
POLO ATIVO: JOSE DE RIBAMAR NUNES
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: CARLOS EDUARDO MORAES MARAO - MA6305-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):ANTONIO OSWALDO SCARPA
PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 26 - DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA
PJE/TRF1-Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1001151-78.2017.4.01.3700
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: JOSE DE RIBAMAR NUNES
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo autor, em face de sentença que julgou improcedente o pedido de declaração de inexistência de débito previdenciário junto ao erário, cumulado com restabelecimento do benefício de prestação continuada ao idoso, ante a constatação de má-fé no recebimento do benefício, e da não comprovação do requisito etário na DIB (30/08/2001), uma vez que nos bancos de dados do INSS, constava a data de nascimento em 17/9/1933, quando a data correta seria 17/9/1938, tendo cessado o benefício em 15/06/2016.
Em suas razões recursais, alega a parte autora que a sentença deve ser reformada ou anulada, a fim de que seja declarada a inexigibilidade do débito e restabelecido o benefício, ante a ocorrência da decadência do direito de a administração pública anular o ato administrativo concessório do benefício (ano de 2001), com o fulcro no art. 54 da Lei 9.784/99. Aduz que não foi o responsável pelo preenchimento dos dados para a obtenção do benefício, a prescritibilidade da pretensão do ressarcimento ao erário, a não observância dos princípios da ampla defesa e contraditório, em razão do juízo a quo ter negado a produção da prova testemunhal e perícia socioeconômica, sendo somente realizada a perícia grafotécnica, comprovando que teria agido de boa-fé, bem como a situação de miserabilidade social.
Assevera, ainda, que, em razão de ter cumprido o requisito etário para a percepção do benefício em 17/09/2008, no caso de se entender que houve a má-fé, pugna pelo não ressarcimento do débito apurado a partir do momento em que passou a fazer jus ao BPC ao idoso.
Por fim, pugna pela concessão da tutela antecipada de urgência, para que o INSS se abstenha de praticar as medidas tendentes à efetivação da devolução dos valores a título de Benefício de Prestação Continuada (BPC/LOAS), inclusive mediante medidas de coerção diretas (como a execução fiscal) e indiretas (tais quais inscrição do autor em cadastros restritivos de crédito), bem como, se já tomou quaisquer dessas medidas, determinar a sua imediata suspensão, determinando-se, ainda, o imediato restabelecimento do benefício. Subsidiariamente, requer que a declaração de inexistência de débito seja decretada a partir do momento no qual a parte autora preencheu os requisitos ao benefício, qual seja em 17/09/2008, com o seu restabelecimento, ou a anulação da sentença, e o retorno dos autos à origem, a fim de que sejam produzidas as provas requeridas, bem como manifestação da DPU quanto à ausência do apelante na perícia grafotécnica.
Contrarrazões apresentadas.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 26 - DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA
PJE/TRF1-Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1001151-78.2017.4.01.3700
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: JOSE DE RIBAMAR NUNES
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA (RELATOR):
O recurso reúne as condições de admissibilidade, merecendo ser conhecido.
O benefício de prestação continuada está previsto no art. 203, V, da Constituição Federal, que garante o pagamento de um salário mínimo à pessoa com deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, nos termos da lei.
Os requisitos para a concessão do benefício de prestação continuada estão estabelecidos no art. 20 da Lei n. 8.742/93, a saber: i) o requerente deve ser portador de deficiência ou ser idoso com 65 anos ou mais; ii) não receber benefício no âmbito da seguridade social ou de outro regime e iii) ter renda mensal familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo (requisito para aferição da miserabilidade).
No caso dos autos, o juízo a quo julgou improcedente o pedido de declaração de inexistência de débito previdenciário junto ao erário, cumulado com restabelecimento do benefício de prestação continuada ao idoso, ante a constatação de má-fé no recebimento do benefício, por entender comprovado que a parte autora não possuía o requisito etário na data da DIB (30/08/2001), uma vez que dos bancos de dados do INSS, constava a data de nascimento em 17/9/1933, quando a data correta seria 17/9/1938, sendo cessado o benefício em 15/06/2016.
