
POLO ATIVO: JOSE DIVINO VIEIRA
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: SANDOVAL DE QUEIROZ ALBERNAZ - GO27087-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):URBANO LEAL BERQUO NETO

PROCESSO: 1005150-47.2023.4.01.9999 PROCESSO REFERÊNCIA: 5678999-78.2019.8.09.0149
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: JOSE DIVINO VIEIRA
REPRESENTANTES POLO ATIVO: SANDOVAL DE QUEIROZ ALBERNAZ - GO27087-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
O Excelentíssimo Desembargador Federal Urbano Leal Berquó Neto (Relator):
Trata-se de apelação interposta contra sentença que julgou improcedentes os pedidos do autor, negando-lhes o benefício previdenciário da pensão por morte.
Em suas razões, a parte autora alega, em síntese, que tem direito de optar pelo benefício de pensão por morte, que é mais vantajoso que o benefício assistencial recebido, e que juntou aos autos prova documental robusta do labor rural da falecida e da união estável. Requer a reforma da sentença, com julgamento de mérito para conceder-lhe o benefício e, subsidiariamente, a anulação da sentença e o retorno dos autos à origem para produção de prova testemunhal, a fim de corroborar o início de prova material juntado aos autos.
Regularmente intimada para contrarrazões, a autarquia manteve-se silente.
É o relatório.

PROCESSO: 1005150-47.2023.4.01.9999 PROCESSO REFERÊNCIA: 5678999-78.2019.8.09.0149
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: JOSE DIVINO VIEIRA
REPRESENTANTES POLO ATIVO: SANDOVAL DE QUEIROZ ALBERNAZ - GO27087-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
V O T O
O Excelentíssimo Desembargador Federal Urbano Leal Berquó Neto (Relator):
Presentes os pressupostos recursais, conheço do recurso.
Passo à análise do apelo da parte autora, que alega ter preenchido todos os requisitos à concessão do benefício da pensão por morte bem como o direito de optar pelo benefício mais vantajoso. Requer a reforma da sentença, com julgamento de mérito para conceder-lhe o benefício e, subsidiariamente, a anulação da sentença e o retorno dos autos à origem para produção de prova testemunhal, a fim de corroborar o início de prova material juntado aos autos.
Da análise dos autos, verifica-se que o juízo a quo, ao proferir a sentença, incorreu em verdadeiro error in procedendo. Em que pese ter sido requerida pela parte autora a produção de prova oral, necessária para a comprovação da qualidade de segurado do falecido e da condição de dependente, o juízo de primeiro grau, ante a não apresentação de réplica e de manifestação acerca do recebimento de benefício de amparo assistencial pelo autor, não oportunizou a especificação de provas e, ato contínuo, sem a realização de audiência de instrução, julgou improcedentes os pedidos ao fundamento da impossibilidade de cumulação de benefício de prestação continuada com quaisquer outros benefícios previdenciários.
De início, cumpre asseverar que, nos termos do art. 687 da IN 77/2015, deve ser resguardado à parte autora o direito de optar pelo benefício mais vantajoso, de modo que o recebimento de amparo assistencial não impede a concessão de pensão por morte em caso de renúncia ao recebimento daquele.
Desse modo, o fato de autor receber benefício assistencial não se presta a amparar o indeferimento do pedido de concessão benefício da pensão por morte.
