
POLO ATIVO: ROSIMEIRE GOMES DA COSTA
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: ANNE KAROLINNE BELTRAME NECKEL - MT21867-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):RUI COSTA GONCALVES
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1004255-52.2024.4.01.9999
PROCESSO REFERÊNCIA: 1004009-25.2022.8.11.0037
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pela parte autora, ROSIMEIRE GOMES DA COSTA, de sentença pela qual o juízo a quo julgou improcedente o pedido de condenação do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS à concessão do benefício assistencial de prestação continuada à pessoa com deficiência, em razão do não preenchimento dos requisitos previstos no art. 20 da Lei n. 8.742/93 (Id n. 404267122 – p. 291-296).
Em suas razões recursais, a parte autora pugna pela reforma da sentença, aduzindo, essencialmente, que foram integralmente satisfeitos os requisitos para o deferimento do mencionado benefício assistencial (Id n. 404267122 – p. 298-301).
Sem contrarrazões (Id n. 404267122 – p. 302-303).
Por fim, na qualidade de custos iuris, manifestou-se o Ministério Público Federal favoravelmente ao provimento do recurso, com a consequente reforma do pronunciamento impugnado (Id n. 408832648).
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1004255-52.2024.4.01.9999
PROCESSO REFERÊNCIA: 1004009-25.2022.8.11.0037
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
V O T O
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES (RELATOR):
Presentes os requisitos de admissibilidade do recurso, passa-se ao juízo de mérito.
A questão em apreço diz respeito à verificação da existência do direito da parte autora à percepção do benefício assistencial de prestação continuada, que possui fundamento de validade constitucional no art. 203, V, da CRFB/88 e é disciplinado essencialmente pelo art. 20 da Lei n. 8.742/93, com destaque para o caput e os §§ 1º a 3º, transcritos em seguida:
“Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 1º Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 2º Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. (Redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015)
§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)”
Desses enunciados normativos, extraem-se os dois requisitos cumulativos para a concessão do referido benefício assistencial:
1) Requisito subjetivo: exigência de que o postulante ao benefício seja pessoa com deficiência ou pessoa idosa com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais; e
2) Requisito socioeconômico: o requerente deve comprovar “não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família” (situação de “miserabilidade”), utilizando-se como critério de avaliação a renda familiar mensal per capita, que, de acordo com a literalidade do § 3º do art. 20 da Lei n. 8.742/93 e ao menos em regra, deve ser igual ou inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
Tratando-se de requisitos cumulativos, a concessão do benefício demanda o cumprimento de ambos, de modo que a ausência de um deles prejudica a análise do outro.
É relevante registrar, ainda, que, de acordo com o § 10 do mesmo art. 20 (incluído pela Lei n. 12.470/11), considera-se impedimento de longo prazo, para os fins do § 2º deste artigo, aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos.
Requisito subjetivo
No que tange ao requisito subjetivo, o juízo a quo entendeu que “restou demonstrado, através do laudo pericial que a parte autora não está totalmente incapacitada para o exercício de atividades laborativas, de modo que constato que a parte requerente não faz jus ao benefício assistencial de prestação continuada, nos termos da Lei nº 8.742/93 c/c artigo 203, V, da Constituição Federal, haja vista que não foram preenchidos os requisitos legais” (Id n. 404267122 – p. 294).
Não parece, porém, a conclusão mais adequada, pois, conforme se depreende do laudo médico-pericial (Id n. 404267122 – p. 143-162), a parte autora/apelante é, há mais de 7 (sete) anos, portadora de “espondiloartrose lombar, lordose cervical, espondiloartrose cervical, dispneia sibilante (CID J 45.9, CID 10 M50.1), bem como de transtorno do disco cervical com radiculopatia e CID M54. 4 – Lumbago com ciática se caracteriza por dor intermitente na coluna lombar”, quadro de origem multifatorial, degenerativa e com provável concausa por anos de trabalho braçal, encontrando-se, por conseguinte, parcial e permanentemente incapacitada, com prejuízo funcional da coluna cervical/lombar e respiratória, razões pelas quais o médico perito concluiu categoricamente pela existência de deficiência/impedimento de longo prazo para o exercício de suas atividades habituais ou de quaisquer atividades que lhe garantam subsistência.
É fundamental frisar, nesse particular, que, desde o advento da Lei n. 12.470/11 (que alterou a redação do § 2º do art. 20 da Lei n. 8.742/93), para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência não aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho, mas sim “aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas”, nos termos da redação atual do dispositivo, dada pela Lei n. 13.146/15.
Destaque-se, nesse sentido, o enunciado 48 da Súmula da Turma Nacional de Uniformização: “Para fins de concessão do benefício assistencial de prestação continuada, o conceito de pessoa com deficiência, que não se confunde necessariamente com situação de incapacidade laborativa, exige a configuração de impedimento de longo prazo com duração mínima de 2 (dois) anos, a ser aferido no caso concreto, desde o início do impedimento até a data prevista para a sua cessação”.
