
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:ANTONIO DE ASSIS REZENDE
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: FERNANDA MOREIRA FERREIRA - GO30742-A
RELATOR(A):LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO

APELAÇÃO CÍVEL (198)1017626-20.2023.4.01.9999
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. JUÍZA FEDERAL LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO (RELATORA CONVOCADA):
Trata-se de apelação interposta pelo INSS, de sentença na qual foi julgado procedente o pedido de concessão de benefício assistencial à pessoa com deficiência, no valor de 01 (um) salário mínimo mensal, desde a data do requerimento administrativo, em 16/08/2021 (fls. 104/113) ¹.
Nas suas razões, a autarquia previdenciária pugna pela reforma da sentença para que seja julgado improcedente o pedido, diante da ausência do critério da miserabilidade, alegando que o autor possui um veículo automotor e sua esposa é servidora pública aposentada e exerce atividade empresarial (fls.141/149).
Requer, ainda: “1. A observância da prescrição quinquenal; 2. Na hipótese de concessão de aposentadoria, a intimação da parte autora para firmar e juntar aos autos a autodeclaração prevista no anexo I da Portaria INSS nº 450, de 03 de abril de 2020, em observância às regras de acumulação de benefícios estabelecida no art. 24, §§ 1.º e 2.º da Emenda Constitucional 103/2019; 3. Nas hipóteses da Lei n. 9.099/95, caso inexista nos autos declaração com esse teor, a intimação da parte autora para renúncia expressa dos valores que excedam o teto de 60 (sessenta) salários mínimos na data da propositura da ação e que eventualmente venham a ser identificados ao longo do processo, inclusive em sede de execução; 4. A fixação dos honorários advocatícios nos termos da Súmula 111 do STJ, sendo indevidos nas hipóteses da Lei 9.099/95; 5. A declaração de isenção de custas e outras taxas judiciárias; 6. O desconto dos valores já pagos administrativamente ou de qualquer benefício inacumulável recebido no período e a cobrança de eventuais valores pagos em sede de antecipação dos efeitos da tutela posteriormente revogada”.
Foram apresentadas contrarrazões (fls. 155/163).
É o relatório.
¹ Os números de folhas indicados referem-se à rolagem única, ordem crescente.