Pois bem. Compulsando os autos, verifica-se que os documentos apresentados demonstram o preenchimento dos requisitos necessários para configuração da qualidade de segurada da falecida, em razão do labor rural exercido por ela antes do óbito. Dentre os documentos, foram apresentados: (i) a certidão de óbito, ocorrido em 12/4/2014, na qual a de cujus foi qualificada como lavradora, além de ter sido declarado por terceiro a existência de união estável com o autor (fl. 45); (ii) CTPS do autor, com anotação de vínculo rural no período compreendido entre 22/4/2012 e 1º/6/2016 (fls. 46/47); e (iii) termo de rescisão de contrato do trabalho do autor, cargo trabalhador rural, onde informada a data de admissão em 2/4/2016 e a data de afastamento em 1º/6/2016 (fls. 48/49)
No que tange a tal ponto de análise, cumpre, de modo definitivo, lembrar que
É pacífica a jurisprudência do STJ e desta Corte no sentido de que o rol do art. 106 da Lei 8.213/91 é meramente exemplificativo, (STJ AgRG no REsp 1073730/CE) sendo admissíveis, portanto, outros documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, além dos ali previstos. São idôneos, portanto, certidões de casamento, de óbito, de nascimento dos filhos, Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS), certificado de reservista, carteiras de beneficiário do extinto INAMPS, entre outros registros públicos, sendo certo que a qualificação profissional de lavrador ou agricultor constante desses documentos não só aproveita em favor de seu titular, mas é extensível a cônjuge/companheiro(a) e aos filhos. Igualmente aceitáveis documentos tais como certidões do INCRA, guias de recolhimento de ITR, documentos fiscais de venda de produtos rurais, certidão de registro de imóveis relativos à propriedade rural, contratos de parceria agrícola e todos outros que indiciem a ligação da parte autora com o trabalho e a vida no meio rural. Eventual enquadramento do segurado ou do cônjuge/companheiro como empregador rural tampouco descaracteriza a condição de segurado especial do beneficiário, seja por conta das provas produzidas, seja em virtude das disposições do Decreto-lei 1.166/71, segundo o qual a qualificação de empregador II-B é uma denominação a quem, proprietário ou não, mesmo sem empregado, em regime de economia familiar, explore imóvel rural que lhe absorva toda a força de trabalho e lhe garanta a subsistência. Pontuo, ainda, que não desconfigura a qualidade de rurícola a existência de empregados temporários (art.11, VII, § 1º, da Lei 8.213/91) e a comercialização do excedente da produção feita diretamente pelo agricultor (art. 25 da Lei 8.212/91). A jurisprudência do STJ já firmou entendimento no sentido de que o tamanho da propriedade rural, por si só, não tem o condão de descaracterizar o regime de economia familiar quando, preenchidos os demais requisitos legalmente exigidos (...).” (REsp 1649636, STJ, Rel. MIn. Herman Benjamin, 2ª T, DJE 19/04/2017).
Com efeito, cumpre ressaltar, conforme entendimento jurisprudencial deste Tribunal e do STJ, que a CTPS com anotações de trabalho rural da parte autora não descaracteriza a qualidade de segurado especial. Ao contrário, é considerada prova plena do período nela registrado e início de prova material para o restante do período de carência.
Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. IDADE MÍNIMA E REQUISITOS COMPROVADOS. ENQUADRAMENTO DO CÔNJUGE COMO TRABALHADOR RURAL. EQUIPARAÇÃO AO SEGURADO ESPECIAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO POR PROVA TESTEMUNHAL. HONORÁRIOS RECURSAIS. ART. 85, § 11, DO CPC/2015. 1. A concessão do benefício de aposentadoria por idade ao trabalhador rural exige o preenchimento da idade mínima de 60 anos para homens e 55 anos para mulher, bem como a efetiva comprovação de exercício em atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, e art. 142, ambos da Lei nº 8.213/91). 2. No caso dos autos, a parte autora comprovou ter completado a idade necessária, bem como o período de carência exigido pela lei, demonstrando, pelo início de prova material, coadjuvada pela prova testemunhal, o exercício de atividade rural sob regime de economia familiar por tempo suficiente à concessão do benefício. 3. Jurisprudência dominante desta Corte no sentido de que a CTPS com anotações de trabalho rural do cônjuge da autora é considerada prova plena do período nela registrado e início de prova material para o restante do período de carência, bem como que a mera existência de veículos populares em nome do cônjuge da autora não se afigura bastante e suficiente para elidir o conjunto probatório dos autos (AC 1012163-68.2021.4.01.9999 Rel. Desembargador Federal JOÃO LUIZ DE SOUSA, Segunda Turma, PJe 13/09/2021 e AC 1027917-21.2019.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL WILSON ALVES DE SOUZA, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 23/03/2021 PAG). 3. O termo inicial do benefício é a data do requerimento administrativo, nos termos do art. 49 da Lei nº 8.213/91, observada a prescrição quinquenal no que se refere ao pagamento de prestações vencidas. 4. Honorários advocatícios majorados em 1%, nos termos do art. 85, §11, do Código de Processo Civil. 5. Apelação do INSS desprovida.