Comprovada, portanto, a condição de pessoa com deficiência, nos termos do art. 20, 2º, da Lei n. 8.742/93 e com suporte no laudo médico-pericial antes referido, que não destoa dos demais elementos componentes do acervo probatório reunido nos autos (notadamente, dos documentos médicos apresentados pela parte autora/apelante).
Requisito socioeconômico
No julgamento dos Recursos Extraordinários n. 567985 e 580963, e da Reclamação n. 4374, o Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade do art. 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93, no que se refere à sobredita renda per capita.
Deveras, diante da constatação de que uma nova conjuntura normativo-social alterou a realidade objetiva verificada à época do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 1.232-1/DF, a Corte Suprema fixou a compreensão de que o parâmetro previsto pelo prefalado art. 20, § 3º, da LOAS não é mais servil à aferição da situação de hipossuficiência do idoso ou do deficiente, para fins de percepção da prestação em questão, daí por que não pode ser ele invocado como argumento para o seu indeferimento.
A 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça firmou, sob a sistemática dos recursos repetitivos (tema n. 185), a seguinte tese: “A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo”.
Em consonância com a jurisprudência dos Tribunais Superiores, este Tribunal Regional Federal reconhece que o patamar legal de um quarto do salário mínimo corresponde a padrão mínimo para reconhecimento da miserabilidade, sendo que a carência econômica pode ser aferida no caso concreto por critérios diversos, ainda que superado tal patamar:
“CONSTITUCIONAL E PREVIDENCIÁRIO. QUESTÃO DE ORDEM. ANULAÇÃO DO ACÓRDÃO ANTERIOR. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. LOAS. ART. 203, V, DA CF/88. LEI 8.742/93. PESSOA PORTADORA DE DEFICIENCIA FÍSICA E/OU MENTAL. PERÍCIA MÉDICA. INCAPACIDADE PARA O TRABALHO E PARA A VIDA INDEPENDENTE. ESTUDO SOCIOECONÔMICO. HIPOSSUFICIÊNCIA. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. INCAPACIDADE POSTERIOR AO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. CITAÇÃO.
1. Questão de ordem acolhida para anular o julgamento proferido por esta Segunda Turma (fls. 218/219), eis que, naquela oportunidade, foram julgados apenas o recurso de apelação e a remessa oficial, tendo em conta que o recurso adesivo, tempestivamente protocolado no juízo de origem, foi juntado posteriormente aos autos (fls. 247/249).
2. A Constituição Federal, em seu artigo 203, inciso V, e a Lei n. 8.742/93 (Lei Orgânica da Assistência Social) garantem um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, independentemente de contribuição à seguridade social.
3. Os requisitos para a concessão do benefício de prestação continuada estão estabelecidos no art. 20 da Lei n. 8.742/93. São eles: i) o requerente deve ser portador de deficiência ou ser idoso com 65 anos ou mais; ii) não receber benefício no âmbito da seguridade social ou de outro regime e iii) ter renda mensal familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo (requisito para aferição da miserabilidade).
4. O Col. STF, ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 1.232-1/DF, declarou que a regra constante do art. 20, § 3º, da LOAS não contempla a única hipótese de concessão do benefício, e sim presunção objetiva de miserabilidade, de forma a admitir a análise da necessidade assistencial em cada caso concreto, mesmo que o "quantum" da renda "per capita" ultrapasse o valor de ¼ do salário mínimo, cabendo ao julgador avaliar a vulnerabilidade social de acordo com o caso concreto.
5. Também o Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo, consagrou a possibilidade de demonstração da condição de miserabilidade do beneficiário por outros meios de prova, quando a renda per capita do núcleo familiar for superior a ¼ (um quarto) do salário mínimo. Nesse sentido, cf. REsp 1.112.557/MG, Terceira Seção, Relator Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJe de 20/11/2009.
6. Firmou-se o entendimento jurisprudencial de que, para fins de cálculo da renda familiar mensal, não deve ser considerado o benefício (mesmo que de natureza previdenciária) que já venha sendo pago a algum membro da família, desde que seja de apenas 1 (um) salário mínimo, forte na aplicação analógica do parágrafo único do art. 34 da Lei 10.741/2003 (Estatuto do Idoso). Precedentes.
7. Considera-se deficiente aquela pessoa que apresenta impedimentos (físico, mental, intelectual ou sensorial) de longo prazo (mínimo de 2 anos) que podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. Tal deficiência e o grau de impedimento devem ser aferidos mediante avaliação médica e avaliação social, consoante o § 6º do art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social.
8. Na hipótese, a incapacidade laborativa da parte autora para prover o seu sustento restou comprovada pelo laudo médico acostado; já a condição de miserabilidade, nos termos alinhavados acima, encontra-se escudada no estudo socioeconômico e documentos catalogados ao feito, autorizando, assim, a concessão do benefício vindicado.
