
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:WALDIR LUIZ DE SOUZA FILHO
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: CARLOS ROBERTO PALMA DOS SANTOS - BA74100-A e FABIO TEIXEIRA DE CARVALHO - BA40764-A
RELATOR(A):CANDICE LAVOCAT GALVAO JOBIM

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1075978-23.2022.4.01.3300
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: WALDIR LUIZ DE SOUZA FILHO
RELATÓRIO
O EXMO. SR. JUIZ FEDERAL ALYSSON MAIA FONTENELE (RELATOR CONVOCADO):
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL em face de sentença (ID 412868159, proferida em 15/01/2024) que julgou parcialmente procedente o pedido para:
(a) Declarar como especial os períodos trabalhados pelo autor de 01/09/1992 a 05/01/1993 (VRV Viação Rio Vermelho Ltda.); de 28/12/1993 a 28/04/1995 (Distribuidora de Bebidas Itapoan Ltda.); de 01/02/1995 a 20/04/1995 (Xavier Comercial Ltda.); de 23/08/1996 a 27/06/1997 (Transgatão Transporte, Comércio e Serviço Ltda.); de 01/06/2002 a 01/12/2004 (Concórdia Transportes Rodoviários Ltda.); de 01/05/2010 a 21/10/2022 (Brasquímica Transportes Rodoviários Ltda.);
(b) Reconhecer que, ao tempo da Reforma da Previdência EC 103/2019 (13/11/2019) o autor perfaz 41 anos, 07 meses e 19 dias de tempo de contribuição, bem como que na DER 14/12/2020 o autor perfaz 42 anos, 08 meses e 20 dias de tempo de contribuição;
(c) Condenar o INSS a proceder à revisão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição da parte autora (NB 199.881.575-4), a fim de ser-lhe implantado a melhor RMI, uma vez que em 13/11/2019 (último dia de vigência das regras pré-reforma da Previdência - art. 3º da EC 103/2019), o autor alcançou direito à aposentadoria integral por tempo de contribuição (CF/88, art. 201, § 7º, inc. I, com redação dada pela EC 20/98), sem a incidência de fator previdenciário, caso mais vantajoso, ou na DER 14/12/2020, quando já havia também alcançado o direito à aposentadoria conforme arts. 15, 17 ou 20 das regras de transição da EC 103/19, bem como lhe pagar as diferenças dela decorrente, desde a citação (12/01/2023), corrigidas monetariamente e com juros de mora, nos termos do Manual de Cálculo da Justiça Federal;
(d) Fixar a correção monetária pelo INPC e os juros de mora conforme remuneração oficial da caderneta de poupança (art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997, com redação dada pela Lei nº 11.960/2009).
A sentença deferiu a tutela provisória de urgência determinando a implantação imediata do benefício, bem como a revisão do benefício a partir da data da citação (12/01/2023) em razão de a parte autora haver apresentado PPP retificado somente em juízo.
Os honorários de sucumbência foram fixados no percentual mínimo sobre o valor das prestações vencidas até a data da sentença, nos termos do art. 85, § 3º, do CPC, e súmula 111/STJ, sendo devido 60% pelo INSS e 40% pela parte autora diante da sucumbência recíproca, suspendendo a exigibilidade da condenação em relação à parte autora em face da gratuidade da justiça deferida.
Não houve remessa.
Nas suas razões recursais (ID 412868161), requer o INSS, inicialmente, seja conhecida a remessa oficial.
No mérito, insurge-se quanto ao reconhecimento da especialidade dos seguintes períodos:
(a) 23/08/1996 a 27/06/1997 (ruído): alega que o nível de aferição seria incompatível com a atividade de motorista;
(b) 01/06/2002 a 01/12/2004 (agente químico): alega ausência de fundamentação legal e constitucional para o reconhecimento da especialidade de atividade de risco;
(c) 01/05/2010 a 21/10/2022 (ruído e agente químico): alega, quanto ao ruído, que o nível de aferição seria incompatível com a atividade de motorista, relativamente ao benzeno, que não havendo indicação que a atividade não se amolda àquelas descritas no código 1.0.3 do Decreto 2.172/97, não se justifica o tempo especial, além de o PPP indicar o uso de EPI eficaz.
