
POLO ATIVO: LAURA ARAUJO ROCHA
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: LUCIANO HENRIQUE SOARES DE OLIVEIRA AIRES - TO4699-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
RELATOR(A):RUI COSTA GONCALVES
Gab. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta por Laura Araujo Rocha em face de sentença pela qual se julgou improcedente o pedido de concessão do benefício de salário-maternidade, não tendo sido reconhecida a condição de segurada especial atribuída à parte autora. Em suas razões recursais alegou a demandante que os documentos colacionados aos autos serviriam como início de prova material, corroborada pela prova testemunhal produzida em juízo.
Não houve apresentação de contrarrazões pelo INSS.
Eis, em apertada síntese, o relatório.
Processo Judicial Eletrônico
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
V O T O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES (RELATOR):
Pressupostos e recebimento da apelação
Presente os pressupostos de admissibilidade, recebo a apelação em seu duplo efeito, nos termos dos arts. 1.011 e 1.012, ambos do CPC.
O efeito devolutivo da apelação consagra o princípio tantum devolutum quantum appellatum e transfere ao Tribunal apenas o exame da matéria impugnada no recurso, nos termos dos arts. 1.002 e 1.013 do CPC/2015.
Requisitos jurídicos
O benefício de salário-maternidade é devido à segurada especial que atender aos requisitos estabelecidos na Lei 8.213/91 (art. 25, III) e no § 2º do art. 93 do Regulamento aprovado pelo Decreto 3.048/99: exercício de atividade rural nos últimos dez meses imediatamente anteriores à data do parto ou do requerimento do benefício, quando requerido antes do parto, mesmo que de forma descontínua.
A concessão do benefício pleiteado pela parte autora exige a demonstração do trabalho rural no prazo mínimo de 10 (dez) meses, ainda que descontínuos, mediante início razoável de prova material, corroborada com prova testemunhal, ou prova documental plena, inadmissível a prova exclusivamente testemunhal (STJ, Súmula 149; TRF/1ª Região, Súmula 27), não é necessário que a prova documental cubra todo o período de carência, podendo ser “projetada” para tempo anterior ou posterior ao que especificamente se refira, desde que contemporânea à época dos fatos a provar (TNU, Súmula 34).
É pacífica a jurisprudência do STJ e desta Corte no sentido de que o rol do art. 106 da Lei 8.213/91 é meramente exemplificativo, (STJ AgRG no REsp 1073730/CE) sendo admissíveis, portanto, outros documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, além dos ali previstos. São idôneos, portanto, dentre outros, a ficha de alistamento militar, o certificado de dispensa de incorporação (CDI), o título eleitoral em que conste como lavrador a profissão do segurado (STJ, AgRG no REsp 939191/SC); a certidão de casamento, a carteira de sindicato rural com comprovantes de recolhimento de contribuições, o boletim escolar de filhos que tenham estudado em escola rural (STJ AgRG no REsp 967344/DF); certidão de casamento que atesta a condição de lavrador do cônjuge ou do próprio segurado (STJ, AR 1067/SP, AR 1223/MS); declaração de Sindicato de Trabalhadores Rurais, devidamente homologada pelo Ministério Público (STJ, AR 3202/CE).
Circunstanciado o acervo documental apresentado, são aceitáveis documentos tais como certidões do INCRA, guias de recolhimento de ITR, documentos fiscais de venda de produtos rurais, recibos de pagamento a sindicato rural, certidão de registro de imóveis relativos a propriedade rural, contratos de parceria agrícola e todos outros que indiciem a ligação da parte autora com o trabalho e a vida no meio rural, bem como, a CTPS com anotações de trabalho rural da parte autora, que é considerada prova plena do período nela registrado e início de prova material para o restante do período de carência (REsp 310.264/SP, Rel. Min. Fernando Gonçalves, 6ª Turma, DJ 18.02.2002, p. 530; AC 2004.38.03.000757-8/MG, Rel. Desembargadora Federal Neuza Maria Alves da Silva, Segunda Turma, e-DJF1 p.33 de 17/07/2008, AC 0004262-35.2004.4.01.3800/MG, Rel. Juiz Federal Miguel Ângelo de Alvarenga Lopes, 3ª Turma Suplementar, e-DJF1 p.191 de 02/03/2011).