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No tocante à extensão de provas em nome de terceiros, a CTPS com anotações de trabalho rural do autor é extensível à de cujus, sendo considerado documento idôneo a servir como início de prova material da qualidade de segurada especial desta. Vejamos:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. COMPROVAÇÃO DO TRABALHO CAMPESINO. DOCUMENTOS PÚBLICOS NOS QUAIS SOMENTE O CÔNJUGE É QUALIFICADO COMO RURÍCOLA. EXTENSÃO À ESPOSA. POSSIBILIDADE. ENTENDIMENTO PACIFICADO POR ESTA CORTE SUPERIOR NOS ERESP 1.171.565/SP. FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE EM RELAÇÃO AOS DEMAIS DISPOSITIVOS APONTADOS COMO SUPOSTAMENTE VIOLADOS. SÚMULA 284/STF. RECURSO ESPECIAL DO PARTICULAR PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, PROVIDO. (...) 9. Com efeito, diante da dificuldade encontrada pelo trabalhador rural em comprovar o labor campesino, por ser comum a ausência de formalização dos seus atos, esta Corte Superior tem adotado critérios interpretativos pro misero, a fim de possibilitar uma jurisdição socialmente justa. 10. No caso dos autos, o Tribunal de origem reconheceu a existência de documentos públicos nos quais o esposo da parte autora é qualificado como campesino, mas não os admitiu como início de prova material, sob os seguintes fundamentos: No caso vertente, visando constituir início de prova material, a parte autora anexou aos autos os seguintes documentos: i) certidão de casamento, em que o esposo é qualificado como campeiro (2009); ii) certidão de nascimento do filho, qualificando o esposo da autora como campeiro (1996); iii) cópias da CTPS do esposo, indicando diversos vínculos rurais entre 1994 e 2014. Ocorre que tais documentos nada provam em relação à alegada atividade laboral exercida pela parte autora, pois, nessas condições, não é possível a extensão da condição de trabalhador rural do cônjuge à esposa. Tal extensão é possível, em tese, somente aos casos em que os documentos apresentados demonstram a atividade rural do cônjuge/companheiro em regime de economia familiar, não se aplicando à hipótese em que o cônjuge/companheiro é empregado rural, conforme cópias da CTPS e extratos do CNIS (fls. 113). 11. A conclusão da Corte de origem acerca da não comprovação do labor rural é equivocada. Isso porque, a existência de anotações em CTPS demonstrando que o esposo da parte autora exercera, durante certo período, atividade rural na condição de empregado não afasta o entendimento desta Corte Superior sobre a extensibilidade da prova ao cônjuge, uma vez que não há necessidade de que se reconheça a efetiva condição de segurado especial do titular dos documentos, mas apenas de que este exerça atividade rurícola. (...) 14. Ante o exposto, conheço parcialmente do recurso especial do particular e, nessa extensão, dou-lhe provimento, para reconhecer a existência de início de prova material. Determina-se o retorno do feito à origem, para que o Tribunal a quo realize o cotejo entre a prova material e a testemunhal, prosseguindo-se no exame do pedido, como entender de direito. (REsp n. 1.861.027, Ministro Manoel Erhardt (Desembargador Convocado do TRF-5ª Região), DJe de 07/05/2021.) Sem grifos no original
Analisando detidamente a prova dos autos sob o prisma da jurisprudência do STJ, verifico que os documentos são, sim, válidos como início de prova material.
Assim sendo, o juízo de primeiro grau, atentando contra o princípio da cooperação (art. 6º do CPC), julgou o mérito, sem oportunizar que a parte autora produzisse prova oral necessária à solução do feito, apesar da existência de início de prova material do labor rural do autor em data contemporânea ao óbito da falecida, a este extensível caso comprovada a união estável por meio da prova testemunhal.
Dessa maneira, é de se anular a sentença que, sem oportunizar a possível e relevante prova testemunhal, julga a lide em evidente cerceamento de defesa, violando os princípios constitucionais do devido processo legal, contraditório e ampla defesa (art. 5, LIV e LV, CRFB).