Relativamente ao período posterior a 13/11/2019, assevera não ser possível a conversão de tempo especial em comum (art. 25, § 2º, da EC 103/2019 c/c art. 188-P, § 5º, do Decreto nº 3.048/1999).
Houve a apresentação de contrarrazões (ID 412868164).
É o relatório.
ASSINADO DIGITALMENTE
Alysson Maia Fontenele
Juiz Federal
Relator Convocado

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1075978-23.2022.4.01.3300
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: WALDIR LUIZ DE SOUZA FILHO
VOTO
O EXMO. SR. JUIZ FEDERAL ALYSSON MAIA FONTENELE (RELATOR CONVOCADO):
Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra sentença que julgou parcialmente procedente o pedido para reconhecer o tempo de serviço prestado em condições especiais no(s) período(s) que indica, condenando a Autarquia a revisar o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição da parte autora, com implantação da melhor RMI.
O pleito da parte recorrente consiste na reforma da sentença ao argumento, em síntese, de que não preenchidos os requisitos para o reconhecimento do trabalho em condições especiais.
Inicialmente, assente-se a dispensa da remessa necessária no presente caso concreto, em face do teor da norma do inciso I do § 3º do art. 496 do Código de Processo Civil, nos termos dos recentes precedentes do Superior Tribunal de Justiça (a propósito: REsp 1.735.097/RS e REsp 1.844.937/PR).
Consigno, ainda, que a prescrição atinge as prestações vencidas anteriormente ao quinquênio que antecede o ajuizamento da ação, nos termos da Súmula 85/STJ.
A Lei 8.213/1993, que dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providências, ao tratar da aposentadoria especial, estabelece em seu art. 57 o seguinte:
Art. 57. A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei.
A classificação das atividades sob condições especiais ou a comprovação da efetiva e habitual exposição do segurado aos agentes nocivos para fins de aposentadoria especial é definida pela legislação previdenciária então em vigor (Decreto nº 53.831, de 25/03/1964; Decreto nº 83.080, de 24/01/1979; Lei nº 8.213, de 24/07/1991; Lei 9.032, de 29/04/1995; Decreto 2.172, de 05/03/1997, e Decreto nº 3.048, de 06/05/1999).
Ruído
Com relação à exposição ao agente ruído, que sempre exigiu laudo técnico para sua comprovação, o Superior Tribunal de Justiça (Pet 9.059/RS 2012/0046729-7, Primeira Seção, Rel. Min. Benedito Gonçalves, unânime, DJe 09/09/2013), decidiu que “a contagem do tempo de trabalho de forma mais favorável àquele que esteve submetido a condições prejudiciais à saúde deve obedecer a lei vigente na época em que o trabalhador esteve exposto ao agente nocivo, no caso ruído.”.
Conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça, “deve ser considerado o ruído de 80 dB até 5/3/97, de 90 Db a partir de 6/3/97 a 18/11/2003 (Decreto n. 2.172/97) e de 85 Db a partir de 19/11/2003 (Decreto n. 4.882/2003). Precedentes.” (EDcl nos EDcl no REsp n. 1.264.941/RS, relator Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em 22/9/2015, DJe de 19/10/2015.).
De igual modo, consoante Tema 694 dos recursos repetitivos, o Superior Tribunal de Justiça consolidou a tese de que “o limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC). (REsp 1.398.260/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/05/2014, DJe 05/12/2014)”.
