
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:JAIME PAULINO DA SILVA
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: CASSIO QUEIROZ COELHO DA CRUZ - MT16006-A e DEBORAH MARGARIDA MARTINS FERREIRA DA CRUZ - MT13672/O
RELATOR(A):LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728)1008515-51.2019.4.01.9999
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. JUÍZA FEDERAL LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO (RELATORA CONVOCADA):
Trata-se de apelação interposta pelo INSS de sentença na qual foi julgado procedente o pedido de concessão de auxílio-doença a partir do requerimento administrativo (28/09/2016), que foi convertido em aposentadoria por invalidez desde a data de juntada do laudo pericial aos autos (21/04/2018) - fls. 92/96¹.
Quanto às parcelas atrasadas, o juízo assim decidiu: As prestações em atraso devem ser pagas de uma só vez, atualizadas pelo INPC, a partir da vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91 e acrescidas de juros de mora, conforme a remuneração oficial da caderneta de poupança (art. 1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela Lei n. 11.960/2009).
A sentença foi submetida ao reexame necessário.
Na apelação (fls. 100/105), o INSS sustenta, em síntese, que o caso é de incapacidade temporária, impondo-se a conversão do benefício de aposentadoria por invalidez em auxílio-doença. Subsidiariamente, postula a aplicação integral do que dispõe a Lei nº 11.960/2009 aos juros de mora e à correção monetária.
Sem contrarrazões.
É o relatório.
¹Os números de folhas indicados referem-se à rolagem única, ordem crescente.
VOTO
A EXMA. SRA. JUÍZA FEDERAL LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO (RELATORA CONVOCADA):
O recurso reúne os requisitos de admissibilidade, merecendo ser conhecido.
A sentença, proferida na vigência do Código de Processo Civil de 2015, não está sujeita à remessa oficial, tendo em vista que a condenação nela imposta não tem o potencial de ultrapassar o limite previsto no seu art. 496, § 3º (REsp 1.735.097/RS, Rel. Min. Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe 11/10/2019, AREsp nº 1.712.101/RJ, Segunda Turma, julg. 22/09/2020).
Mérito
Os benefícios por incapacidade estão previstos nos artigos 42 e 59 da Lei nº 8.213/91, verbis:
Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 dias consecutivos.
Dessa forma, são três os requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: 1) a qualidade de segurado; 2) o cumprimento do período de carência de doze contribuições mensais; 3) a incapacidade para o trabalho, de caráter permanente (aposentadoria por invalidez) ou temporário (auxílio-doença).
O deferimento dos benefícios por incapacidade pressupõe a identificação, por meio de exame médico-pericial, da total impossibilidade de o segurado exercer atividade que garanta a sua subsistência.
Caso concreto
A parte autora, nascida em 16/04/1955, ingressou em juízo em 14/12/2017, pleiteando a concessão de benefício por incapacidade, tendo formulado o requerimento administrativo em 28/09/2016 (fl. 30).
Os autos indicam que o segurado verteu contribuições ao RGPS nas seguintes competências: 09/1982 a 10/1982, 09/1983 a 03/1987, 09/1987 a 12/1990, 05/1991 a 10/1992, 12/1992 a 08/1994, 11/1995 a 01/1996, 06/1997 a 09/1997, 09/1998 a 07/1999, 01/2000 a 03/2002, 02/2004 a 11/2004, 05/2006 a 06/2006, 01/2007, 12/2007, 02/2008 a 05/2010, 09/2012 a 11/2012, 10/2015, 05/2016 a 02/2018 (fls. 60/75).
Do laudo da perícia judicial (fls. 76/78), realizada em 14/12/2017, verifica-se que o autor tem por habitual a atividade de motorista, contava com sessenta e dois anos e ensino fundamental incompleto na data do exame.
O histórico da doença é o seguinte:
Relata que em agosto de 2016 iniciou turvação da visão esquerda, súbita, sem outros sintomas. Buscou atendimento médico em setembro de 2016 e que após exames complementares teve o diagnóstico de perda da visão decorrente de complicações do diabetes. Submeteu-se ao tratamento com a aplicação de laser, tendo piora clínica. Informa que mantém acompanhamento médico até o presente momento, sendo indicado no tratamento cirúrgico, mas aguardando liberação pelo SUS. Atualmente relata perda da acuidade visual bilateral, mais intenso à esquerda. Informa ser diabético diagnosticado há onze, em uso de medicamentos
Na discussão, o Perito assim resumiu o quadro incapacitante:
Periciando com o diagnóstico de cegueira em ambos os olhos, decorrente de retinopatia diabética avançada, estando em acompanhamento médico, em uso de medicamentos e aguardando tratamento para a patologia ocular, conforme relatório médico. Apresenta grave comprometimento funcional da visão bilateralmente ao exame clínico pericial, descompensado clinicamente e que o incapacita para a atividade laborativa total e temporariamente, com a necessidade de reavaliação clínico-pericial em cento e oitenta dias. De acordo com a documentação médica presente nos autos podemos estabelecer a data do início da incapacidade laborativa em setembro de 2016.