Da inexigibilidade dos valores recebidos
Acerca da alegada irregularidade na concessão do benefício à apelante, verifica-se que o INSS encaminhou notificação de cobrança dos valores devidos, correspondente aos períodos em que teria auferido o benefício irregularmente, totalizando o montante de R$ 117.288,38 (cento e dezessete mil, duzentos e oitenta e oito reais e trinta e oito centavos).
O apelante alega que não ter sido o responsável pelo preenchimento dos dados para a obtenção do benefício, e que não foram observados os princípios da ampla defesa e contraditório no curso do processo, em razão do juízo a quo ter indeferido a produção da prova testemunhal e perícia socioeconômica, o que comprovaria a sua atuação de boa-fé, bem como a sua situação de miserabilidade social.
Ressalta-se que, em razão da idade avançada da requerente (91 anos) e de ser tecnicamente vulnerável,, não pode ser exigido conhecimento específico para compreender o correto atendimento das exigências dispostas na lei para concessão do benefício, presumindo-se que tenha agido de boa-fé.
o qual é incabível a devolução de valores recebidos de boa-fé pelos beneficiários do INSS, pois reconhecidas a natureza alimentar da prestação e a presunção de boa-fé do segurado. Incidência da Súmula 83/STJ. 2. Agravo regimental não provido"(STJ, AgRg no AREsp 820.594/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELLMARQUES, SEGUNDA TURMA, DJe de 01/03/2016).
Nessa linha é o entendimento desta Corte Regional:
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. LOAS DEFICIENTE E APOSENTADORIA POR IDADE. PERCEPÇÃO SIMULTÂNEA. REPOSIÇÃO AO ERÁRIO. DESNECESSIDADE. VERBA ALIMENTAR RECEBIDA DE BOA-FÉ. 1. Infundada a alegação de inadequação da via eleita, eis que, no caso em exame, a análise do mérito não depende de dilação probatória. 2. No tocante à percepção de benefícios previdenciários, já se manifestou o Superior Tribunal de Justiça quanto à irrepetibilidade de valores percebidos de boa-fé pelo segurado, em decorrência de erro administrativo em seu pagamento (REsp 1674457/RJ, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/08/2017, DJe 09/08/2017; REsp 1666580/PE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 27/06/2017, DJe 30/06/2017) 3. Hipótese em que a impetrante continuou recebendo benefício assistencial de seu filho após a concessão da própria aposentadoria por idade em 08/06/2009, porém não há comprovação nos autos de que o tenha feito por má-fé, mormente considerando o entendimento jurisprudencial no sentido de que o recebimento de benefício previdenciário por idade pode ser excluído do cômputo da renda familiar para fins de análise do critério econômico. Portanto, não há que se falar em má-fé e obrigatoriedade de restituição dos valores percebidos, em homenagem aos princípios da irrepetibilidade das verbas alimentares e da presunção de boa-fé. 4. Os princípios da segurança das relações jurídicas, da boa-fé, da confiança e da presunção de legitimidade dos atos administrativos justificam a adoção dessa linha de raciocínio, porque confia o administrado na regularidade do pagamento operacionalizado pela Administração, passando a dispor dos valores percebidos com a firme convicção de estar correto o pagamento implementado, de sorte que não haveria riscos de vir a ter que devolvê-los. 5. Apelação e remessa oficial desprovidas. (AC 1000046-93.2017.4.01.3303, DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO LUIZ DE SOUSA, TRF1 - SEGUNDA TURMA, PJe 22/09/2022 PAG.)
Quanto à percepção de benefícios previdenciários, também já se manifestou o Superior Tribunal de Justiça acerca da irrepetibilidade dos valores percebidos de boa-fé pelo segurado, em decorrência de erro administrativo em seu pagamento.