Relativamente à aferição dos períodos laborados com exposição ao agente físico ruído, a Turma Nacional de Uniformização – TNU, por ocasião do julgamento dos embargos de declaração no PEDILEF 0505614-83.2017.4.05.8300, em 22/03/2019, firmou a seguinte tese (Tema 174):
a) a partir de 19 de novembro de 2003, para a aferição de ruído contínuo ou intermitente, é obrigatória a utilização das metodologias contidas na NHO-01, da FUNDACENTRO ou na NR-15, que reflitam a medição de exposição durante toda a jornada de trabalho, devendo constar do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) a técnica utilizada;
b) em caso de omissão na indicação da metodologia empregada para aferição do agente nocivo ruído no Perfil Profissiográfico Previdenciário, esse documento não deve ser admitido como prova da especialidade do trabalho para o agente nocivo em apreço, devendo ser apresentado o respectivo laudo técnico (LTCAT), para fins de demonstrar a técnica utilizada na respectiva medição.
Como ponderado no voto condutor do acórdão da TNU (Tema 174), tanto a NR-15 quanto a NHO-01 dividem a análise do agente físico ruído em duas modalidades: a) ruído contínuo ou intermitente, e b) ruído de impacto. A modalidade que interessa à solução da controvérsia é a do ruído contínuo ou intermitente, que é todo e qualquer ruído que não está classificado como de impacto, considerando este último aquele que apresenta picos de energia acústica de duração inferior a um segundo, a intervalos superiores a um segundo. Ruído intermitente é aquele descontínuo, com interrupções, que cessa e recomeça por intervalos, comportando variações ao longo da jornada; o ruído intermitente não se confunde, entretanto, com exposição intermitente do segurado ao agente nocivo.
Conforme entendimento fixado pela TNU no representativo de controvérsia, a partir de 19/11/2003 a metodologia de aferição pode ser tanto a contida na NHO-01, como aquela contida na NR-15, que traz uma tabela com os níveis de ruído e respectivos tempos máximos de exposição.
A respeito dos equipamentos de proteção individual, o Supremo Tribunal Federal (ARE nº 664335/SC – Tema nº 555), sob a sistemática de repercussão geral, fixou a tese de que “na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual – EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para a aposentadoria.”.
Nessa mesma linha de orientação, estabelece a Súmula nº 9 da TNU, que: “O uso de Equipamento de Proteção Individual (EPI), ainda que elimine a insalubridade, no caso de exposição a ruído, não descaracteriza o tempo de serviço especial prestado.”.
Agente químico
Como cediço, a exposição a agentes químicos, físicos e biológicos insalubres confere ao trabalhador o direito ao cômputo do tempo de serviço especial, relativamente ao período comprovado, por meio de formulário, consoante previsão constante dos Decretos 53.831/1964 e 83.080/1979, para as atividades desempenhadas até a entrada em vigor do Decreto 2.172/1997, a partir do qual a comprovação passou a ser por Laudo Técnico de Condições Ambientais do Trabalho – LTCAT e com base nos agentes indicados no Decreto 3.048/1999.
De se ressaltar que, mesmo após 06/03/1997, tem a jurisprudência reconhecido que o formulário PPP, “por espelhar o laudo técnico” (Resp 1.649.102), pode ser utilizado como prova de trabalho prestado sob condições especiais. Com efeito, é firme o entendimento do STJ de que “trazido aos autos o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), dispensável se faz, para o reconhecimento e contagem do tempo de serviço especial do segurado, a juntada do respectivo Laudo Técnico de Condições Ambientais de Trabalho (LTCAT), na medida que o PPP já é elaborado com base nos dados existentes no LTCAT, ressalvando-se, entretanto, a necessidade da também apresentação desse laudo quando idoneamente impugnado o conteúdo do PPP” (Pet 10.262/RS, Primeira Seção, Rel. Min. Sérgio Kukina, DJe 16/02/2017). No mesmo sentido, os seguintes precedentes: STF, ARE 664.335, Tribunal Pleno, Rel. Min. Luiz Fux, DJe 12/02/2015 (Tema 555); STJ, REsp 1.761.519/RS, Segunda Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 28/11/2018; e REsp 1.661.902/RJ, Segunda Turma, Rel. Min. Og Fernandes, DJe 20/05/2019.
