
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
POLO PASSIVO:JORACY GONCALVES
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: SERGIO GOMES DE OLIVEIRA FILHO - RO7519
RELATOR(A):MARCELO VELASCO NASCIMENTO ALBERNAZ
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1001678-14.2018.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: JORACY GONCALVES
Advogado do(a) APELADO: SERGIO GOMES DE OLIVEIRA FILHO - RO7519
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Trata-se de apelação do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS em face de sentença que concedeu o benefício de auxílio-doença, em favor da parte autora.
Em razões de apelação, a autarquia previdenciária sustenta, em síntese, que o companheiro da requerente é empresário, sócio de empresa ativa, e produtor rural de larga escala, descaracterizando a economia de subsistência, circunstâncias essas que não se coadunam com as condições econômicas de quem afirma tratar-se de segurado especial em regime de economia familiar.
Pugnou pela reforma da sentença do Juízo de origem, com a improcedência dos pedidos constantes da exordial da parte autora.
Não foram apresentadas contrarrazões.
É o relatório.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1001678-14.2018.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: JORACY GONCALVES
Advogado do(a) APELADO: SERGIO GOMES DE OLIVEIRA FILHO - RO7519
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Preliminarmente, consigno que o recurso preenche os requisitos subjetivos e objetivos de admissibilidade.
Mérito
Os requisitos indispensáveis para a concessão do benefício previdenciário de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez são: a) a qualidade de segurado; b) a carência de 12 (doze) contribuições mensais, salvo nas hipóteses previstas no art. 26, II, da Lei n. 8.213/91; c) a incapacidade parcial ou total e temporária (auxílio-doença) ou permanente e total (aposentadoria por invalidez) para atividade laboral.
Das provas – qualidade de segurado especial
O reconhecimento da qualidade de segurado especial desafia o preenchimento dos seguintes requisitos fundamentais: a existência de início de prova material da atividade rural exercida e a corroboração dessa prova indiciária por robusta prova testemunhal.
O art. 106 da Lei nº 8.213/91 elenca diversos documentos aptos à comprovação do exercício de atividade rural, sendo pacífico na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que tal rol é meramente exemplificativo (REsp 1.719.021/SP, Segunda Turma, Relator Ministro Herman Benjamin, julgado em 1º/3/2018, DJe 23/11/2018).
Assim, a fim de comprovar o tempo de serviço rural, a jurisprudência admite outros documentos além dos previstos na norma legal, tais com a certidão de casamento, a carteira de sindicato rural com comprovantes de recolhimento de contribuições, o boletim escolar de filhos que tenham estudado em escola rural (STJ AgRG no REsp 967344/DF), certidão de casamento que atesta a condição de lavrador do cônjuge ou do próprio segurado (STJ, AR 1067/SP, AR1223/MS); declaração de Sindicato de Trabalhadores Rurais, devidamente homologada pelo Ministério Público (STJ, AR3202/CE), desde que contemporâneos ao período que se pretende comprovar.
Por fim, convém registrar que documentos tais como carteiras, comprovantes e declarações de sindicatos sem a devida homologação do INSS e do Ministério Público; a certidão eleitoral com anotação indicativa da profissão de lavrador; declarações escolares, de Igrejas, de ex-empregadores e afins; prontuários médicos em que constem as mesmas anotações; além de outros que a esses possam se assemelhar não são aptos a demonstrar o início de prova material na medida em que não se revestem de maiores formalidades.
Caso dos autos
A controvérsia dos autos cinge-se à comprovação da qualidade de segurado especial da parte autora, uma vez que a apelada cumpriu o requisito da incapacidade laborativa para a concessão de benefício por incapacidade.
Assiste razão ao apelante.