Via de regra, não servem como início de prova material quanto ao exercício do labor rural em regime de economia familiar durante o período da carência, pois não revestidos das formalidades legais para comprovar a autenticidade, a segurança jurídica e quando tiverem sido confeccionados em momento próximo ao ajuizamento da ação ou à data do nascimento da criança: a certidão eleitoral (retificável a qualquer tempo) com anotação indicativa da profissão de rurícola; certidão de nascimento da criança e/ou certidão de casamento sem qualificação profissional; prontuários médicos sem um histórico de atendimento; cartão da gestante e cartão de vacinas sem indicativo do exercício de atividade laboral; carteira e ficha de filiação a sindicato de trabalhadores rurais desacompanhadas dos respectivos recolhimentos contributivos e do histórico da filiação e da habitualidade do exercício de atividade laboral declarada; CTPS com anotações de vínculos rurais e/ou urbanos, documentos de terras em nome de terceiros, bem como declaração de terceiros com os quais não seja comprovada qualquer relação de natureza laboral.
Nesse sentido a Jurisprudência:
"PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. RURÍCOLA. INEXISTÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL DA ATIVIDADE CAMPESINA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. 1. O salário-maternidade é devido à segurada especial, no valor de 01 (um) salário-mínimo mensal, durante 120 dias, a contar da data do parto ou dos 28 (vinte e oito) dias que o antecederam, desde que comprovado o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, nos dez meses imediatamente anteriores ao início do benefício (arts. 39, parágrafo único, e 71 c/c 25, da Lei nº 8.213/91). 2. Não se prestam como razoável início de prova material do labor rural documentos confeccionados em momento próximo ao ajuizamento da ação ou ao implemento do requisito etário, em especial quando não encontram sintonia com o conjunto probatório dos autos. 3. Na hipótese, a parte-autora não se desincumbiu de comprovar a sua qualidade de segurada especial, haja vista não ter colacionado aos autos documentos hábeis e robustos a confirmar a atividade campesina, mormente no período de carência exigido em lei. De igual modo, a mera juntada de documentos particulares, desprovidos de fé pública, não se mostra suficiente para o fim pretendido. Na ausência de início razoável de prova material, a jurisprudência é pacífica no sentido de que é inadmissível a prova exclusivamente testemunhal (STJ, Súmula 149; TRF-1ª Região, Súmula 27). Saliente-se, por oportuno, que uma vez verificada a imprestabilidade da prova material, não se pode conceder o benefício com base apenas nas provas testemunhais, como já sedimentou este Tribunal em reiterados julgados. 4. Ante o caráter social que permeia o Direito Previdenciário, a coisa julgada opera secundum eventum litis ou secundum eventum probationais, permitindo a renovação do pedido, ante novas circunstâncias ou novas provas. Precedentes. 5. Os honorários advocatícios arbitrados em 15% sobre o valor atribuído à causa devem ser majorados em 2% (dois por cento), a teor do disposto no art. 85, §§ 2º, 3º e 11 do NCPC, totalizando o quantum de 17% (dezessete por cento) sobre a mesma base de cálculo, ficando suspensa a execução deste comando por força da assistência judiciária gratuita, nos termos do art. 98, §3º do Codex adrede mencionado. 6. Apelação desprovida.A Turma, por unanimidade, negou provimento à apelação."
(AC 00052792020184019199, Desembargador Federal João Luiz de Sousa, TRF1 – Segunda Turma, e-DJF1 Data: 08/06/2018 Página:.)