No tocante à exposição a agentes químicos, há que se considerar que a NR 15/1978, de aplicação reconhecida pelo § 7º do artigo 68 do Decreto 3.048/99 em sua redação original, e hoje ainda admitida pelo § 13 do mesmo artigo no caso de falta de critérios fixados pela FUNDACENTRO, fixou parâmetros para a mensuração quantitativa da exposição, e apenas no caso destes virem a ser ultrapassados é que o labor prestado pode ser considerado como desenvolvido sob condições especiais.
Contudo, no caso de conflito entre as condições de insalubridade fixadas pela NR 15 e a classificação de nocividade do Anexo IV do Decreto n. 3.048/1999, deve prevalecer a norma mais favorável ao trabalhador, ante o princípio relacionado à sua proteção, devendo se compreender, assim, ser qualitativa a exposição a agentes nocivos reconhecidamente cancerígenos em humanos, listados pelo Ministério do Trabalho e Emprego.
Aliás, consoante disposto no art. 278, § 1º, I, da IN INSS/PRES 77/2015, a avaliação dos agentes nocivos constantes dos anexos 6, 13 e 14 da NR-15 será "apenas qualitativa, sendo a nocividade presumida e independente de mensuração, constatada pela simples presença do agente no ambiente de trabalho".
Logo, na avaliação qualitativa da exposição a agentes químicos, não devem ser considerados os equipamentos de proteção coletiva ou individual, uma vez que não são suficientes para eliminar completamente a exposição a esses agentes. A propósito, confiram-se precedentes do Superior Tribunal de Justiça:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. TEMPO ESPECIAL. EPI. NEUTRALIZAÇÃO DA INSALUBRIDADE. SÚMULA 7/STJ. POSSIBILIDADE DE CONVERSÃO DE TEMPO COMUM EM ESPECIAL. CRITÉRIO. LEGISLAÇÃO VIGENTE QUANDO PREENCHIDOS OS REQUISITOS DA APOSENTADORIA. PRECEDENTE DO STJ.
1. "É assente nesta Corte que o fornecimento pela empresa ao empregado Equipamento de Proteção Individual - EPI não afasta, por si só, o direito ao benefício de aposentadoria com a contagem de tempo especial, devendo ser apreciado caso a caso, a fim de comprovar sua real efetividade por meio de perícia técnica especializada e desde que devidamente demonstrado o uso permanente pelo empregado durante a jornada de trabalho. É incabível, em sede de recurso especial, a análise da eficácia do EPI para determinar a eliminação ou neutralização da insalubridade, devido ao óbice da Súmula 7/STJ" (STJ, AgRg no AREsp 402.122/RS, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe de 25.10.2013).
(...)
5. Recurso Especial do INSS não conhecido e Recurso Especial do segurado não provido.
(REsp 1.662.171/RJ, Segunda Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 12/09/2017.)
PROCESSUAL CIVIL. OFENSA AO ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. AGENTE NOCIVO RUÍDO. NECESSIDADE DE LAUDO TÉCNICO. COMPROVAÇÃO. REEXAME DE PROVAS. ENUNCIADO 7/STJ. EQUIPAMENTO DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL. COMPROVAÇÃO DA NEUTRALIZAÇÃO DA INSALUBRIDADE. REEXAME DE FATOS E PROVAS.
(...)
3. Acrescente-se que o perfil profissiográfico previdenciário espelha as informações contidas no laudo técnico, razão pela qual pode ser usado como prova da exposição ao agente nocivo.