Nesse sentido:
PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. VIOLAÇÃO AOS ARTS. 884 E 885 DO CÓDIGO CIVIL E AO ART. 154 DO DECRETO 3.048/1999. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211/STJ. PAGAMENTO INDEVIDO. BOA-FÉ COMPROVADA. ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. VERBA DE CARÁTER ALIMENTAR. FUNDAMENTO AUTÔNOMO NÃO IMPUGNADO. DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO. SÚMULAS 283 E 284 DO STF. RESTITUIÇÃO DE VALORES. IMPOSSIBILIDADE. REVISÃO DO CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA 7/STJ. REQUISITOS. ART. 203, V, DA CF/1988. LEI 8.742/93, ART. 20, § 3º. MISERABILIDADE AFERIDA POR OUTROS CRITÉRIOS QUE NÃO A LIMITAÇÃO DA RENDA PER CAPITA FAMILIAR. REEXAME DE PROVAS. SÚMULA 7/STJ. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. ANÁLISE PREJUDICADA.
1. Cuida-se, na origem, de ação ordinária em que a parte autora requereu o restabelecimento do benefício de amparo social, bem como a declaração de inexistência de débito perante a Previdência Social.
A sentença julgou parcialmente procedente o pedido apenas para declarar a inexistência de débito do autor perante o INSS.
RECURSO ESPECIAL DO INSS 2. Em relação aos arts. 884 e 885 do Código Civil e ao art. 154 do Decreto 3.048/1999, a Corte local não emitiu juízo de valor sobre a alegada matéria. É necessária a efetiva discussão do tema pelo Tribunal a quo, ainda que em Embargos de Declaração. O Superior Tribunal de Justiça entende ser inviável o conhecimento do Recurso Especial quando os artigos tidos por violados não foram apreciados pelo Tribunal de origem, a despeito da oposição de Embargos de Declaração, haja vista a ausência do requisito do prequestionamento.
Incide, na espécie, a Súmula 211/STJ. 3. Nas razões do Recurso Especial, o INSS sustenta apenas a necessidade de restituição do benefício previdenciário indevidamente pago, sendo esta a interpretação dos arts. 115, II, parágrafo único, da Lei 8.213/1991 e 154, II, § 3°, do Decreto 3.048/1999. Todavia, no enfrentamento da matéria, o Tribunal de origem consignou que "o benefício foi requerido e recebido de boa-fé"e que "não pode agora a autarquia exigir a repetição dos respectivos valores, notadamente por terem caráter alimentar" (fl. 424, e-STJ).
4. Sendo assim, como o fundamento não foi atacado pela parte recorrente e é apto, por si só, para manter o decisum combatido, permite-se aplicar na espécie, por analogia, os óbices das Súmulas 284 e 283 do STF, ante a deficiência na motivação e a ausência de impugnação de fundamento autônomo.
5. Ademais, a jurisprudência do STJ se firmou no sentido de que, em razão do caráter alimentar dos proventos aliado à percepção de boa-fé, é impossível a devolução de valores recebidos a título de benefício previdenciário por razão de erro da Administração, aplicando-se ao caso o princípio da irrepetibilidade dos alimentos.
6. Tendo o Tribunal de origem reconhecido a boa-fé em relação ao recebimento do benefício objeto da insurgência, descabe ao STJ iniciar juízo valorativo a fim de alterar tal entendimento, ante o óbice da Súmula 7/STJ.
RECURSO ESPECIAL DO SEGURADO 7. A Terceira Seção do STJ, ao apreciar o REsp 1.112.557/MG, submetido à sistemática do art. 543-C do CPC, firmou a compreensão de que o critério objetivo de renda per capita mensal inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo - previsto no art. 20, § 3°, da Lei 8.742/93 - não é o único parâmetro para aferir hipossuficiência, podendo tal condição ser constatada por outros meios de prova. Precedentes: AREsp 110.176/CE, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJe 4/6/2013; AREsp 332.275/PR, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe 27/5/2013; AREsp 327.814/SP, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJe 22/5/2013. 8. No presente caso, a negativa de concessão do benefício assistencial não se limitou apenas ao critério objetivo fixado no § 3º do art. 20 da Lei 8.742/1993, porquanto considerou também o contexto fático da situação na qual vive a parte autora.
