
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:LEANDRA DE OLIVEIRA MAGALHAES
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: NILSON TOMAZ DA SILVA JUNIOR - MT23151/O
RELATOR(A):NILZA MARIA COSTA DOS REIS
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
APELAÇÃO CÍVEL (198)1005532-06.2024.4.01.9999
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
Trata-se de apelação interposta pelo INSS, de sentença na qual foi julgado procedente o pedido de concessão de auxílio-doença, a partir de 29/11/2021, sendo o benefício convertido em aposentadoria por invalidez desde a data de ciência do laudo pericial (fls. 03/03/2023) - fls. 133/135¹.
A autarquia foi condenada no pagamento das custas processuais, além de honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas, considerada a Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Na apelação (fls. 137/142), o INSS sustenta, em síntese, que o caso é de incapacidade temporária, impondo-se a conversão do benefício de aposentadoria por invalidez em auxílio-doença. Caso mantida a sentença, requer o prequestionamento da matéria para fins recursais, além de apresentar os seguintes pedidos eventuais:
“A observância da prescrição quinquenal; Seja a parte intimada a firmar e juntar aos autos a autodeclaração prevista no anexo I da Portaria INSS nº 450, de 03 de abril de 2020, em observância às regras de acumulação de benefícios estabelecida no art. 24, §§ 1.º e 2.º da Emenda Constitucional 103/2019; Nas hipóteses da Lei 9.099/95, caso inexista nos autos declaração com esse teor, seja a parte autora intimada para que renuncie expressamente aos valores que excedam o teto de 60 (sessenta) salários mínimos na data da propositura da ação e que eventualmente venham a ser identificados ao longo do processo, inclusive em sede de execução (renúncia expressa condicionada); A fixação dos honorários advocatícios nos termos da Súmula 111 do STJ; A declaração de isenção de custas e outras taxas judiciárias; O desconto, de eventual montante retroativo, dos valores já pagos administrativamente ou de qualquer benefício inacumulável recebido no período, bem como pelo deferimento da cobrança de eventuais valores pagos indevida”.
Foram apresentadas contrarrazões.
É o relatório.
¹Os números de folhas indicados referem-se à rolagem única, ordem crescente.
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
O recurso reúne os requisitos de admissibilidade, merecendo ser conhecido.
Mérito
Os benefícios por incapacidade estão previstos nos artigos 42 e 59 da Lei nº 8.213/91, verbis:
Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 dias consecutivos.
Dessa forma, são três os requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: 1) a qualidade de segurado; 2) o cumprimento do período de carência de doze contribuições mensais; 3) a incapacidade para o trabalho, de caráter permanente (aposentadoria por invalidez) ou temporário (auxílio-doença).
O deferimento dos benefícios por incapacidade pressupõe a identificação, por meio de exame médico-pericial, da total impossibilidade de o segurado exercer atividade que garanta a sua subsistência.
Caso concreto
A parte autora, nascida em 02/07/1963, ingressou em juízo em 13/12/2018, pleiteando a concessão de benefício por incapacidade, tendo formulado o seu requerimento administrativo de benefício em 29/11/2021 (fl. 30).
Não resta dúvida quanto à qualidade de segurado, em vista dos recolhimentos de contribuições previdenciárias feitos ao regime previdenciário, no período de 05/2012 a 01/2022 (fls. 38/45 + 61).
Do laudo da perícia judicial (fls. 90/102), realizada em 05/02/2019, verifica-se que a parte autora declarou a atividade habitual de empregada doméstica, por 16 (dezesseis) anos, contando com 59 (cinquenta e nove) anos e escolaridade fundamental incompleta, na ocasião do exame.
Narra a requerente que aos 18 (dezoito) anos descobriu patologia neurológica a qual denominou de “água na cabeça”, sendo acompanhada, a partir de então, por médico especialista e, aos 33 (trinta e três) anos realizou cirurgia, quando foi inserido dreno na sua cabeça para amenizar o aumento de líquido interior. Refere quadro atual de muita dor, visão fraca, enjoos, e realiza acompanhamento com neurologista.