4. O STJ mantém posicionamento de que o simples fornecimento de EPI, ainda que tal equipamento seja efetivamente utilizado, não afasta, por si só, a caracterização da atividade especial. Também está assentado que, se a eficácia do Equipamento de Proteção Individual implicar revolvimento da matéria fático-probatória, como é o presente caso, o conhecimento do Recurso Especial esbarra no óbice da Súmula 7/STJ.
5. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nessa parte, não provido.
(REsp 1.573.551, Segunda Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 19/05/2016.)
Não é demais frisar que, a partir da edição do Decreto 8.123/2013, que deu nova redação ao art. 68, § 4º, do Decreto 3.048/1999, em se tratando de exposição a agentes nocivos reconhecidamente cancerígenos em humanos, como é o caso do benzeno e do 1,3 butadieno, entre outros (anexo da Portaria Interministerial MTE/MS/MPS 09, de 07/10/2014), não se exige a superação de limite de tolerância, bastando a comprovação qualitativa dessa exposição, para o reconhecimento da atividade especial.
A esse respeito, cumpre consignar ser “firme o entendimento jurisprudencial de que, no caso específico de agentes reconhecidamente cancerígenos, a utilização do equipamento de proteção, seja individual, seja coletivo, não elide a exposição, ainda que considerado eficazes. Precedentes.” (AC 0022508-96.2010.4.01.3500, DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 03/10/2023 PAG.).
Nessa linha de orientação: TRF1, AC 1018383-82.2021.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL EULER DE ALMEIDA SILVA JUNIOR, TRF1 - NONA TURMA, PJe 06/03/2024 PAG.; TRF3, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5008677-03.2018.4.03.6104, Rel. Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES, julgado em 23/04/2024, DJEN DATA: 26/04/2024; e TRF4, AC 5041565-89.2019.4.04.7000, DÉCIMA TURMA, Relatora CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, juntado aos autos em 02/05/2024.
Fixadas essas diretrizes, passo à análise do caso concreto.
A parte recorrente assevera que não foi demonstrado o exercício de atividade em condições especiais nos seguintes períodos:
(a) 23/08/1996 a 27/06/1997 (ruído): alega que o nível de aferição seria incompatível com a atividade de motorista;
(b) 01/06/2002 a 01/12/2004 (agente químico): alega ausência de fundamentação legal e constitucional para o reconhecimento da especialidade de atividade de risco;
(c) 01/05/2010 a 21/10/2022 (ruído e agente químico): alega, quanto ao ruído, que o nível de aferição seria incompatível com a atividade de motorista, relativamente ao benzeno, que não havendo indicação que a atividade não se amolda àquelas descritas no código 1.0.3 do Decreto 2.172/97, não se justifica o tempo especial, além de o PPP indicar o uso de EPI eficaz.
Em relação ao período de 23/08/1996 a 27/06/1997, consta da CTPS acostada aos autos (ID 412868127, fl. 107) que o autor trabalhou na empresa Transgatão Transportes Comercio e Serviços Ltda. no cargo de motorista carreteiro. O PPP (ID 412868127, fl. 134) registra, para o período em referência (relativamente ao agente nocivo ruído ao qual exposto o autor), a intensidade de 91 dB, superior, portanto, ao limite máximo (80 e 90 dB) vigente à época. Atesta, também, a técnica utilizada para aferição conforme NR-15, bem como o nome do responsável técnico pelos registros ambientais no período.
Quanto ao período de 01/06/2002 a 01/12/2004, consta da CTPS acostada aos autos (ID 412868127, fl. 121) que o autor trabalhou na empresa Concórdia Transportes Rodoviários Ltda. no cargo de motorista carreteiro. O PPP (ID 412868127, fls. 136 e 140, datado de 24/09/2012) registra, para o período em referência, que o autor dirigia veículo tipo carreta para o transporte de produtos químicos (soda cáustica, ácido sulfúrico e metanol), atestando a avaliação qualitativa quanto à técnica utilizada, bem como o nome do responsável técnico pelos registros ambientais no período.
