
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:MARLENE DE FREITAS LOPES
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: EMERSON MARQUES TOMAZ - GO54450-A
RELATOR(A):EDUARDO MORAIS DA ROCHA
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 01 - DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) n. 1017655-70.2023.4.01.9999
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra sentença que julgou procedente o pedido inicial, para condená-lo ao pagamento mensal de um salário-mínimo à parte requerente, a título de benefício de auxílio-reclusão rural, com efeitos retroativos à data do indeferimento administrativo.
O apelante aduz, em síntese, que não ficou comprovada a condição de segurado especial do recluso ou que ele se enquadre no conceito de baixa renda, nem a união estável entre ele e a autora, bem como não foi apresentada a certidão que comprova o recolhimento à prisão, requisito indispensável para o deferimento do benefício.
Houve apresentação de contrarrazões.
A Procuradoria Regional da República opinou pela anulação, de ofício, da sentença.
É o relatório.
Desembargador Federal MORAIS DA ROCHA
Relator
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 01 - DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) n. 1017655-70.2023.4.01.9999
V O T O
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA (RELATOR):
A sentença foi proferida na vigência do CPC/2015.
O auxílio-reclusão está previsto dentre os benefícios do Regime Geral de Previdência Social, nos termos do art. 18, II, b, e do art. 80, ambos da Lei nº. 8.213/91, segundo o qual ela será devida, nas mesmas condições da pensão por morte, aos dependentes do segurado recolhido à prisão, que não receber remuneração da empresa nem estiver em gozo de auxílio-doença, de aposentadoria ou de abono de permanência em serviço.
A jurisprudência do STJ assentou que os requisitos para a concessão do benefício devem ser verificados no momento do recolhimento à prisão, em observância ao princípio tempus regit actum.
Na hipótese de reclusão ocorrida antes da vigência da MP 871/2019, posteriormente convertida na Lei 13.846/2019, eram requisitos para a concessão do benefício de auxílio-reclusão a qualidade de segurado da Previdência Social daquele recolhido à prisão, a comprovação de dependência e a comprovação de efetivo recolhimento à prisão.
O art. 39, da Lei. 8.213/91, prevê que: “Para os segurados especiais, referidos no inciso VII do caput do art. 11 desta Lei, fica garantida a concessão: I - de aposentadoria por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílio-reclusão ou de pensão, no valor de 1 (um) salário mínimo, e de auxílio-acidente, conforme disposto no art. 86 desta Lei, desde que comprovem o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao número de meses correspondentes à carência do benefício requerido”, redação vigente à época da reclusão do segurado.
Para fins previdenciários, a comprovação da união estável pode se dar por qualquer meio idôneo de prova.
No caso dos autos, trata-se de pedido de pagamento de auxílio-reclusão por companheira do recluso, que foi preso em 17/01/2017, no regime fechado, tendo sido negado requerimento administrativo, formulado em 09/07/2019, por ausência de comprovação da união estável.
Com a inicial foram juntados os seguintes documentos: certidão de nascimento da filha do recluso, nascida em 2010 (mas esta não é filha da autora), em que consta sua profissão como lavrador; certidão carcerária datada de 2019, em que consta que o recluso encontra-se cumprindo pena em regime fechado desde 17/01/2017; CNIS do recluso em que consta alguns vínculos como empregado em 2011 e 2012.
Verifica-se que, enquanto a parte autora pleiteia a concessão de auxílio-reclusão rural, a sentença fundamentou sua análise acerca da aposentadoria por idade rural, sendo certo que os requisitos necessários a um e outro benefício são distintos. Portanto, não tendo sido analisada a questão que levou ao indeferimento do pedido na via administrativa, qual seja, a existência de união estável, a sentença deve ser anulada.
Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. CONTRADIÇÃO ENTRE FUNDAMENTAÇÃO E DISPOSITIVO DA SENTENÇA. "SENTENÇA SUICIDA". NULIDADE RECONHECIDA DE OFÍCIO. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. APELAÇÃO PREJUDICADA. 1. No caso dos autos, o magistrado a quo discorreu exclusivamente sobre os requisitos para concessão de aposentadoria híbrida, concluindo que o autor teria tempo de labor rural e urbano suficiente para cumprimento da carência. No dispositivo, no entanto, concedeu a aposentadoria rural. 2. A incongruência entre a fundamentação e o dispositivo em sentença equivale a ausência de fundamentação, estando a sentença eivada de vício insanável e reconhecível de ofício ("sentença suicida"). 3. In casu, não é possível a aplicação do art. 1.013, § 3º do CPC, havendo necessidade de produção de novas provas na primeira instância. 4. Apelação prejudicada. Sentença anulada, com retorno dos autos ao juízo de origem para a regularização processual. (AC 0058968-13.2017.4.01.9199, DESEMBARGADOR FEDERAL URBANO LEAL BERQUO NETO, TRF1 - NONA TURMA, PJe 13/09/2023 PAG.)