Considerando tratar-se de diagnóstico de cegueira, tenho por satisfeitas a qualidade de segurado e carência na data em que teve início o impedimento (art. 15, II, e art. 26, II, c/c art. 151, todos da Lei nº 8.213/91).
Ademais, em que pese ter o expert indicado que a inaptidão é temporária, afirmou que a patologia se encontra em estado avançado, descompensada clinicamente, comprometendo de forma grave a visão do trabalhador, que depende essencialmente deste sentido para o exercício da sua atividade habitual.
Com efeito, os elementos dos autos demonstram que se cuida de pessoa simples, de pouca escolaridade, atualmente com sessenta e nove anos, cuja atividade habitual demanda que tenha a visão plena, esta por sua vez em evidente declínio, conforme se infere dos esclarecimentos do médico perito e dos demais elementos dos autos.
Desse modo, o fato de ter constado no laudo pericial que se cuida de incapacidade temporária não impede a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez, ainda mais porque foi reconhecido que não tem a parte autora condições de exercer suas atividades habituais e, conforme se depreende dos autos, de ser reabilitada.
De qualquer forma, nos termos dos arts. 371 e 479 do Código de Processo Civil, o juiz não fica adstrito ao laudo pericial havendo outros elementos suficientes para deixar de considerar suas conclusões.
O Superior Tribunal de Justiça já decidiu que, em razão do relevante valor social das normas sobre a proteção ao trabalhador, o juiz pode afastar-se das conclusões do laudo pericial convencendo-se, pelos demais elementos dos autos a respeito da incapacidade para o trabalho.
Nesse sentido é o seguinte precedente:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE LABORAL.AFERIÇÃO POR CRITÉRIOS SOCIAIS E CULTURAIS. POSSIBILIDADE. NÃO VINCULAÇÃO AO LAUDO PERICIAL.
1. Esta Corte tem entendimento no sentido de que, para a concessão da aposentadoria por invalidez, o magistrado não está vinculado à prova pericial e pode concluir pela incapacidade laboral levando em conta os aspectos socioeconômicos, profissionais e culturais do segurado.
2. Agravo regimental não provido.
(AgRg no AREsp 103.056/MG, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 25/06/2013, DJe 02/08/2013)
Em assim sendo, apesar da conclusão do laudo pericial no sentido de que a incapacidade é apenas temporária, diante do conjunto probatório, deve-se concluir que a segurada não tem mais condições de exercer atividade laboral e de ser reabilitada, tendo direito à aposentadoria por invalidez.
Quanto à correção monetária e juros moratórios sobre as parcelas vencidas, deve ser observado o que foi decidido pelo Supremo Tribunal Federal no RE 870.947 (tema 810) e pelo Superior Tribunal de Justiça ao julgar o REsp 1.495.146/MG (Tema 905). Ou seja, devem ser aplicados o INPC para a correção monetária dos valores, e juros moratórios nos termos do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com redação da Lei nº 11.960/09, e a partir da vigência da Emenda Constitucional apenas a taxa SELIC (art. 3º).
Ante o exposto, nego provimento à apelação do INSS para alterar os índices de correção monetária e de juros de mora, conforme fundamentação.
É o voto.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Juíza Federal LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO
Relatora Convocada
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APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728)1008515-51.2019.4.01.9999
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
JAIME PAULINO DA SILVA
Advogados do(a) APELADO: CASSIO QUEIROZ COELHO DA CRUZ - MT16006-A, DEBORAH MARGARIDA MARTINS FERREIRA DA CRUZ - MT13672/O
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO E CONSTITUCIONAL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. TRABALHADOR URBANO. LAUDO PERICIAL QUE CONCLUI PELA INCAPACIDADE TOTAL E TEMPORÁRIA. AFERIÇÃO COM BASE EM OUTROS ELEMENTOS DOS AUTOS. NÃO VINCULAÇÃO AO LAUDO PERICIAL.CONDIÇÕES PESSOAIS. SENTENÇA MANTIDA.
1. A aposentadoria por invalidez é devida ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insuscetível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
2. Ainda que no laudo pericial tenha se concluído pela incapacidade total e temporária, o juiz pode, considerando outros aspectos relevantes, como a idade, instrução, condição socioeconômica, natureza da enfermidade e das atividades desenvolvidas, concluir pela concessão de aposentadoria por invalidez. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça.
3. As parcelas vencidas devem ser acrescidas de correção monetária e juros moratórios nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal, que se encontra atualizado nos termos do julgado pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº 870.947-SE, em sede de repercussão
4. Apelação interposta pelo INSS a que se nega provimento. Modificação, de ofício, dos índices aplicáveis à correção monetária e aos juros de mora.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação interposta pelo INSS, nos termos do voto da relatora.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Juíza Federal LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO
Relatora Convocada