É firme o entendimento desta Corte no sentido de que “a atividade de motorista de caminhão, que trabalha em transporte de derivados de petróleo, com risco de explosão, deve ser considerada especial. Precedentes.” (AC 1004590-45.2018.4.01.3900, DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 01/03/2024 PAG.).
Também a exposição a ácido sulfúrico e soda cáustica, ensejam o reconhecimento da especialidade da atividade (cf. TRF4, AC 5003935-67.2018.4.04.7215, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, Relatora para Acórdão ERIKA GIOVANINI REUPKE, juntado aos autos em 15/02/2024).
No que se refere ao período de 01/05/2010 a 21/10/2022, consta da CTPS acostada aos autos (ID 412868127, fl. 122) que o autor foi contratado pela empresa Brasquímica – Transportes Rodoviários Ltda. no cargo de motorista carreteiro. O PPP (ID 412868125, datado de 21/10/2022) especifica, para o período em referência, que o autor esteve submetido a ruído nos períodos de 01/05/2010 a 02/06/2012 (95,6 dB(A)), 03/06/2012 a 30/10/2017 (80,2 dB(A)) e 31/10/2017 a 21/10/2022 (78,5 dB(A)), assim como exposto agentes químicos (benzeno, tolueno e etilbenzeno) nos períodos de 01/05/2010 a 02/06/2012, 03/06/2012 a 30/10/2017 e 31/10/2017 a 21/10/2022, indicando a técnica utilizada para medição (respectivamente, NHO 01 Dosimetria e NIOSH 1500 e 1501) bem como o nome do responsável técnico pelos registros ambientais no período.
Observa-se, portanto, que no período de 01/05/2010 a 02/06/2012 o autor esteve submetido a ruído (95,6 dB(A)) acima do limite máximo (85 dB) vigente à época, ao passo que no período de 03/06/2012 a 21/10/2022 esteve sujeito a benzeno, presente nos hidrocarbonetos aromáticos, tratando-se de agente nocivo cancerígeno para humanos, cuja exposição enseja o reconhecimento da atividade como especial.
Por fim, conforme consignado na sentença, ao tempo da Reforma da Previdência EC 103/2019 (13/11/2019) o autor contava com 41 anos, 07 meses e 19 dias de tempo de contribuição, bem como que na DER 14/12/2020 perfazia 42 anos, 08 meses e 20 dias de tempo de contribuição.
Comprovado, desse modo, o exercício de atividade especial no período questionado. Portanto, a manutenção da sentença, quanto ao ponto, é medida que se impõe.
Consectários legais
Juros e atualização monetária
Por fim, a correção monetária e os juros de mora, como consectários legais da condenação principal, possuem natureza de ordem pública e podem ser analisados de ofício pelos magistrados. Vejamos o entendimento do STJ:
PROCESSUAL CIVIL. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. QUESTÕES DE ORDEM PÚBLICA. ALTERAÇÃO. POSSIBILIDADE. 1. Consoante o entendimento do STJ, a correção monetária e os juros de mora, como consectários legais da condenação principal, possuem natureza de ordem pública e podem ser analisados pelas instâncias ordinárias até mesmo de ofício, o que afasta suposta violação do princípio do non reformatio in pejus. 2. Agravo interno não provido. (AGINT NO RESP N. 1.663.981/RJ, RELATOR MINISTRO GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, JULGADO EM 14/10/2019, DJE DE 17/10/2019).
Dessa forma, sobre o montante da condenação incidirão correção monetária e juros de mora nos termos estabelecidos pelo Manual de Cálculos da Justiça Federal atualizado, observados os parâmetros estabelecidos no RE 870.947 (Tema 810/STF) e no REsp 1.492.221 (Tema 905/STJ), respeitada a prescrição quinquenal.