In verbis, precedente do STJ:
AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DECISÃO DA PRESIDÊNCIA. RECONSIDERAÇÃO. AÇÃO DE DESPEJO C/C COBRANÇA. AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO. DESNECESSIDADE. AUSÊNCIA DE NULIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA CARACTERIZADO. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA INSTRUÇÃO PROBATÓRIA. AGRAVO INTERNO PROVIDO PARA DAR PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL. 1. Agravo interno provido para reconsiderar a decisão agravada. Novo exame do efeito. 2. A ausência de realização de audiência de conciliação não é causa de nulidade do processo quando a parte não demonstra prejuízo pela não realização do ato processual, conforme ocorreu no caso dos autos. 3. No mérito, há cerceamento de defesa quando, a despeito de pedido de produção probatória, o magistrado julga de forma antecipada o pedido desfavoravelmente à parte, com fundamento na ausência de provas. Precedentes. 4. Evidenciado o cerceamento de defesa, deve ser declarada a nulidade do julgado, determinando-se o retorno dos autos à origem para possibilitar a instrução probatória, notadamente a colheita da prova oral. 5. Agravo interno provido para reconsiderar a decisão agravada e, em novo exame do feito, conhecer do agravo para dar provimento ao recurso especial. (STJ - AgInt no AREsp: 1968508 PE 2021/0297017-4, Relator: Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 14/02/2022, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 24/02/2022).
Tendo sido configurado o cerceamento de defesa, em face da improcedência do pedido, deve a sentença ser anulada, ante a impossibilidade do julgamento sem a oitiva das testemunhas arroladas, visando o regular processamento e julgamento do feito, oportunizando à parte autora a produção da prova testemunhal.
Em face do exposto, DOU PROVIMENTO à apelação para anular a sentença e determino o retorno dos autos à vara de origem, para a produção de prova testemunhal e regular processamento e julgamento do feito.
É como voto.
Desembargador Federal URBANO LEAL BERQUÓ NETO
Relator

PROCESSO: 1005150-47.2023.4.01.9999 PROCESSO REFERÊNCIA: 5678999-78.2019.8.09.0149
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: JOSE DIVINO VIEIRA
REPRESENTANTES POLO ATIVO: SANDOVAL DE QUEIROZ ALBERNAZ - GO27087-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. CONSTITUCIONAL. PENSÃO POR MORTE. CUMULAÇÃO COM BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. IMPOSSIBILIDADE. OPÇÃO PELO BENEFÍCIO MAIS VANTAJOSO. CERCEAMENTO DE DEFESA. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA (PROVA ORAL). SENTENÇA ANULADA. RECURSO PROVIDO.
1. Trata-se de apelação em face de sentença que julgou improcedentes os pedidos da parte autora, negando-lhe o benefício previdenciário da pensão por morte ao fundamento da impossibilidade de cumulação dos benefícios de amparo social e pensão por morte.
2. Nos termos do art. 687 da IN 77/2015, deve ser resguardado à parte autora o direito de optar pelo benefício mais vantajoso, de modo que o recebimento de amparo assistencial não impede a concessão de pensão por morte em caso de renúncia ao recebimento daquele.
3. Em que pese ter sido requerida pela parte autora a produção de prova oral, necessária para a comprovação da qualidade de segurada da falecida e da condição de dependente, o juízo de primeiro grau, ante a não apresentação de réplica e de manifestação acerca do recebimento de benefício de amparo assistencial pelo autor, não oportunizou a especificação de provas e, ato contínuo, sem a realização de audiência de instrução, julgou improcedentes os pedidos.
4. O comando exarado há de ser anulado, tendo em vista que sua prolação julgando improcedente o pedido do benefício requerido pela parte autora se deu sem realização da prova testemunhal, que também é imprescindível ao deferimento da prestação em testilha, na hipótese (nos autos verificada) em que há início de prova material do labor rural da falecida ao tempo do óbito.
5. Restou evidente, portanto, o cerceamento de defesa, violando-se os princípios constitucionais do devido processo legal, contraditório e ampla defesa (art. 5, LIV e LV, CRFB), motivo que leva à necessidade de anulação da sentença.
6. Apelação provida.
A C Ó R D Ã O
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, DAR PROVIMENTO à apelação, nos termos do voto do relator.
Desembargador Federal URBANO LEAL BERQUÓ NETO
Relator