizou em 15/2/1976, conforme se depreende da respectiva certidão.
Como se vê, pretende a autora utilizar a documentação de seu marido como início de prova material do trabalho rural, contudo os dados do Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS) revelam que o cônjuge possui vínculos empregatícios urbanos nos períodos de 1º/6/1984 a 2/2/1985, de 1º/4/1993 a 15/9/1999 e de 12/1/2007 a 13/2/2007.
Não há comprovação do retorno ao exercício de atividades rurais, tanto do falecido marido da autora.
Os testemunhos colhidos foram vagos e mal circunstanciados para comprovar o mourejo asseverado.
Em decorrência, concluo pelo não preenchimento dos requisitos exigidos à concessão do benefício pretendido.
Invertida a sucumbência, condeno a parte autora a pagar custas e honorários de advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa, já majorados em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 4º, III, do CPC, suspensa, porém, a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo estatuto processual, por tratar-se de beneficiária da justiça gratuita.
Diante do exposto, dou provimento ao agravo interno para, nos moldes da fundamentação retromencionada, julgar improcedente pedido de concessão de aposentadoria por idade rural.
É o voto.
Desembargadora Federal DALDICE SANTANA
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL. ATIVIDADE RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. CONFIGURADA. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.
- A concessão do benefício de aposentadoria por idade ao trabalhador rural é devido ao segurado especial que comprove o preenchimento do requisito etário e a atividade rural por período equivalente ao da carência exigida para o benefício, de acordo com os arts. 39, I, 48 e 143, da Lei de Benefícios da Previdência Social (LBPS).
- No caso dos autos, o início de prova material e a prova testemunhal evidenciaram que a parte autora exerceu atividade rural pelo período correspondente à carência exigida, inclusive, no que se refere ao período imediatamente anterior ao requerimento administrativo.
- Agravo interno desprovido.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADORA FEDERAL