Com efeito, no caso, em que pese os documentos acostados com a inicial indicarem o início de prova material do exercício da atividade rural no período de carência (documentos do companheiro da autora), a autarquia previdenciária acostou aos autos comprovante que revela que o companheiro da autora (titular da terra e do grupo familiar), Senhor Pedro de Paulo Carvalho, é empresário individual na empresa PAULINHO MAQUINA E EQUIPAMENTO DE TERRAPLENAGENS LTDA, com atividade econômica principal de “Obras de terraplenagem” e secundárias de: “Aluguel de máquinas e equipamentos para construção sem operador, exceto andaimes”, “Serviço de preparação de terreno, cultivo e colheita”, “Atividades de apoio à agricultura não especificadas anteriormente” e “Criação de bovinos para corte”, com situação cadastral ativa em 11/04/2018 e data de início de atividade em 03/07/2013 (ID 2322493 - Pág. 16 – fl. 101).
Cumpre destacar também que há cadastro no SINTEGRA informando que o companheiro da autora é Produtor Rural com atividades no ramo de criação de bovinos para corte e extração de madeiras em florestas nativas (ID 2322493 - Pág. 25/24 – fl. 109/110). Quanto à atividade de venda de gado de corte, consta nos autos nota fiscal de venda de gado de corte emitida no ano de 2.008 no valor de R$ 47.561,85 (ID 2322486 - Pág. 8 – fl. 34).
De se notar, ainda, que a autora e seu companheiro têm registrado em seu nome (06) seis veículos, sendo os mais importantes deles: dois caminhões, uma caminhonete Hilux modelo 2013, tendo a presente ação sido ajuizada em 2017, portanto à época do ajuizamento não se tratava o veículo de modelo antigo ou popular. Esses veículos, em especial a Hilux, possuem valor expressivo, o que também aponta para o não enquadramento na condição de trabalhador rural em regime de economia familiar.
As circunstâncias comprovadas pelo INSS, de fato, são incompatíveis com o desempenho de atividade campesina de subsistência.
Há um componente de fato relevante para a configuração da qualidade de segurado de quem afirma exercer atividade campesina, qual seja, a atividade deve ser exercida em regime de economia familiar. A força produtiva da família deve estar de forma principal voltada para a produção rural ou, ao menos, essa deve representar parcela relevante da renda, tornando-a indispensável para a manutenção do padrão de vida e atendimento das necessidades.
Nesse sentido, de acordo com o Regulamento da Previdência Social (Decreto 3.048/99, art. 9, § 5º), “entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes.”
Mesmo os documentos que, em regra, são admitidos como início de prova material do labor rural alegado, passam a ter afastada essa serventia, quando confrontados com outros documentos que ilidem a condição campesina outrora demonstrada.
Desta forma, não faz jus a postulante ao benefício de auxílio-doença rural (segurado especial), porquanto as provas reunidas descaracterizam o desempenho de atividade campesina de subsistência, não se confirmando, destarte, a alegada qualidade de segurado especial/cumprimento da carência.
Assim, a reforma da sentença é medida que se impõe.
Da inexistência de litigância de má-fé
No presente caso, não se vislumbra ato de litigância de má-fé, não sendo devida a aplicação da multa.
Consectários legais
Inverto os ônus da sucumbência, ficando a parte vencida condenada em custas e honorários advocatícios em favor da parte vencedora, englobando trabalho do advogado em primeiro e segundo graus (art. 85, §11, CPC), que ora fixo em 1% (um por cento) acima dos percentuais mínimos previstos no art. 85, §§ 2º e 3º, do CPC, sobre o valor atualizado da causa. Suspensa sua exigibilidade em razão da assistência judiciária gratuita deferida.
Eventuais valores pagos a título de tutela provisória estarão sujeitos a restituição, conforme Tema 692/STJ: “A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago”.
CONCLUSÃO
Ante o exposto, dou provimento à apelação do INSS para julgar improcedente o pedido de concessão de auxílio-doença rural.
É como voto.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1001678-14.2018.4.01.9999
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: JORACY GONCALVES
Advogado do(a) APELADO: SERGIO GOMES DE OLIVEIRA FILHO - RO7519
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AUXÍLIO-DOENÇA. TRABALHADOR RURAL. COMPANHEIRO EMPRESÁRIO. PRODUTOR RURAL LARGA ESCALA. PROPRIEDADE DE VEÍCULOS. DESCARACTERIZAÇÃO DO REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. IMPOSSIBILIDADE DE DEFERIMENTO DO BENEFÍCIO.