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. TRABALHADORA RURAL. AUSENTE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. RECURSO REPETITIVO. RESP N. 1.352.721-SP. AÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. 1. O salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade, conforme estabelecido pelo art. 71 da Lei 8.213/91. 2. O reconhecimento da qualidade de segurada especial apta a receber o específico benefício tratado nos autos desafia o preenchimento dos seguintes requisitos fundamentais: a existência de início de prova material da atividade rural exercida, a corroboração dessa prova indiciária por robusta prova testemunhal e, finalmente, para obtenção do salário-maternidade ora questionado, a comprovação do exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, nos 10 (dez) meses imediatamente anteriores ao do início do benefício, como define o § 2º do art. 93 do Decreto 3.048/99. 3. Para que sirvam como início de prova material do labor rural, a autora deverá apresentar documentos dotados de integridade probante autorizadora de sua utilização, não se enquadrando em tal situação aqueles documentos não contemporâneos ou posteriores ao nascimento do filho em razão do qual o benefício é requerido. 4. No caso dos autos, a parte autora não apresentou início de prova material capaz de comprovar o exercício de atividade rural, sob o regime de economia familiar, por tempo suficiente à carência e, ausente o início de prova material, a prova testemunhal produzida não pode ser exclusivamente admitida para reconhecer o tempo de exercício de atividade urbana e rural (STJ, Súmula 149 e TRF1, Súmula 27). 5. Segundo a nova orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, em recente julgamento submetido à sistemática dos recursos repetitivos para aplicação restrita às ações previdenciárias, 'a ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC), e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários a tal iniciativa' (REsp n. 1.352.721-SP, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Corte Especial, julgado em 16/12/2015, DJe 28/4/2016). 6. A sentença previdenciária, de um modo geral, é proferida secundum eventus litis ou secundum eventum probationis; porém, a orientação fixada no referido repetitivo agrega a vantagem processual de afastar eventual discussão relativa à ocorrência ou não de coisa julgada material em caso de nova ação. 7. Processo extinto, de ofício, sem resolução do mérito, em razão da ausência de início de prova material suficiente para o reconhecimento da qualidade de segurado; apelação prejudicada. A Turma, por unanimidade, de ofício, extinguiu o processo, sem resolução de mérito, e julgou prejudicada a apelação."
(AC 00017872020184019199, Desembargador Federal Jamil Rosa de Jesus Oliveira, TRF1 - Primeira Turma, e-DJF1 Data: 06/06/2018 Página:.)
Situação tratada
Houve requerimento administrativo formulado em 07/10/2020 (id 296652038 - p. 9).
A autora postula a concessão do benefício de salário-maternidade em decorrência do nascimento de sua filha, ocorrido em 17 de dezembro de 2019, conforme certidão de nascimento id nº 296652038 - p. 15 (não consta no referido documento o registro da qualificação profissional dos pais da criança). Portanto, o período de prova sobre o qual reside a controvérsia reside no período de 10 (dez) meses anteriores ao referido nascimento, ainda que haja descontinuidade não relevante.
Embora posteriormente a recorrente faça alusão em uma petição dirigida ao INSS ( id 296652038; pág. 60/70) de que fora postulado o benefício em função do nascimento do menor P.L.A., ocorrido em 30/08/2017, na petição inicial consta informação diversa, assim transcrita:
"Em 17/12/2019 deu à luz RITA DE CASSIA ARAUJO FARIAS. Ocorre que ao procurar o Requerido para solicitar seu benefício de Salário Maternidade (NB 188.572.575-0) no dia (DER 07/10/2020), teve seu pleito equivocadamente indeferido, conforme comprovante anexo, não vendo a parte autora outra alternativa, senão procurar o judiciário para ver reparado tal erro.
Com o propósito de comprovar a sua condição de trabalhadora rural, juntou os seguintes documentos, dentre outros:
a) Comprovante de endereço no Povoado de Santo Antônio em nome do genitor da menor;
b) Carteira da Colônia de Pescadores de Tutóia/MA da avó materna da menor, com cadastro em 2003;
c) Termo de Declaração de Pescador Artesanal, datada de 16/01/2019, com a informação de que a atividade pesqueira foi desenvolvida no período de 08/02/2016 a 29/08/2017;
d) Carteira do Sindicato dos Pescadores Profissionais, Artesanais, Marisqueiras, Criadores de Peixes e Mariscos do Município de Tutóia/MA de 2016;
e) Certidão eleitoral com a declaração da profissão de trabalhador rural.
Tem-se que a documentação juntada não guarda correspondência temporal com o período de carência do benefício vindicado judicialmente.
A autodeclaração não homologada, editada em 16/01/2019, não atesta o desenvolvimento da atividade agrícola alegada. Ademais o período declarado, 08/02/2016 a 29/08/2017, não coincide com o período de carência exigida para concessão do benefício pleiteado. Em relação às supostas contribuições sindicais, são elas referentes ao período de janeiro/2016 a dezembro/2018, inservíveis, pois não atestadas por quaisquer documentos que as corroborem: não houve ajuntada de recibos ou comprovantes de recolhimento de contribuições associativas ou mesmo de outros elementos de prova que indicassem, no plano fático e concreto, o efetivo e habitual exercício de atividade pesqueira, assim como a filiação da autora ao RGPS, como segurada especial, pelo tempo de carência legalmente exigido.
Por sua vez, a certidão eleitoral não faz prova da informação (profissão) nela declarada. Quando se registra o eleitor no sistema Elo, da Justiça Eleitoral, o chefe de cartório promove a inserção de qualquer profissão declarada pela parte interessada e a conversão do RAE em diligência, para se atestar a veracidade do quanto declarado, somente ocorre de forma excepcional, por determinação do juízo eleitoral. Tal certidão, pois, não tem qualquer valor probatório para fins previdenciários.
A documentação apresentada reside em elementos de informação meramente declaratórios e/ou extemporâneos aos fatos a provar, ao arrepio da súmula 34, da TNU, e que não fazem prova da causa de pedir objeto destes autos e não guardam consonância concreta com qualquer dado que indique que, ao longo do período de carência legalmente exigida, estivesse a parte autora faticamente exercendo a profissão declarada, ainda que de forma descontínua.
Há nos autos documentos isolados e elaborados de forma recente que não permitem traçar, ainda que de forma descontínua, uma linha cronológica em que inserida a autora ao ponto de restar computado o número de meses da efetiva e habitual dedicação ao exercício de atividade laboral sobre a qual se funda a causa de pedir. A documentação juntada não guarda correspondência fática com elementos informativos indicativos, de forma indene de dúvidas: o curso d'água em que desenvolvida a pescaria; quantidade pescada; quantidade voltada à subsistência e consumo próprio e aquela voltada à comercialização; horários de trabalho e tempo de duração; comprovação de aquisição de insumos para produção ou de petrechos para realização da pesca com linha e rede, dente outros elementos que permitiriam maior entendimento sobre a suposta dinâmica produtiva, que deve conter, ainda que de forma participativa e mínima, a efetiva atuação da autora na logística de produção.
Como frisado, a comprovação do exercício pessoal da atividade pesqueira deve ser comprovado com a apresentação de documentos nominais à autora, e não de parentes em linha reta ou colateral alheios ao núcleo familiar da recorrente. Nesse ponto, igualmente não socorre a pretensão autoral a juntada ao caderno processual da Carteira da Colônia de Pescadores de Tutóia/MA da avó materna da menor, com cadastro datado de 2003.
Ademais, é necessário que a documentação apresentada resida em elementos de prova pessoais, já que o núcleo familiar da recorrente é composto por ela e seu cônjuge, a partir da celebração do matrimônio, e não por parentes em linha reta e colateral. Veja-se que em tal sistemática produtiva em regime de economia familiar há mútua cooperação entre os membros da família, em seu sentido estrito, de forma que o trabalho desempenhado por cada integrante repercute no modelo de produção voltado à subsistência, ainda que parte da produção, como excedente, possa ser comercializada e reverberada para o núcleo familiar com aquisição de outros gêneros alimentícios por ele não produzidos, ou mesmo de insumos e petrechos necessários à continuidade da atividade produtiva ou incremento da eficiência laboral.