Honorários recursais
Honorários de sucumbência majorados em 2%, ante o oferecimento de contrarrazões, nos termos do § 11 do art. 85 do Código de Processo Civil, e incidência com base na Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Dispositivo
Ante o exposto, CONHEÇO do recurso e, no mérito, NEGO PROVIMENTO à apelação do INSS. ALTERO, de ofício, os índices de correção monetária e de juros, para que incidam conforme Manual de Cálculos da Justiça Federal.
É como voto.
ASSINADO DIGITALMENTE
Alysson Maia Fontenele
Juiz Federal
Relator Convocado

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
GABINETE DA DESEMBARGADORA FEDERAL CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM
APELAÇÃO CÍVEL (198)1075978-23.2022.4.01.3300
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: WALDIR LUIZ DE SOUZA FILHO
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL, PREVIDENCIÁRIO E CONSTITUCIONAL. REVISÃO DE BENEFÍCIO. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. EXPOSIÇÃO A AGENTES NOCIVOS: RUÍDO E AGENTES QUÍMICOS. APRESENTAÇÃO DE PPP. REQUISITOS PREENCHIDOS. EQUIPAMENTO DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL. NÃO COMPROVAÇÃO DA EFETIVA NEUTRALIZAÇÃO DOS FATORES DE RISCO. RECURSO DE APELAÇÃO DO INSS DESPROVIDO. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA ALTERADOS DE OFÍCIO.
1. Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL em face de sentença (proferida em 15/01/2024) que reconheceu como especial os períodos que indica, condenando a Autarquia a proceder à revisão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição da parte autora a partir da citação (12/01/2023), acrescidos de correção monetária pelo INPC e juros conforme remuneração oficial da caderneta de poupança. Foi deferida a antecipação da tutela. Não houve remessa.
2. O pleito da parte recorrente consiste na reforma da sentença ao argumento, em síntese, de que não preenchidos os requisitos para o reconhecimento do trabalho em condições especiais.
3. Assente-se a dispensa da remessa necessária no presente caso concreto, em face do teor da norma do inciso I do § 3º do art. 496 do Código de Processo Civil, nos termos dos recentes precedentes do Superior Tribunal de Justiça (a propósito: REsp 1.735.097/RS; REsp 1.844.937/PR).
4. Com relação à exposição ao agente ruído, que sempre exigiu laudo técnico para sua comprovação, o Superior Tribunal de Justiça (Pet 9.059/RS 2012/0046729-7, Primeira Seção, Rel. Min. Benedito Gonçalves, unânime, DJe 09/09/2013), decidiu que “a contagem do tempo de trabalho de forma mais favorável àquele que esteve submetido a condições prejudiciais à saúde deve obedecer a lei vigente na época em que o trabalhador esteve exposto ao agente nocivo, no caso ruído.”. Conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça, “deve ser considerado o ruído de 80 dB até 5/3/97, de 90 Db a partir de 6/3/97 a 18/11/2003 (Decreto n. 2.172/97) e de 85 Db a partir de 19/11/2003 (Decreto n. 4.882/2003). Precedentes.” (EDcl nos EDcl no REsp n. 1.264.941/RS, relator Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em 22/9/2015, DJe de 19/10/2015.).
5. A exposição a agentes químicos, físicos e biológicos insalubres confere ao trabalhador o direito ao cômputo do tempo de serviço especial, relativamente ao período comprovado, por meio de formulário, consoante previsão constante dos Decretos 53.831/1964 e 83.080/1979, para as atividades desempenhadas até a entrada em vigor do Decreto 2.172/1997, a partir do qual a comprovação passou a ser por Laudo Técnico de Condições Ambientais do Trabalho – LTCAT, e com base nos agentes indicados no Decreto 3.048/1999.