VOTO
A EXMA. SRA. JUÍZA FEDERAL LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO (RELATORA CONVOCADA):
O recurso reúne os requisitos de admissibilidade, merecendo ser conhecido.
Mérito
Nos termos do art. 203, inciso V, da Constituição Federal, e da Lei n. 8.742/93, é assegurado o benefício de 1 (um) salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, independente de contribuição à seguridade social.
Os requisitos para a concessão do benefício de prestação continuada estão elencados no art. 20 da Lei n. 8.742/93, quais sejam: a) ser pessoa com deficiência ou idoso com 65 anos de idade ou mais; b) não receber benefício no âmbito da seguridade social ou de outro regime e c) ter renda mensal familiar per capita igual ou inferior a ¼ do salário mínimo (requisito para aferição da miserabilidade).
Da situação existencial de miserabilidade
Em relação ao estado de miserabilidade, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento dos RE’s n. 567.985 e n. 580.963 e da Reclamação n. 4.374, decidiu que o parâmetro da renda mensal familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo não é mais adequado para aferir a situação de miserabilidade do idoso ou do deficiente, razão pela qual declarou a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93.
O Superior Tribunal de Justiça, de sua vez, quando do julgamento de Recurso Especial 1112557/MG, submetida ao rito de Recurso Repetitivo, pronunciou-se da seguinte forma:
“RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA, QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98, dispõe que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja família possua renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para o acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001).
4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana, especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente a o cidadão social e economicamente vulnerável.
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.
7. “Recurso Especial provido.”
(REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/10/2009, DJe 20/11/2009)
Utiliza-se como parâmetro razoável a renda per capita de ½ (meio) salário mínimo, estabelecida em legislações posteriores à LOAS, como a Lei n. 10.689/2003 (PNAA) e o Decreto n. 11.016/2022, referente ao Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal.
Nesse sentido, considerando o entendimento jurisprudencial atual, a vulnerabilidade social deve ser avaliada de acordo com o caso concreto, segundo fatores que possibilitem a constatação da hipossuficiência do requerente, sendo o critério objetivo legal apenas uma referência.
Do caso concreto
A parte autora, nascida em 12/06/1956, completou 65 anos de idade no ano de 2021, tendo requerido administrativamente o beneficio, em 16/03/2022. Portanto, cumpriu o requisito etário para a concessão do benefício assistencial legalmente assegurado à pessoa idosa.
Não obstante, o implemento do benefício assistencial exige também a verificação da condição de miserabilidade do núcleo familiar.
O estudo socioeconômico (fls. 66/75) constatou que o autor reside, em imóvel próprio, com a esposa, a qual é aposentada e aufere um salário mínimo mensal. As despesas básicas totalizam aproximadamente R$ 855,00 (oitocentos e cinquenta e cinco reais). O autor possui um veículo VW/Fusca 1300, ano 1975, modelo 1976, com placa KBH 7623.
Por fim, o requerente declarou que a renda auferida pelo grupo familiar tem sido insuficiente para a subsistência das despesas básicas. A assistente social, por sua vez, emitiu parecer favorável ao deferimento do benefício.
Constatei indicativos de que o periciando se encontra em situação de vulnerabilidade social, uma vez que a renda auferida pelo cônjuge é insuficiente para o provimento das despesas básicas, de forma que, de acordo com a Lei nº. 10.741, de 1º de outubro de 2003, o autor preenche os requisitos cabíveis à lei.
O entendimento jurisprudencial atual considera que a vulnerabilidade social deve ser avaliada de acordo com o caso concreto, segundo fatores que possibilitem constatar a hipossuficiência do beneficiário, sendo o critério objetivo legal apenas uma referência.
Nessa seara, pelo estudo social realizado acostado nos autos, constata-se que a requerente se encontra em situação de vulnerabilidade social, pois não possui renda e sobrevive do auxílio financeiro de sua filha, a qual recebe apenas um salário mínimo.
Logo, por ser pessoa idosa e em situação de vulnerabilidade social, constatada pelo estudo social, a requerente atende aos requisitos para a concessão do benefício assistencial, nos termos do art. 20 da Lei n. 8.742/93.
Não merece vingar a alegação do INSS, no sentido de que não há hipossuficiência em razão da existência de uma empresa em nome da esposa do autor, uma vez que o autor informou, em contrarrazões, que a sua esposa não é empresária. Ademais, o laudo social constatou a situação de vulnerabilidade social.
Quanto à alegação de que o autor é proprietário de um veículo, trata-se de automóvel extremamente antigo (de 1975), em pouco acrescentando em sua condição financeira, visto o reduzido valor de mercado do bem, não se tratando de veículo colecionável.
Portanto, a insurgência do INSS contra a sentença que deferiu o benefício assistencial não pode prosperar, restando comprovado o preenchimento dos requisitos para a concessão do benefício assistencial, nos termos do art. 20 da Lei n. 8.742/93.
Quanto aos pedidos eventuais, constato que a ação foi ajuizada em 16/03/2022, não podendo ser acolhida a alegação de prescrição quinquenal prevista no art. 103, parágrafo único, da Lei nº 8.213/1991, uma vez que o benefício foi deferido a partir de 16/08/2021.
Por sua vez, os honorários advocatícios já foram fixados no mínimo e em observância à súmula 111 do STJ, sem condenação em custas.
No que se refere à exigência da autodeclaração, trata-se de documento a ser apresentado junto ao requerimento administrativo, inclusive por meio dos canais remotos de atendimento do INSS, nos termos do art. 62, parágrafo único da Portaria 450/2020.
Também não se aplica, na hipótese, a Lei 9.099/95, por não se tratar de ação que tramitou perante o Juizado Especial
Por fim, não há que se falar em desconto de valores diante da inexistência de revogação de tutela antecipada.
Ante o exposto, nego provimento à apelação interposta pelo INSS.
Honorários advocatícios fixados em 1% do valor das parcelas vencidas até a data da prolação do acórdão (Súmula nº 111, do STJ).
É como voto.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Juíza Federal LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO
Relatora Convocada

99APELAÇÃO CÍVEL (198)1017626-20.2023.4.01.9999
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
ANTONIO DE ASSIS REZENDE
Advogado do(a) APELADO: FERNANDA MOREIRA FERREIRA - GO30742-A
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. IDOSO. LAUDO SOCIAL ATESTANDO A SITUAÇÃO EXISTENCIAL DE MISERABILIDADE. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. CABIMENTO DO BENEFÍCIO. APLICAÇÃO DO ART. 20, CAPUT E PARÁGRAFO 1° DA LEI 8.742/93. SENTENÇA MANTIDA.
1. Os requisitos para a concessão do benefício de prestação continuada encontram-se elencados no art. 20 da Lei nº 8.742/93, quais sejam: a) ser pessoa com deficiência ou idoso com 65 anos ou mais; b) não receber benefício no âmbito da seguridade social ou de outro regime e c) ter renda mensal familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo (requisito para aferição da miserabilidade).
2. Em relação à situação existencial de miserabilidade, o Plenário do STF, no julgamento dos RE’s n. 567.985 e n. 580.963 e da Reclamação n. 4.374, entendeu que o parâmetro da renda mensal familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo não é mais adequado para aferir a situação de miserabilidade do idoso ou do deficiente, razão pela qual declarou a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93. Utiliza-se como parâmetro razoável a renda per capita de ½ (meio) salário mínimo, estabelecida em legislações posteriores à LOAS, como a Lei n. 10.689/2003 (PNAA) e o Decreto n. 11.016/2022, referente ao Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal.
3. No caso, por ser pessoa idosa e em situação de vulnerabilidade social constatada pelo estudo social, a requerente atende aos requisitos para a concessão do benefício assistencial, nos termos do art. 20 da Lei n. 8.742/93.
4. Apelação interposta pelo INSS desprovida.
ACÓRDÃO
Decide a nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do voto da Relatora.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Juíza Federal LILIAN OLIVEIRA DA COSTA TOURINHO
Relatora Convocada