
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
POLO PASSIVO:ITAU UNIBANCO S.A.
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: JULIANO RICARDO SCHMITT - SC20875-A
RELATOR(A):EDUARDO FILIPE ALVES MARTINS
PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 13 - DESEMBARGADOR FEDERAL EDUARDO MARTINS
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1012478-47.2017.4.01.3400
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL EDUARDO MARTINS - Relator:
Trata-se de apelação interposta contra sentença proferida pelo Juízo da 1ª Vara Federal Cível da Seção Judiciária do Distrito Federal nos autos da ação ordinária ajuizada pelo ITAÚ UNIBANCO S.A. em desfavor do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, objetivando que o réu se abstenha de realizar a inclusão do nome da autora no Cadastro Informativo de Créditos Não Quitados do Setor Público – CADIN, em relação aos supostos débitos discutidos nos autos.
O Juízo a quo julgou procedente o pedido, para anular as cobranças administrativas objeto da lide, determinando ao INSS que se abstivesse de realizar a inclusão do nome do Itaú Unibanco no Cadastro Informativo de Créditos Não Quitados do Setor Público (CADIN) e, caso já constasse, que procedesse à exclusão. Reconheceu, ainda, a prescrição das referidas cobranças, com fundamento no Decreto nº 20.910/1932.
Em suas razões recursais, o INSS sustenta, em síntese, a inexistência de prescrição com base na imprescritibilidade das ações de ressarcimento ao erário, conforme o art. 37, § 5º da Constituição Federal. Alega que a contagem do prazo prescricional deveria iniciar-se a partir da ciência dos óbitos pelos órgãos competentes. Defende a responsabilidade do Itaú Unibanco por eventuais débitos, por descumprimento de obrigações contratuais.
As contrarrazões foram devidamente colacionadas aos autos.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 13 - DESEMBARGADOR FEDERAL EDUARDO MARTINS
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1012478-47.2017.4.01.3400
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL EDUARDO MARTINS - Relator:
Inicialmente, consigne-se que, in casu, concorrem os requisitos subjetivos e objetivos de admissibilidade recursal.
A questão posta em juízo cinge-se na alegação de imprescritibilidade das ações de ressarcimento ao erário público, apresentada pelo apelante, à luz do art. 37, § 5º, da Constituição Federal.
Quanto à prescrição, é certo que o artigo 37, § 5º, da Constituição, ao dispor sobre a ocorrência de prescrição da pretensão de ressarcimento ao erário, estabelece que "a lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento".
Conforme já decidido pelo STF, “a Constituição, no mesmo dispositivo (art. 37, § 5º, CRFB) decota de tal comando para o Legislador as ações cíveis de ressarcimento ao erário, tornando-as, assim, imprescritíveis”. “São, portanto, imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa” (RE 852475 , Relator: Min. Alexandre de Moraes, Relator p/ Acórdão: Min. Edson Fachin, Tribunal Pleno, julgado em 08/08/2018, Processo Eletrônico Repercussão Geral - Mérito DJe-058 DIVULG 22-03-2019 PUBLIC 25-03-2019). (g.n.)
Por sua vez, o Supremo Tribunal Federal também firmou o entendimento de que “é prescritível a ação de reparação de danos à Fazenda Pública decorrente de ilícito civil.” (RE 669069 , Relator: Min. Teori Zavascki, Tribunal Pleno, julgado em 03/02/2016, Acórdão Eletrônico Repercussão Geral - Mérito DJe-082 DIVULG 27-04-2016 PUBLIC 28-04-2016).
O presente caso envolve cobranças administrativas referentes a valores pagos indevidamente após o óbito de beneficiários. Tais cobranças decorrem de ilícito civil, não se enquadrando nas hipóteses excepcionais previstas no § 5º do art. 37 da Constituição Federal.
Dessa forma, aplicável ao caso o entendimento firmado pelo STF no julgamento do RE 669069 no sentido de que “é prescritível a ação de reparação de danos à Fazenda Pública decorrente de ilícito civil”.