9. Modificar a conclusão a que chegou a Corte de origem, de modo a acolher a tese do recorrente, demanda reexame do acervo fático-probatório dos autos, inviável em Recurso Especial, sob pena de violação da Súmula 7 do STJ. 10. O óbice da Súmula 7 do STJ atinge também o Recurso Especial interposto com fundamento na alínea c do inciso III do artigo 105 da Constituição da República, porque impede o exame de dissídio jurisprudencial, uma vez que falta identidade entre os paradigmas apresentados e os fundamentos do acórdão, tendo em vista a situação fática do caso concreto, com base na qual a Corte de origem deu solução à causa. CONCLUSÃO 11. Recursos Especiais não conhecidos.
(REsp 1666580/PE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 27/06/2017, DJe 30/06/2017)
Desse modo, o conjunto probatório é suficiente a demonstrar que a apelante não detinha conhecimento acerca do recebimento indevido do benefício. Denota-se, portanto, que agiu de boa-fé.
Em razão do apelante ter recebido o benefício assistencial de boa-fé, está desobrigada a restituir os valores já recebidos.
Do restabelecimento do benefício
Quanto ao pedido de restabelecimento do benefício assistencial, verifica-se que não foi realizado o estudo socioeconômico para a aferição da miserabilidade social da apelante.
Com efeito, o entendimento da doutrina e a jurisprudência é no sentido de que o Juiz não é um mero expectador dos fatos produzidos no processo. Destarte, havendo necessidade de colheita de determinada prova, o julgador, em busca da verdade real – e não apenas da verdade formal, deve determinar, ainda que de ofício, a produção da prova.
Nesse sentido, vejam-se julgados desta Corte:
PROCESSUAL CIVIL E ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO DE AMPARO SOCIAL À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. LEI N. 8.742/93. AUSENCIA DE PROVA PERICIAL E DE LAUDO SOCIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. APELAÇÃO PROVIDA. 1. A sentença proferida na vigência do CPC/2015 não está sujeita à remessa necessária, pois a condenação nela imposta não tem o potencial de ultrapassar o limite previsto no art. 496, § 3º, do novo CPC. 2. A prescrição atinge as prestações anteriores ao quinquênio que antecedeu o ajuizamento da ação, nos termos da Súmula 85/STJ. 3. O benefício de prestação continuada é devido à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 anos ou mais, que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. 4. Considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade com as demais pessoas (art. 20, §§ 2º e 10, da Lei n. 8.742/93, com redação dada pela Lei n. 12.435/2011). A deficiência deve ser verificada por meio de perícia médica. 5. A família com renda mensal per capita inferior a ¼ do salário mínimo não é capaz de prover de forma digna a manutenção do membro idoso ou portador de deficiência física (§ 3º, art. 20, Lei n. 8.742/93). Contudo, o legislador não excluiu outras formas de verificação da condição de miserabilidade. Precedentes do STJ, da TNU e desta Corte. 6. A perícia médica não foi acostada aos autos. 7. O estudo social, prova apta a aferir a discutida vulnerabilidade social, também não foi produzida, pois o juízo a quo entendeu que a prova documental produzida era suficiente para o julgamento da lide, o que cerceou o direito da parte autora de comprovar a sua situação de incapacidade laboral e de miserabilidade social. 8. A sentença deve ser anulada e determinado o retorno dos autos ao Juízo de origem para regular processamento do feito. 9. Apelação provida. (TRF-1 - AC: 10047812420214019999, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA, Data de Julgamento: 09/11/2022, 1ª Turma, Data de Publicação: PJe 22/11/2022 PAG PJe 22/11/2022 PAG)
CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. LOAS. ART. 203, V, DA CF/88. LEI 8.742/93. PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA FÍSICA E/OU MENTAL. AUSÊNCIA DE PERÍCIA MÉDICA E DE ESTUDO SOCIOECONÔMICO. CERCEAMENTO DE DEFESA CONFIGURADO. SENTENÇA ANULADA. RETORNO À ORIGEM. 1. A Constituição Federal, em seu artigo 203, inciso V, e a Lei n. 8.742/93 (Lei Orgânica da Assistência Social) garantem um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, independentemente de contribuição à seguridade social. 2. Os requisitos para a concessão do benefício de prestação continuada estão estabelecidos no art. 20 da Lei n. 8.742/93. São eles: i) o requerente deve ser portador de deficiência ou ser idoso com 65 anos ou mais; ii) não receber benefício no âmbito da seguridade social ou de outro regime e iii) ter renda mensal familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo (requisito para aferição da miserabilidade). 3. A perícia médica e o estudo socioeconômico são procedimentos indispensáveis para a comprovação da incapacidade e da condição de miserabilidade daquele que requer benefício assistencial por invalidez. A ausência dos laudos técnicos correspondentes cerceia o direito das partes, mesmo não tendo havido requerimento de suas produções, cabendo ao juiz, no silêncio dos interessados, as suas respectivas designações, de ofício, em consonância com o art. 370 do CPC. 4. Inexistindo nos autos a realização da prova pericial e do estudo socioeconômico, elementos indispensáveis ao deslinde da demanda, forçoso anular a sentença e determinar a remessa dos autos à vara de origem para o regular prosseguimento do processo. 5. Apelação provida para anular a sentença e determinar o retorno dos autos à origem, prosseguindo-se com a regular instrução do processo. (TRF-1 - AC: 00153897820184019199, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO LUIZ DE SOUSA, Data de Julgamento: 31/08/2021, 2ª Turma, Data de Publicação: PJe 31/08/2021 PAG PJe 31/08/2021 PAG)
A perícia socioeconômica na hipótese vertente é procedimento indispensável para se comprovar o enquadramento da apelante aos requisitos vinculados à miserabilidade social. Portanto, a falta dessa prova inviabiliza o julgamento da lide.
Desse modo, é necessário o retorno dos autos para o juízo de primeira instância, para que a prova técnica seja realizada, visando à devida comprovação do estado de miserabilidade da apelante, para fins de se restabelecer o benefício de prestação continuada.
Fixo os honorários de sucumbência em 10% sobre o valor da condenação, nos termos da Súmula 111 do STJ e do art. 85, caput e §2°, do CPC, isento a parte autora, ante a sucumbência mínima.
Concedo a tutela antecipada de urgência, para que o INSS se abstenha de praticar as medidas tendentes à efetivação da devolução dos valores a título de Benefício de Prestação Continuada (BPC/LOAS), inclusive mediante medidas de coerção diretas (como a execução fiscal) e indiretas (tais quais inscrição do autor em cadastros restritivos de crédito), bem como, se já tomou quaisquer dessas medidas, determinar a sua imediata suspensão
Diante do exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação interposta pela parte autora para, reformando a sentença, declarar inexigível a pretensão ao ressarcimento dos valores ao erário.
No que tange ao pedido de restabelecimento do benefício assistencial, determino, de ofício, o retorno dos autos à origem, para realização da perícia socioeconômica, após o que, observadas as formalidades legais, deverá ser proferida nova sentença para análise da miserabilidade social da parte autora.
É como voto.
Desembargador Federal ANTÔNIO SCARPA
Relator
PODER JUDICIÁRIO FEDERAL
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 26 - DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO SCARPA
PJE/TRF1-Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1001151-78.2017.4.01.3700
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: JOSE DE RIBAMAR NUNES
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ART.20 DA LEI 8.742/93. APELAÇÃO DO AUTOR. IDOSO. MISERABILIDADE SOCIAL. DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO. BOA-FÉ DEMONSTRADA. RESTABELECIMENTO. AUSÊNCIA DO ESTUDO SOCIOECONÔMICO. CERCEAMENTO DE DEFESA CONFIGURADO. SENTENÇA ANULADA. RETORNO À ORIGEM. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.