Em arremate, no que toca à prova oral que poderia ter sido colhida, houve o julgamento antecipado da lide a pedido do INSS, tendo a autora, ora recorrente, quedado-se inerte ao ser intimada para especificar provas.
Diante da ausência de comprovação dos requisitos legais necessários ao reconhecimento da qualidade de segurada atribuída à parte autora, não é possível, de fato, a concessão do benefício pleiteado. Portanto, deve ser mantida a sentença pela qual se julgou improcedente a pretensão autoral.
Conclusão
Ante o exposto, nego provimento à apelação da parte autora, mantendo a sentença em seus exatos termos.
Fica a parte recorrente condenada ao pagamento das custas estabelecidas em lei, e ainda de honorários advocatícios, cuja exigibilidade resta suspensa pelo lustro prescricional de 05 (cinco) anos, diante da concessão dos benefícios decorrentes da gratuidade da justiça, na forma do art. 98, incisos I e VI c/c §3º, do CPC.
É o voto.
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1004307-82.2023.4.01.9999 PROCESSO REFERÊNCIA: 0801377-96.2020.8.10.0137
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: LAURA ARAUJO ROCHA
REPRESENTANTES POLO ATIVO: LUCIANO HENRIQUE SOARES DE OLIVEIRA AIRES - TO4699-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. TRABALHADORA RURAL. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL. SENTENÇA MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS.
1. O benefício de salário-maternidade é devido à segurada especial que atender aos requisitos estabelecidos na Lei 8.213/91 (art. 25, III) e no § 2º do art. 93 do Regulamento aprovado pelo Decreto 3.048/99: exercício de atividade rural nos últimos dez meses imediatamente anteriores à data do parto ou do requerimento do benefício, quando requerido antes do parto, mesmo que de forma descontínua.
2. A concessão do benefício pleiteado pela parte autora exige a demonstração do trabalho rural no prazo mínimo de 10 (dez) meses, ainda que descontínuos, mediante início razoável de prova material, corroborada com prova testemunhal, ou prova documental plena, inadmissível a prova exclusivamente testemunhal (STJ, Súmula 149; TRF/1ª Região, Súmula 27), não é necessário que a prova documental cubra todo o período de carência, podendo ser “projetada” para tempo anterior ou posterior ao que especificamente se refira, desde que contemporânea à época dos fatos a provar (TNU, Súmula 34).
3. O reconhecimento da qualidade de segurada especial, trabalhadora rural, desafia o preenchimento requisitos fundamentais da existência de início de prova material da atividade rural exercida e a corroboração dessa prova indiciária por robusta prova testemunhal. Logicamente, a documentação apresentada, para os fins da súmula 149, do E. STJ, e na linha dos precedentes consolidados na súmula 34, da TNU, não é chancelável se residir em elementos de informação meramente declaratórios e/ou extemporâneos aos fatos a provar. Certo é que o início de prova material deve guardar correspondência temporal com o período de prova e de carência legalmente exigido.
4. No situação tratada, a autora postula o benefício de salário-maternidade em decorrência do nascimento de sua filha, ocorrido em 17 de dezembro de 2019, conforme certidão de nascimento id nº 296652038 - p. 15 (não consta no referido documento o registro da qualificação profissional dos pais da criança). e, com o propósito de comprovar a sua condição de trabalhadora rural, juntou os seguintes documentos, dentre outros: a) Comprovante de endereço no Povoado de Santo Antônio em nome do genitor da menor; b) Carteira da Colônia de Pescadores de Tutóia/MA da avó materna da menor, com cadastro em 2003; c) Termo de Declaração de Pescador Artesanal, datada de 16/01/2019, com a informação de que a atividade pesqueira foi desenvolvida no período de 08/02/2016 a 29/08/2017; d) Carteira do Sindicato dos Pescadores Profissionais, Artesanais, Marisqueiras, Criadores de Peixes e Mariscos do Município de Tutóia/MA de 2016, com controle de pagamento da mensalidade de janeiro/2016 a dezembro/2018; e) Certidão eleitoral com a declaração da profissão de trabalhador rural.