O Perito apresentou hipótese diagnóstica englobando as seguintes patologias: hidrocefalia de pressão normal (G91.2), presença de dispositivo de drenagem de líquido cefalorraquidiano (QD 51.D e enxaqueca complicada (G43.3).
Concluiu que ocorre incapacidade total e temporária desde setembro de 2022, em vista histórico de transtorno do sistema nervoso central, de longa data, em uso de dispositivo ativo de “drenagem liquórica por DVE – derivação ventricular externa”, associado a quadro de enxaqueca de difícil controle.
Os |elementos probatórios existentes dos autos demonstram que se cuida de pessoa simples, empregada doméstica, contando atualmente com 60 (sessenta) anos de idade e grau de instrução primário, acometida por grave patologia neurológica, com descompensações que a acompanham há vários anos.
Dessa forma, as chances de reabilitação e de reinserção no mercado de trabalho se mostram exíguas, impondo a conclusão de que a parte autora tem direito ao benefício de aposentadoria por invalidez.
Com efeito, o fato de ter sido constado, no laudo pericial, que se cuida de incapacidade temporária não impede a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez, ainda mais porque foi reconhecido que a parte autora não tem condições de exercer as suas atividades laborais habituais e, conforme se depreende dos autos, de ser reabilitada.
De qualquer forma, nos termos dos arts. 371 e 479 do Código de Processo Civil, o juiz não fica adstrito ao laudo pericial havendo outros elementos de prova suficientes para deixar de considerar as suas conclusões, a exemplo do que ocorre na hipótese sub judice.
O Superior Tribunal de Justiça já decidiu que, em razão do relevante valor social das normas sobre a proteção ao trabalhador, o juiz pode afastar-se das conclusões do laudo pericial convencendo-se, pelos demais elementos dos autos a respeito da incapacidade para o trabalho.
Nesse sentido é o seguinte precedente:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE LABORAL.AFERIÇÃO POR CRITÉRIOS SOCIAIS E CULTURAIS. POSSIBILIDADE. NÃO VINCULAÇÃO AO LAUDO PERICIAL.
1. Esta Corte tem entendimento no sentido de que, para a concessão da aposentadoria por invalidez, o magistrado não está vinculado à prova pericial e pode concluir pela incapacidade laboral levando em conta os aspectos socioeconômicos, profissionais e culturais do segurado.
2. Agravo regimental não provido.
(AgRg no AREsp 103.056/MG, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 25/06/2013, DJe 02/08/2013)
Em assim sendo, apesar da conclusão do laudo pericial no sentido de que a incapacidade é apenas temporária, diante do conjunto probatório, deve-se concluir que a segurada não tem mais condições de exercer atividade laboral e de ser reabilitada, tendo direito, portanto, à aposentadoria por invalidez.
De referência aos pedidos eventuais e, de modo particular, à prescrição quinquenal prevista no art. 103, parágrafo único, da Lei n. 8.213/91, não há como ser aplicada ao caso, porquanto o benefício foi concedido a partir do dia 29/11/2021, e a presente ação foi proposta em 13/12/2018.
Ademais, não prosperam os pedidos de apresentação de autodeclaração de âmbito administrativo ou de desconto de eventual montante retroativo. Tais questões configuram medidas de mérito administrativo e, portanto, estão na esfera de competência da própria autarquia previdenciária.
Por sua vez, não se conhece do pedido de aplicação da Súmula nº 111 do STJ no que concerne à verba honorária, pois já acolhido na sentença.
Finalmente, em relação às custas processuais, conforme pacificado na jurisprudência, o INSS somente é isento do pagamento dessa verba (inclusive das despesas com oficial de justiça) quando há previsão neste sentido em lei local.