1.Os requisitos para a concessão do benefício de prestação continuada estão estabelecidos no art. 20 da Lei n. 8.742/93, a saber: i) o requerente deve ser portador de deficiência ou ser idoso com 65 anos ou mais; ii) não receber benefício no âmbito da seguridade social ou de outro regime e iii) ter renda mensal familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo (requisito para aferição da miserabilidade).
2. No caso dos autos, o juízo a quo julgou improcedente o pedido de declaração de inexistência de débito previdenciário junto ao erário, cumulado com restabelecimento do benefício de prestação continuada ao idoso, ante a constatação de má-fé no recebimento do benefício, sob o fundamento de que ficou comprovado nos autos que a parte autora não possuía o requisito etário na data da DIB (30/08/2001), uma vez que nos bancos de dados do INSS constava a data de nascimento em 17/9/1933, quando a data correta seria 17/9/1938, sendo, pois, devida a cessação do benefício em 15/06/2016 (quando contava com 83 anos).
3. O apelante alega que não ter sido o responsável pelo preenchimento dos dados para a obtenção do benefício, e que não foram observados os princípios da ampla defesa e contraditório no curso do processo, em razão do juízo a quo ter indeferido a produção da prova testemunhal e perícia socioeconômica, o que comprovaria a sua atuação de boa-fé, bem como a sua situação de miserabilidade social.
5. Ressalta-se que, em razão da idade avançada da requerente (91 anos) e de ser tecnicamente vulnerável,, não pode ser exigido conhecimento específico para compreender o correto atendimento das exigências dispostas na lei para concessão do benefício, presumindo-se que tenha agido de boa-fé.
6. Descabe a devolução dos valores recebidos a título de LOAS, se as circunstâncias em que foi concedido o benefício previdenciário evidenciam a boa-fé objetiva da apelante.(STJ, AgRg no AREsp 820.594/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, DJe de 01/03/2016).
7. O conjunto probatório é suficiente a demonstrar que o apelante não detinha conhecimento acerca do recebimento indevido do benefício, estando desobrigado a restituir os valores já recebidos.
8. Quanto ao pedido de restabelecimento do benefício assistencial, verifica-se que não foi realizado o estudo socioeconômico para a aferição da miserabilidade social da apelante.
9. A perícia socioeconômica na hipótese vertente é procedimento indispensável para se comprovar o enquadramento da apelante aos requisitos vinculados à miserabilidade social, de modo que sua ausência inviabiliza o julgamento da lide.
10. Faz-se necessário o retorno dos autos para o juízo de primeira instância, para que a prova técnica seja realizada, visando à devida comprovação do estado de miserabilidade da apelante, para fins de se restabelecer o benefício de prestação continuada.
11. Apelação da parte autora parcialmente provida para, reformando a sentença, declarar inexigível a pretensão ao ressarcimento dos valores ao erário.
12. A sentença deve ser anulada no tocante ao indeferimento do pleito de restabelecimento do benefício assistencial, e determinado o retorno dos autos à origem, para realização da perícia socioeconômica, após o que, observadas as formalidades legais, deverá ser proferida nova sentença para análise da miserabilidade social da parte autora.
12. Concedida tutela antecipada de urgência, para que o INSS se abstenha de praticar as medidas tendentes à efetivação da devolução dos valores a título de Benefício de Prestação Continuada (BPC/LOAS), inclusive mediante medidas de coerção diretas (como a execução fiscal) e indiretas (tais quais inscrição do autor em cadastros restritivos de crédito), bem como, se já tomou quaisquer dessas medidas, determinar a sua imediata suspensão.
13. Honorários de sucumbência fixados em 10% sobre o valor da condenação, nos termos da Súmula 111 do STJ e do art. 85, caput e §2°, do CPC, isento a parte autora, ante a sucumbência mínima.
A C Ó R D Ã O
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, à unanimidade, anular parcialmente a sentença no ponto em que foi julgado improcedente o pedido de restabelecimento do benefício assistencial, e dar parcial provimento à apelação à autora, para declarar inexigível a pretensão ao ressarcimento dos valores ao erário, nos termos do voto do Relator.
Brasília (DF), (data da Sessão).
Desembargador Federal ANTÔNIO SCARPA