5. A autodeclaração não homologada, editada em 16/01/2019, não atesta o desenvolvimento da atividade agrícola alegada. Ademais o período declarado, 08/02/2016 a 29/08/2017, não coincide com o período de carência exigida para concessão do benefício pleiteado. Em relação às supostas contribuições sindicais, são elas referentes ao período de janeiro/2016 a dezembro/2018, inservíveis, pois não atestadas por quaisquer documentos que as corroborem: não houve ajuntada de recibos ou comprovantes de recolhimento de contribuições associativas ou mesmo de outros elementos de prova que indicassem, no plano fático e concreto, o efetivo e habitual exercício de atividade pesqueira, assim como a filiação da autora ao RGPS, como segurada especial, pelo tempo de carência legalmente exigido.
6. A certidão eleitoral não faz prova da informação (profissão) nela declarada. Quando se registra o eleitor no sistema Elo, da Justiça Eleitoral, o chefe de cartório promove a inserção de qualquer profissão declarada pela parte interessada e a conversão do RAE em diligência, para se atestar a veracidade do quanto declarado, somente ocorre de forma excepcional, por determinação do juízo eleitoral. Tal certidão, pois, não tem qualquer valor probatório para fins previdenciários.
7. Reside a documentação apresentada em elementos de informação meramente declaratórios e/ou extemporâneos aos fatos a provar, ao arrepio da súmula 34, da TNU, e que não fazem prova da causa de pedir objeto destes autos e não guardam consonância concreta com qualquer dado que indique que, ao longo do período de carência legalmente exigida, estivesse a parte autora faticamente exercendo a profissão declarada, ainda que de forma descontínua.
8. Há nos autos documentos isolados e elaborados de forma recente que não permitem traçar, ainda que de forma descontínua, uma linha cronológica em que inserida a autora ao ponto de restar computado o número de meses da efetiva e habitual dedicação ao exercício de atividade laboral sobre a qual se funda a causa de pedir. A documentação juntada não guarda correspondência fática com elementos informativos indicativos, de forma indene de dúvidas: o curso d'água em que desenvolvida a pescaria; quantidade pescada; quantidade voltada à subsistência e consumo próprio e aquela voltada à comercialização; horários de trabalho e tempo de duração; comprovação de aquisição de insumos para produção ou de petrechos para realização da pesca com linha e rede, dente outros elementos que permitiriam maior entendimento sobre a suposta dinâmica produtiva, que deve conter, ainda que de forma participativa e mínima, a efetiva atuação da autora na logística de produção.
9. Como frisado, a comprovação do exercício pessoal da atividade pesqueira deve ser comprovado com a apresentação de documentos nominais à autora, e não de parentes em linha reta ou colateral alheios ao núcleo familiar da recorrente. Nesse ponto, igualmente não socorre a pretensão autoral a juntada ao caderno processual da Carteira da Colônia de Pescadores de Tutóia/MA da avó materna da menor, com cadastro datado de 2003.
10. Diante da ausência de comprovação dos requisitos legais necessários ao reconhecimento da qualidade de segurada atribuída à parte autora, não é possível, de fato, a concessão do benefício pleiteado.
8. Apelação de Laura Araujo Rocha a que se nega provimento.
9. Condenada a recorrente ao pagamento das custas estabelecidas em lei, e ainda de honorários advocatícios, cuja exigibilidade resta suspensa pelo lustro prescricional de 05 (cinco) anos, diante da concessão dos benefícios decorrentes da gratuidade da justiça, na forma do art. 98, incisos I e VI c/c §3º, do CPC.
A C Ó R D Ã O
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF, data da assinatura eletrônica.
Desembargador Federal RUI GONÇALVES
Relator