Aliás, tal entendimento está incontestavelmente de acordo com entendimento jurisprudencial firmado pelo Superior Tribunal de Justiça. Vejamos:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE POR COMPROVADA MÁ-FÉ. PRESCRITIBILIDADE DAS AÇÕES DE RESSARCIMENTO DE DANOS AO ERÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. RE 669.069/MG , Rel. Min. TEORI ZAVASCKI, DJe 28.4.2016. PRAZO PRESCRICIONAL QUINQUENAL. RECURSO ESPECIAL DO INSS A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. Cinge-se a controvérsia à fixação do prazo prescricional da ação de ressarcimento de benefício previdenciário pago indevidamente, quando comprovada a má-fé do benefíciário. 2. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 669.069/MG , em sede de repercussão geral, Rel. Min. TEORI ZAVASCKI, DJe 28.4.2016, consolidou ao orientação de que é prescritível a ação de reparação de danos à Fazenda Pública decorrente de ilícito civil. 3. De fato, a prescrição é a regra no ordenamento jurídico, assim, ainda que configurada a má-fé do benefíciário no recebimento dos valores, inexistindo prazo específico definido em lei, o prazo prescricional aplicável é o de 5 anos, nos termos do art. 1o. do Decreto 20.910/1932, em respeito aos princípios da isonomia e simetria. 4. Enquanto não reconhecida a natureza ímproba ou criminal do ato causador de dano ao erário, a pretensão de ressarcimento sujeita-se normalmente aos prazos prescricionais. 5. Recurso Especial do INSS a que se nega provimento. (REsp 1825103/SC , Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, julgado em 12/11/2019, DJe 22/11/2019) – grifo nosso.
Ademais, o apelante não apresentou elementos que pudessem afastar a contagem do prazo prescricional. Conforme destacado na sentença, ficou demonstrado que o INSS teve ciência das irregularidades muito tempo antes de iniciar os procedimentos administrativos, e a simples instauração desses processos não suspende ou interrompe o prazo prescricional.
Portanto, o reconhecimento da prescrição pelo juízo de origem encontra-se em total conformidade com o ordenamento jurídico e com os precedentes dos tribunais superiores.
Por outro lado, o INSS argumenta que o banco deveria ter adotado medidas para evitar os pagamentos indevidos, sob pena de ser responsabilizado pelos prejuízos ao erário.
Entretanto, nos termos do art. 68, da Lei 8.212/1991, compete ao Titular do Cartório de Registro Civil de Pessoas Naturais comunicar ao INSS, até o dia 10 de cada mês, o registro dos óbitos ocorridos no mês imediatamente anterior. Após a comunicação, passa a ser de responsabilidade do INSS informar o óbito ao sistema de banco de dados, atualizando-o para sustar o depósito de benefícios na conta de beneficiário falecido. Além disso, da interpretação do art. 69 da mesma lei, infere-se que cumpre ao INSS fiscalizar o pagamento dos benefícios previdenciários, a fim de apurar irregularidades ou erros materiais.
Posta a questão nestes termos, verifica-se que o crédito efetuado de forma indevida, seja por falhas no sistema de controle do INSS, que é responsável por gerenciar a realização do censo previdenciário, seja por eventual ausência de comunicação do óbito pelo Cartório de Registro Civil de Pessoas Naturais, não pode ser atribuído à instituição bancária, que atuou como mera depositária dos valores creditados.
Portanto, não há que se falar na prática de ato ilícito por parte da instituição financeira, ao passo que o próprio INSS não tomou as medidas de controle e fiscalização dos benefícios por ele administrados, não devendo o banco ser responsabilizado pela negligência da própria autarquia previdenciária.
Nesse mesmo sentido, confira-se o seguinte precedente deste egrégio Tribunal:
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. PROCEDIMENTO ORDINÁRIO. SAQUES DE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS REALIZADOS APÓS O FALECIMENTO DO SEGURADO. INSTITUIÇÃO FINANCEIRA DEPOSITÁRIA. BANCO ITAÚ. AUSÊNCIA DE RESPONSABILIDADE. ANULAÇÃO DE PROCESSO ADMINISTRATIVO QUE RECONHECEU A OBRIGAÇÃO DE RESSARCIR O ERÁRIO. POSSIBILIDADE. SENTENÇA CONFIRMADA. I Trata-se de ação em que se discute a responsabilidade de instituição financeira pelo pagamento indevido de benefício previdenciário a segurado já falecido. II Nos termos do art. 179 do Decreto nº 3.048/1999, com redação dada pelo Decreto nº 5.545/2005, que trata do regulamento da Previdência Social, a responsabilidade pela realização do censo previdenciário é do INSS, cabendo à instituição financeira apenas coletar os dados e repassá-los à autarquia previdenciária. III De acordo com o art. 68 da Lei nº 8.212/1991, com a redação dada pela Lei nº 8.870/1994, vigente à época dos fatos, "o Titular do Cartório de Registro Civil de Pessoas Naturais fica obrigado a comunicar, ao INSS, até o dia 10 de cada mês, o registro dos óbitos ocorridos no mês imediatamente anterior, devendo da relação constar afiliação, a data e o local de nascimento da pessoa falecida". IV - Na hipótese dos autos, o pagamento de benefício previdenciário efetuado de forma indevida, seja por falhas no sistema de controle do INSS, que é responsável por gerenciar a realização do censo previdenciário, seja por eventual ausência de comunicação do óbito pelo Cartório de Registro Civil de Pessoas Naturais, não pode ser atribuído à instituição bancária, que atuou como mera depositária dos valores creditados. Precedentes. V Apelação desprovida. Sentença confirmada. A verba honorária de sucumbência, fixada em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa (R$ 115.678,73), resta acrescida de 1% (um por cento), totalizando 11% (onze por cento) sobre o referido montante, nos termos do § 11 do art. 85 do NCPC.