6. Mesmo após 06/03/1997 tem a jurisprudência reconhecido que o formulário PPP, “por espelhar o laudo técnico” (Resp 1.649.102), pode ser utilizado como prova de trabalho prestado sob condições especiais. Com efeito, é firme o entendimento do STJ de que “trazido aos autos o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), dispensável se faz, para o reconhecimento e contagem do tempo de serviço especial do segurado, a juntada do respectivo Laudo Técnico de Condições Ambientais de Trabalho (LTCAT), na medida que o PPP já é elaborado com base nos dados existentes no LTCAT, ressalvando-se, entretanto, a necessidade da também apresentação desse laudo quando idoneamente impugnado o conteúdo do PPP” (Pet 10.262/RS, Primeira Seção, Rel. Min. Sérgio Kukina, DJe 16/02/2017)
7. Consoante disposto no art. 278, § 1º, I, da IN INSS/PRES 77/2015, a avaliação dos agentes nocivos constantes dos anexos 6, 13 e 14 da NR-15 será "apenas qualitativa, sendo a nocividade presumida e independente de mensuração, constatada pela simples presença do agente no ambiente de trabalho".
8. Na avaliação qualitativa da exposição a agentes químicos, não devem ser considerados os equipamentos de proteção coletiva ou individual, uma vez que não são suficientes para eliminar completamente a exposição a esses agentes, sendo firme no STJ o “posicionamento de que o simples fornecimento de EPI, ainda que tal equipamento seja efetivamente utilizado, não afasta, por si só, a caracterização da atividade especial” (REsp 1.573.551/RS).
9. Cumpre consignar ser “firme o entendimento jurisprudencial de que, no caso específico de agentes reconhecidamente cancerígenos, a utilização do equipamento de proteção, seja individual, seja coletivo, não elide a exposição, ainda que considerado eficazes. Precedentes.” (AC 0022508-96.2010.4.01.3500, DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 03/10/2023 PAG.).
10. Verifica-se dos autos que o autor esteve sujeito a ruído acima dos limites legais, assim como exposto a agentes químicos, ensejando o reconhecimento da especialidade das atividades exercidas.
11. “A atividade de motorista de caminhão, que trabalha em transporte de derivados de petróleo, com risco de explosão, deve ser considerada especial. Precedentes.” (AC 1004590-45.2018.4.01.3900, DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 01/03/2024 PAG.).
12. Também a exposição a ácido sulfúrico e soda cáustica, ensejam o reconhecimento da especialidade da atividade (cf. TRF4, AC 5003935-67.2018.4.04.7215, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, Relatora para Acórdão ERIKA GIOVANINI REUPKE, juntado aos autos em 15/02/2024).
13. Conforme consignado na sentença, ao tempo da Reforma da Previdência EC 103/2019 (13/11/2019) o autor contava com 41 anos, 07 meses e 19 dias de tempo de contribuição, bem como que na DER 14/12/2020 perfazia 42 anos, 08 meses e 20 dias de tempo de contribuição.
14. A correção monetária e os juros de mora, como consectários legais da condenação principal, possuem natureza de ordem pública e podem ser analisados de ofício pelos magistrados, conforme entendimento do STJ (AGINT NO RESP N. 1.663.981/RJ, RELATOR MINISTRO GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, JULGADO EM 14/10/2019, DJE DE 17/10/2019). Dessa forma, sobre o montante da condenação incidirão correção monetária e juros de mora nos termos estabelecidos pelo Manual de Cálculos da Justiça Federal atualizado, observados os parâmetros estabelecidos no RE 870.947 (Tema 810/STF) e no REsp 1.492.221 (Tema 905/STJ), respeitada a prescrição quinquenal.
15. Apelação do INSS desprovida. Índices de correção monetária e de juros alterados de ofício.
ACÓRDÃO
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, NEGAR PROVIMENTO à apelação do INSS e ALTERAR de ofício os índices de correção monetária e de juros, nos termos do voto do Relator.
Brasília, na data lançada na certidão do julgamento.
ASSINADO DIGITALMENTE
Alysson Maia Fontenele
Juiz Federal
Relator Convocado