Todavia, a Lei n. 11.077, de 10 de janeiro de 2020, alterou o disposto em lei local – Lei nº 7.603/01, do Estado do Mato Grosso, que fixa o valor das custas, despesas e emolumentos relativos aos atos praticados no Foro Judicial, deixando de conceder isenção à União e às suas autarquias, conforme se vê na ementa adiante transcrita:
“PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ/AUXÍLIO-DOENÇA. APELO DO INSS RESTRITO ÀS CUSTAS PROCESSUAIS. 1. Os requisitos indispensáveis para a concessão do benefício previdenciário de auxílio-doença/aposentadoria por invalidez são: a) a qualidade de segurado; b) a carência de 12 (doze) contribuições mensais, salvo nas hipóteses previstas no art. 26, inc. II, da Lei n. 8.213/1991; c) incapacidade para o trabalho ou atividade habitual por mais de 15 dias ou, na hipótese da aposentadoria por invalidez, incapacidade (permanente e total) para atividade laboral. 2. Apelo do INSS restrito às custas processuais. 3. Conforme pacificado na jurisprudência, o INSS somente é isento do pagamento das custas (inclusive despesas com oficial de justiça) quando prevista a referida isenção em lei estadual específica. A isenção se repete nos Estados onde houver lei estadual assim prescrevendo, a exemplo do Acre, Tocantins, Minas Gerais, Goiás, Rondônia e Piauí. 6. Ocorre que, em relação ao Estado de Mato Grosso, a Lei n. 11.077, de 10 de janeiro de 2020, alterou o disposto em lei local (Lei nº 7.603/01 do Estado do Mato Grosso), que fixa o valor das custas, despesas e emolumentos relativos aos atos praticados no Foro Judicial e, agora, a União deixou de ser isenta das custas processuais. 7. Assim, sendo o INSS (autarquia federal) não possui qualquer isenção. 6. Apelação do INSS desprovida.” (AC 1010785-77.2021.4.01.9999, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL RAFAEL PAULO, TRF 1ª Região, 2ª Turma, e-DJF1 11/10/2022) (grifos não originais).
Assim sendo, considerando que se trata de ação ajuizada na Justiça Comum do Estado do Mato Grosso, o INSS não possui qualquer isenção de custas.
Ante o exposto, nego provimento à apelação do INSS.
Os honorários recursais ficam fixados em 1% sobre o valor da condenação.
É o voto.
Brasília, 22 de maio de 2024.
Desembargadora Federal Nilza Reis
Relatora
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
APELAÇÃO CÍVEL (198)1005532-06.2024.4.01.9999
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
LEANDRA DE OLIVEIRA MAGALHAES
Advogado do(a) APELADO: NILSON TOMAZ DA SILVA JUNIOR - MT23151/O
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO E CONSTITUCIONAL. PROCESSO CIVIL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. TRABALHADOR URBANO. LAUDO PERICIAL CONCLUSIVO DA INCAPACIDADE TOTAL E TEMPORÁRIA. AFERIÇÃO COM BASE EM OUTROS ELEMENTOS PROBATÓRIOS EXISTENTES NOS AUTOS. NÃO VINCULAÇÃO AO LAUDO PERICIAL. CONDIÇÕES PESSOAIS RELEVANTES . BENEFÍCIO CONCEDIDO. CUSTAS. INSS. ESTADO DO MATO GROSSO. AUSÊNCIA DE ISENÇÃO.
1. A aposentadoria por invalidez é devida ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insuscetível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
2. Ainda que no laudo pericial haja a conclusão da existência de incapacidade total e temporária, o juiz pode considerar outros aspectos pessoais relevantes, tais como a idade, a instrução, a condição socioeconômica, a natureza das atividades desenvolvidas, e concluir pela concessão de aposentadoria por invalidez. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça.
3. Estando demonstrado nos autos que a parte autora não tem mais condições de exercer a sua atividade laboral habitual (empregada doméstica), que conta atualmente com 60 (sessenta) anos de idade e grau de instrução primário, acometida por grave patologia neurológica, é improvável a sua reabilitação para outra atividade em razão da gravidade da sua enfermidade, impondo o reconhecimento do seu direito à aposentadoria por invalidez.
4. A Lei n. 11.077, de 10 de janeiro de 2020, alterou a Lei nº 7.603/01 do Estado do Mato Grosso, que fixa o valor das custas, despesas e emolumentos relativos aos atos praticados no Foro Judicial, deixando de conceder isenção à União e às suas autarquias.
5. Apelação do INSS não provida.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação interposta pelo INSS, nos termos do voto da relatora.
Brasília, 22 de maio de 2024.
Desembargadora Federal NILZA REIS Relatora