Desse modo, os requisitos devem ser analisados.
Inaplicabilidade, na espécie, do disposto no art. 1.013, §3º, do CPC/2015. É que, existindo outro beneficiário do auxílio-reclusão pleiteado, é medida que se impõe a sua integração à relação jurídico-processual, na qualidade de litisconsorte passivo necessário, devendo ser providenciada a sua citação para integrar a lide. É que se mostra necessária a participação de outros dependentes do recluso para compor a lide, em face da previsão contida no art. 16 da Lei 8.213/91, o que configura obstáculo intransponível ao prosseguimento da presente demanda.
Ocorre que a demanda transcorreu sem que fosse oportunizada à filha do recluso, que não é filha da autora, para a defesa de seus interesses no feito, circunstância que caracterizada nulidade processual.
Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-RECLUSÃO. FILHA MENOR. LEGITIMIDADE. AUSÊNCIA DE CITAÇÃO. NULIDADE. LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO. 1. A existência de filha menor beneficiada com auxílio-reclusão, em outra lide, enseja citação, para participação do feito, visto que eventual procedência do pedido trará reflexos ao seu benefício. 2. O litisconsórcio necessário ocorre quando a lei obriga a presença na ação de todas as pessoas titulares da mesma relação jurídica, sob pena de nulidade e posterior extinção do feito sem análise do mérito. 3. Apelação do INSS provida, para anular a sentença e determinar a citação da parte interessada. (AC 1002672-08.2019.4.01.9999, DESEMBARGADORA FEDERAL GILDA SIGMARINGA SEIXAS, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 12/03/2020 PAG.)
Ante o exposto, anulo a sentença de ofício, determinando o retorno dos autos ao Juízo de origem para regular processamento do feito, ficando prejudicada a apelação.
É como voto.
Desembargador Federal MORAIS DA ROCHA
Relator
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 01 - DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1017655-70.2023.4.01.9999
RELATOR: Des. MORAIS DA ROCHA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARLENE DE FREITAS LOPES
Advogado do(a) APELADO: EMERSON MARQUES TOMAZ - GO54450-A
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AUXÍLIO-RECLUSÃO. SENTENÇA QUE ANALISOU PEDIDO DE APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. FALTA DE CORRESPONDÊNCIA ENTRE A FUNDAMENTAÇÃO E O DISPOSITIVO. NULIDADE RECONHECIDA DE OFÍCIO. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DO ART. 1.013, §3º, DO CPC/2015. AUSÊNCIA DE PARTICIPAÇÃO NO FEITO DA FILHA MENOR DO RECLUSO. LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO. SENTENÇA ANULADA DE OFÍCIO. APELAÇÃO PREJUDICADA.
1. O auxílio-reclusão está previsto dentre os benefícios do Regime Geral de Previdência Social, nos termos do art. 18, II, b, e do art. 80, ambos da Lei nº. 8.213/91, segundo o qual ela será devida, nas mesmas condições da pensão por morte, aos dependentes do segurado recolhido à prisão, que não receber remuneração da empresa nem estiver em gozo de auxílio-doença, de aposentadoria ou de abono de permanência em serviço.
2. No caso dos autos, trata-se de pedido de pagamento de auxílio-reclusão de companheira do recluso, que foi preso em 17/01/2017, no regime fechado, tendo sido negado requerimento administrativo, formulado em 09/07/2019, por ausência de comprovação da união estável.
5. Verifica-se que, enquanto a parte autora pleiteia a concessão de auxílio-reclusão rural, a sentença fundamentou sua análise quanto ao benefício de aposentadoria por idade rural, sendo certo que os requisitos necessários a um e outro benefício são distintos. Portanto, não tendo sido analisada a questão que levou ao indeferimento do pedido na via administrativa, qual seja, a existência de união estável, a sentença deve ser anulada.
6. Inaplicabilidade do disposto no art. 1.013, §3º, do CPC/2015, pois a demanda teve o seu processamento sem que fosse oportunizada à filha do recluso (e que não é filha da autora) a defesa de seus interesses nos autos, circunstância que caracterizada nulidade processual, em face da necessidade de integração da lide como litisconsorte necessário.
8. Sentença anulada de ofício. Apelação prejudicada.
A C Ó R D Ã O
Decide a Primeira Turma, por unanimidade, anular de ofício a sentença e julgar prejudicada a apelação da parte autora, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF, data da sessão de julgamento.
Desembargador Federal MORAIS DA ROCHA