(TRF-1 - AC: 10025881620194013400, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA PRUDENTE, Data de Julgamento: 07/12/2022, 5ª Turma, Data de Publicação: PJe 12/12/2022 PAG PJe 12/12/2022 PAG) – grifo nosso.
***
Em face do exposto, nego provimento à Apelação, para manter a sentença recorrida em todos os seus termos.
Os honorários advocatícios fixados na sentença no percentual mínimo previsto nas alíneas I a V, §3º, artigo 85, do CPC sobre o valor do proveito econômico, apurado em cumprimento de sentença, deverão ser acrescidos de 2%, na forma do art. 85, §11, do CPC.
É o voto.
Desembargador Federal EDUARDO MARTINS
Relator
PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 13 - DESEMBARGADOR FEDERAL EDUARDO MARTINS
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1012478-47.2017.4.01.3400
Processo de origem: 1012478-47.2017.4.01.3400
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
APELADO: ITAU UNIBANCO S.A.
EMENTA
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORINÁRIA. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. IMPRESCRITIBILIDADE. COBRANÇAS ADMINISTRATIVAS DECORRENTES DE ILÍCITO CIVIL. PRESCRIÇÃO RECONHECIDA. RESPONSABILIDADE DO INSS POR FISCALIZAÇÃO DOS BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS. RECURSO DESPROVIDO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS MAJORADOS (ART. 85, §11, CPC).
1. Trata-se de apelação interposta contra sentença que determinou ao INSS que se abstivesse de realizar a inclusão do nome do banco no Cadastro Informativo de Créditos Não Quitados do Setor Público – CADIN e, caso já constasse, que efetuasse a exclusão, reconhecendo, ainda, a prescrição das cobranças administrativas relacionadas a valores pagos indevidamente após o óbito de beneficiários.
2. O STF decidiu, no julgamento do RE 669.069/MG , em regime de repercussão geral, que “é prescritível a ação de reparação de danos à Fazenda Pública decorrente de ilícito civil”.
3. O STJ fixou o entendimento de que “(...) a prescrição é a regra no ordenamento jurídico, assim, ainda que configurada a má-fé do benefíciário no recebimento dos valores, inexistindo prazo específico definido em lei, o prazo prescricional aplicável é o de 5 anos, nos termos do art. 1o. do Decreto 20.910/1932, em respeito aos princípios da isonomia e simetria” ( REsp 1825103/SC , Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, julgado em 12/11/2019, DJe 22/11/2019) (g.n.).
4. No caso, as cobranças administrativas decorrem de ilícito civil, relacionado a valores pagos indevidamente após o óbito de beneficiários, não se enquadrando nas hipóteses de imprescritibilidade, sendo aplicável, portanto, o prazo prescricional quinquenal, nos termos do art. 1º do Decreto nº 20.910/1932.
5. Nos termos do art. 68, da Lei 8.212/1991, compete ao Titular do Cartório de Registro Civil de Pessoas Naturais comunicar ao INSS, até o dia 10 de cada mês, o registro dos óbitos ocorridos no mês imediatamente anterior. Após a comunicação, passa a ser de responsabilidade do INSS informar o óbito ao sistema de banco de dados, atualizando-o para sustar o depósito de benefícios na conta de beneficiário falecido. Além disso, da interpretação do art. 69 da mesma lei, infere-se que cumpre ao INSS fiscalizar o pagamento dos benefícios previdenciários, a fim de apurar irregularidades ou erros materiais.
6. Na espécie, não há que se falar na prática de ato ilícito por parte da instituição financeira, ao passo que o próprio INSS não tomou as medidas de controle e fiscalização dos benefícios por ele administrados, não devendo o banco ser responsabilizado pela negligência da própria autarquia previdenciária.
7. Apelação desprovida.
8. Os honorários advocatícios fixados na sentença no percentual mínimo previsto nas alíneas I a V, §3º, artigo 85, do CPC sobre o valor do proveito econômico, apurado em cumprimento de sentença, deverão ser acrescidos de 2%, na forma do art. 85, §11, do CPC.
ACÓRDÃO
Decide a Quinta Turma, por unanimidade, negar provimento à Apelação, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF, data e assinatura eletrônicas.
Desembargador Federal EDUARDO MARTINS
Relator