1. Os requisitos indispensáveis para a concessão do benefício previdenciário de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez são: a) a qualidade de segurado; b) a carência de 12 (doze) contribuições mensais, salvo nas hipóteses previstas no art. 26, II, da Lei n. 8.213/91; c) a incapacidade parcial ou total e temporária (auxílio-doença) ou permanente e total (aposentadoria por invalidez) para atividade laboral.
2. O reconhecimento da qualidade de segurado especial desafia o preenchimento dos seguintes requisitos fundamentais: a existência de início de prova material da atividade rural exercida e a corroboração dessa prova indiciária por robusta prova testemunhal.
3. A controvérsia dos autos cinge-se à comprovação da qualidade de segurado especial da parte autora, uma vez que a apelada cumpriu o requisito da incapacidade laborativa para a concessão de benefício por incapacidade.
4. No caso, em que pese os documentos acostados com a inicial indicarem o início de prova material do exercício da atividade rural no período de carência (documentos do companheiro da autora), a autarquia previdenciária acostou aos autos comprovante que revela que o companheiro da autora (titular da terra e do grupo familiar), Senhor Pedro de Paulo Carvalho, é empresário individual na empresa PAULINHO MAQUINA E EQUIPAMENTO DE TERRAPLENAGENS LTDA, com atividade econômica principal de “Obras de terraplenagem” e secundárias de: “Aluguel de máquinas e equipamentos para construção sem operador, exceto andaimes”, “Serviço de preparação de terreno, cultivo e colheita”, “Atividades de apoio à agricultura não especificadas anteriormente” e “Criação de bovinos para corte”, com situação cadastral ativa em 11/04/2018 e data de início de atividade em 03/07/2013 (ID 2322493 - Pág. 16 – fl. 101).
5. Cumpre destacar também que há cadastro no SINTEGRA informando que o companheiro da autora é Produtor Rural com atividades no ramo de criação de bovinos para corte e extração de madeiras em florestas nativas (ID 2322493 - Pág. 25/24 – fl. 109/110). Quanto à atividade de venda de gado de corte, consta nos autos nota fiscal de venda de gado de corte emitida no ano de 2.008 no valor de R$ 47.561,85 (ID 2322486 - Pág. 8 – fl. 34).
6.De se notar, ainda, que a requerente e seu companheiro têm registrados em seu nome (06) seis veículos, sendo os mais importantes deles: dois caminhões, uma caminhonete Hillux modelo 2013, tendo a presente ação sido ajuizada em 2017. Esses veículos, em especial a Hillux, possuem valor expressivo, o que também aponta para o não enquadramento na condição de trabalhador rural em regime de economia familiar.
7. As circunstâncias comprovadas pelo INSS, de fato, são incompatíveis com o desempenho de atividade campesina de subsistência. Nesse sentido, de acordo com o Regulamento da Previdência Social (Decreto 3.048/99, art. 9, § 5º), “entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes.”
8. Mesmo os documentos que, em regra, são admitidos como início de prova material do labor rural alegado, passam a ter afastada essa serventia, quando confrontados com outros documentos que ilidem a condição campesina outrora demonstrada. Assim, a reforma da sentença é medida que se impõe.
9. No presente caso, não se vislumbra ato de litigância de má-fé, não sendo devida a aplicação da multa.
10. Inverto os ônus da sucumbência, ficando a parte vencida condenada em custas e honorários advocatícios em favor da parte vencedora, englobando trabalho do advogado em primeiro e segundo graus (art. 85, §11, CPC), que ora fixo em 1% (um por cento) acima dos percentuais mínimos previstos no art. 85, §§ 2º e 3º, do CPC, sobre o valor atualizado da causa. Suspensa sua exigibilidade em razão da assistência judiciária gratuita deferida.
11. Eventuais valores pagos a título de tutela provisória estarão sujeitos a restituição, conforme Tema 692/STJ: “A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago”.
12. Apelação do INSS a que se dá provimento para julgar improcedente o pedido.
A C Ó R D Ã O
Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação do INSS, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator