
POLO ATIVO: MARIA DE LARA PEREIRA ALVES
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: EDSON DIAS DE ARAUJO - TO6299-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):NILZA MARIA COSTA DOS REIS

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
APELAÇÃO CÍVEL (198)1015109-42.2023.4.01.9999
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
Trata-se de apelação interposta pela parte autora de sentença na qual o processo foi extinto, com resolução do mérito, homologando a renúncia ao direito sobre o qual se funda a ação (fl. 65).
Em suas razões, a apelante pugna pela reforma da sentença para que seja homologada a desistência requerida, julgando extinto o processo, sem resolução do mérito, em razão da inexistência de renúncia expressa nos autos (fls.167/174).
Devidamente intimado, o INSS não apresentou contrarrazões (fl. 175).
É o relatório.

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
A apelação interposta pela parte autora preenche os requisitos de admissibilidade e, portanto, merece ser conhecida.
Compulsando os autos, verifico que a parte autora formulou pedido de desistência da ação no curso da lide. O réu foi instado a se manifestar e sustentou a impossibilidade de desistência da ação, sem renúncia expressa ao direito sobre o qual se funda a ação, deixando, assim, de concordar com o pleito formulado pela ora apelante.
De fato, é facultado à parte autora a desistência da ação até a data da prolação da sentença, observada, no entanto, a necessidade da aquiescência do réu após a apresentação da contestação (CPC, art. 485, parágrafos 4º e 5º).
O Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar o REsp nº 1.267.995/PB, sob o procedimento de julgamento do recurso repetitivo (art. 543-C do CPC/1973) decidiu que não pode ser homologada a desistência da ação, sem consentimento do réu, após o escoamento do prazo de contestação.
O acórdão recebeu a seguinte ementa:
"PROCESSUAL CIVIL. RECURSO REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. DESISTÊNCIA DA AÇÃO. NÃO CONSENTIMENTO DO RÉU. ART. 3º DA LEI 9.469/97. LEGITIMIDADE.
1. Segundo a dicção do art. 267, § 4º, do CPC, após o oferecimento da resposta, é defeso ao autor desistir da ação sem o consentimento do réu. Essa regra impositiva decorre da bilateralidade formada no processo, assistindo igualmente ao réu o direito de solucionar o conflito. Entretanto, a discordância da parte ré quanto à desistência postulada deverá ser fundamentada, visto que a mera oposição sem qualquer justificativa plausível importa inaceitável abuso de direito.
2. No caso em exame, o ente público recorrente condicionou sua anuência ao pedido de desistência à renúncia expressa do autor sobre o direito em que se funda a ação, com base no art. 3º da Lei 9.469/97.
3. A existência dessa imposição legal, por si só, é justificativa suficiente para o posicionamento do recorrente de concordância condicional com o pedido de desistência da parte adversária, obstando a sua homologação.
4. A orientação das Turmas que integram a Primeira Seção desta Corte firmou-se no sentido de que, após o oferecimento da contestação, não pode o autor desistir da ação, sem o consentimento do réu (art. 267, § 4º, do CPC), sendo que é legítima a oposição à desistência com fundamento no art. 3º da Lei 9.469/97, razão pela qual, nesse caso, a desistência é condicionada à renúncia expressa ao direito sobre o qual se funda a ação.
5. Recurso especial provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ n. 8/08."
(REsp 1.267.995/PB, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, DJe de 03.08.2012)
O caso dos autos, entretanto, é distinto daquele apreciado pela Corte Superior.
A finalidade da norma contida no art. 484, §4º do CPC, foi a de permitir ao réu examinar seu interesse em concordar com a extinção do processo, sem apreciação do mérito, em vista da possibilidade de a ação ser renovada posteriormente.
No caso das ações previdenciárias, entretanto, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça se firmou, também em procedimento de recursos repetitivos, em que a ausência de conteúdo probatório a instruir a inicial implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito, vejamos:
"DIREITO PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL APTA A COMPROVAR O EXERCÍCIO DA ATIVIDADE RURAL. CARÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DO PROCESSO. EXTINÇÃO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO. RECURSO ESPECIAL DO INSS DESPROVIDO.
1. Tradicionalmente, o Direito Previdenciário se vale da processualística civil para regular os seus procedimentos, entretanto, não se deve perder de vista as peculiaridades das demandas previdenciárias, que justificam a flexibilização da rígida metodologia civilista, levando-se em conta os cânones constitucionais atinentes à Seguridade Social, que tem como base o contexto social adverso em que se inserem os que buscam judicialmente os benefícios previdenciários.
2. As normas previdenciárias devem ser interpretadas de modo a prestigiar os valores morais albergados pela Constituição Federal/1988; assim, deve-se procurar encontrar na hermenêutica previdenciária a solução que mais se aproxime do caráter social da Carta Magna, a fim de que as normas processuais não venham a obstar a concretude do direito fundamental à prestação previdenciária a que faz jus o segurado, quando preenchidos os requisitos próprios.
3. A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC), com a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa.
4. Recurso Especial do INSS desprovido."
(REsp 1352875/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 22/02/2017, DJe 20/03/2017)
Dessa forma, permite-se ao autor das ações previdenciárias propor novamente a ação, mesmo nos casos em que, no processo anterior, tenha se concluído pela ausência de prova de suas alegações.
A proibição de desistir da ação, portanto, não pode ser aplicada nesses casos, em vista da impossibilidade lógica de ser alcançada a finalidade da norma, ou seja, impedir novo ajuizamento da ação.
Não é por outro motivo que, em casos semelhantes, esta Corte tem decidido que nas causas relativas a benefício de natureza alimentar, a decisão judicial produz efeitos secundum eventum litis ou secundum eventum probationis, de modo que o segurado ou seu beneficiário pode propor nova ação com o mesmo fim quando possuir novas provas ou agregar todos os requisitos posteriormente.
Nesse sentido são os seguintes precedentes, entre outros:
"PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. JUÍZO DE RETRATAÇÃO. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. DESISTÊNCIA DA AÇÃO REQUERIDA APÓS A CONTESTAÇÃO. NÃO CONSENTIMENTO DO RÉU. ART. 3º DA LEI N. 9.469/97. RENÚNCIA AO DIREITO SOBRE O QUAL SE FUNDA A AÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO REPETITIVO N. 1.267.995/PB. STJ. INAPLICABILIDADE.
1. Em face do julgado no Recurso Repetitivo 1.267.995/PB, no que decidiu concernente à impossibilidade de desistência da ação sem consentimento do réu, com fundamento no art. 3º da Lei n. 9.469/97, a Vice-Presidência desta Corte determinou o retorno dos autos a esta 1ª Turma para o fim previsto no art. 1.040, II do CPC/2015 (art. 543-C, § 7º, II, do CPC/1973).
2. Sucede que esse repetitivo versa matéria concernente à servidor público e não à matéria previdenciária, não se podendo condicionar a desistência da ação à renúncia de um direito que, tendo natureza alimentar, pode, no futuro, vir o segurado a dele necessitar, não havendo óbice legal a que se postule o benefício pretendido em outra oportunidade, em face da imprescritibilidade do direito ao benefício previdenciário.
3. O direito ao benefício previdenciário é sempre avaliado conforme situação fática atual, de modo que não se há de falar, na espécie, de aplicação ao caso do decidido no Recurso Repetitivo do STJ.
4. Em juízo de retratação, ratifica-se, na íntegra, o acórdão que deu provimento à apelação da parte autora para extinguir o processo, sem resolução do mérito, em razão da desistência da autora, nos termos do art. 485, VIII, do CPC; devolução dos autos para exame de admissibilidade dos recursos, nos termos do art. 1.041 do CPC/2015 (arts. 543-B, § 4º, e 543-C, § 8º, e do CPC/1973)".
(AC 0009278-15.2017.4.01.9199, DESEMBARGADOR FEDERAL JAMIL ROSA DE JESUS OLIVEIRA, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, e-DJF1 08/10/2020) Parte superior do formulário
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. DESISTÊNCIA DA AÇÃO. HOMOLOGAÇÃO. AUSÊNCIA DE CONCORDÂNCIA DA AUTARQUIA PREVIDENCIÁRIA. DESNECESSIDADE. COISA JULGADA SECUNDUM EVENTUM LITIS OU SECUNDUM EVENTUM PROBATIONIS. APELAÇÃO IMPROVIDA.
1. Trata-se de apelação interposta pelo INSS, em face de sentença que, em rito ordinário, homologou o pedido de desistência da ação e julgou extinto o processo, sem resolução do mérito nos termos do Art. 485, VIII, do CPC/2015, embora não tenha concordado com a desistência, sem a renúncia expressa do direito sobre o qual se funda a ação.
2. A jurisprudência tem decidido que, para que seja homologada a desistência do autor, é imperativa a manifestação do réu concordando com o pedido, segundo o art. 485, § 4º, do CPC/2015.
3. As ações de natureza previdenciária a decisão judicial faz coisa julgada secundum eventum litis ou secundum eventum probationis, nada impede que, havendo novas provas ou completando-se os requisitos necessários à obtenção do benefício, nova ação seja proposta pelo segurado para o mesmo fim.
4. A negativa do INSS em aceitar a desistência da ação da parte autora é inútil, pois não evitará a reiteração da demanda, ainda que ao mesmo fundamento ou desde que, por razões diversas, sejam carreadas novas provas.
5. Apelação não provida."
(AC 1014910-5.2020.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL RAFAEL PAULO, TRF1 - SEGUNDA TURMA, PJe 30/03/2022) (grigos não originais).
Com base nestes elementos, constata-se que a resistência do INSS à desistência da ação, ou a pretensão de condicioná-la à renúncia ao direito em que se funda a ação, não possui relevância jurídica, porque os benefícios previdenciários podem ser requeridos a qualquer tempo, observada a prescrição tão somente das parcelas vencidas no prazo da lei, podendo o segurado até mesmo não mais prosseguir com a ação porque tenha se desinteressado momentaneamente pelo benefício.
Com esses fundamentos,dou provimento à apelação da parte autora para reformar a sentença e homologar o pedido de desistência da ação e, por conseguinte, julgar extinto o processo sem resolução do mérito
É como voto.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS
RELATORA

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
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APELAÇÃO CÍVEL (198)1015109-42.2023.4.01.9999
MARIA DE LARA PEREIRA ALVES
Advogado do(a) APELANTE: EDSON DIAS DE ARAUJO - TO6299-A
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. DESISTÊNCIA DA AÇÃO APÓS CONTESTAÇÃO. CONSENTIMENTO DO RÉU (ART. 485, § 4º, DO CPC/2015). DESNECESSIDADE. APLICAÇÃO DO DISPOSTO NO ART. 3º DA LEI 9.469/1997. NÃO CABIMENTO. SENTENÇA REFORMADA. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO.
1. O Superior Tribunal de Justiça decidiu, em procedimento de recurso repetitivo, que após o oferecimento da resposta, é defeso ao autor desistir da ação sem o consentimento do réu. Decidiu, também, que a imposição legal prevista no art. 3º da Lei nº 9.469/11997, direcionada aos entes públicos, que condicionou a aquiescência à extinção do processo a renúncia do direito sobre o que se funda a ação, por si só, é justificativa a concordância condicional com o pedido de desistência da parte adversária, obstando a sua homologação (REsp 1.267.995/PB, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, DJe de 03.08.2012).
2. No caso de ações previdenciárias, entretanto, a Corte Superior decidiu, também em sede de recurso repetitivo, que a ausência de conteúdo probatório eficaz, a instruir a inicial, impõe a sua extinção sem o julgamento do mérito, com a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação, caso reúna os elementos necessários (REsp 1352875/SP, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Seção, julgado em 22/02/2017, DJe 20/03/2017).
3. A proibição de homologação da desistência, sem o consentimento do réu, portanto, não pode ser aplicada nas ações previdenciárias, em vista da impossibilidade lógica de ser alcançada a finalidade da norma, ou seja, impedir novo ajuizamento da ação.
4.Apelação da parte autora provida para homologar o pedido de desistência da ação e julgar extinto o processo sem resolução do mérito, nos termos do art.485,VIII, doCPC/15.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora para julgar extinto o processo sem resolução do mérito, nos termos do voto da relatora.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Desembargadora Federal NILZA REIS Relatora