9. Na hipótese de o perito não fixar a data de início da incapacidade laborativa, o termo inicial do benefício será a data do requerimento administrativo. Não havendo requerimento, será a data da citação do INSS. In casu, tendo o laudo judicial destacado que o início da incapacidade remonta a setembro de 2006 (quesito 09 - fls. 90), incabível a concessão de benefício por invalidez à data do requerimento administrativo (16.09.2003), como pretende o recorrente, por ser data anterior à fixada pelo expert, não havendo conjunto probatório suficiente para afastar a conclusão pericial acerca do início da incapacidade. Acertada a sentença ao fixar a data da citação como termo inicial do benefício, por ser este o momento em que o INSS teve ciência da incapacidade do recorrente.
10. Correção monetária e juros de mora nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal.
11. Acórdão de fls. 218/219 anulado. Apelação, remessa oficial, tida por interposta, e recurso adesivo desprovidos.”
(TRF-1ª Região, 2ª Turma, AC n. 0014219-47.2013.4.01.9199, Relator Desembargador Federal João Luiz de Souza, e-DJF1 27/05/2019) (grifos nossos)
Nos termos do art. 20, § 1º, da Lei n. 8.742/93, com redação dada pela Lei n. 12.435/11, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.
Na situação de que se trata nos autos, o laudo socioeconômico (Id n. 404267122 – p. 282-287) indica que, por ocasião da avaliação social, a parte autora/apelante encontrava-se em situação de acentuada vulnerabilidade e necessitava do benefício pleiteado, na medida em que seu núcleo familiar – composto por ela e seu filho adulto – sobrevivia em casa simples cedida e com o auxílio material de terceiros, de modo que a assistente social responsável pela avaliação concluiu que “a requerente em questão vivencia situação de vulnerabilidade social, não possui renda nem meios de prover sua própria subsistência, atendendo ao critério econômico para fazer jus ao Benefício de Prestação Continuada – BPC, consideramos que a concessão do BPC contribuíra para suprir as necessidades básicas da requerente”.
Ressalte-se, porém, que, consoante se infere também do laudo socioeconômico, a assistente social não foi capaz de determinar o valor aproximado da renda familiar mensal, na medida em que não foram apresentados quaisquer comprovantes de renda, baseando-se suas conclusões somente nas declarações obtidas quando da visita social.
Por outro lado, em consulta ao Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS), constatam-se alguns dados importantes a respeito do contexto socioeconômico do caso.
Com efeito, verifica-se que a filha da parte autora/apelante – que, de acordo com o estudo social, auxilia em alguma medida sua mãe – reside no mesmo endereço e, desde setembro de 2023, está empregada e auferindo remuneração mensal que, ao longo do período, variou entre R$ 2.022,48 e R$ 3.395,40. Apesar disso, por ser casada, ela não pode ser considerada componente da família para fins de cálculo da renda familiar mensal per capita, em razão do que dispõe o § 1º do art. 20 da Lei n. 8.742/93.
No entanto, o mesmo não pode ser dito em relação ao filho da parte autora/apelante, que é solteiro, também reside no mesmo endereço e, desde 10 de julho de 2023, está trabalhando e auferindo remuneração mensal de R$ 2.000,00 (sendo conveniente destacar que, em diversos meses ao longo desse período, a remuneração mensal superou esse patamar).
Diante desse panorama, tem-se que o laudo socioeconômico confirma a condição de miserabilidade justificadora do deferimento do benefício assistencial almejado, mas apenas até 10 de julho de 2023, quando então a renda familiar mensal per capita do núcleo familiar da parte autora/apelante passou a superar significativamente o patamar de 1/4 (um quarto) do salário mínimo (art. 20, § 3º, da Lei n. 8.8742/93).
Portanto, considerando-se a presença dos pressupostos legais para a concessão do benefício assistencial de prestação continuada à pessoa com deficiência, ao menos até a data em que o filho da parte autora/apelante voltou a trabalhar, a sentença deve ser reformada.
No que é acessório:
a) O termo inicial do benefício, assim como os efeitos financeiros da condenação, deve ser fixado a partir da data do requerimento administrativo (20/10/2020), ao passo que a data de cessação deve ser estabelecida em 10 de julho de 2023, pelas razões anteriormente expostas.
b) Tendo em vista a tese fixada pelo STF, sob a sistemática da repercussão geral, no julgamento do Recurso Extraordinário n. 870.947/SE (tema n. 810), ocasião em que a maioria dos Ministros da Corte Suprema entendeu pelo afastamento da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública, a correção monetária deverá adotar o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E), mesmo para o período anterior à expedição do precatório ou da requisição de pequeno valor, considerando que tal índice foi eleito o mais adequado para recomposição do poder de compra. Quanto aos juros de mora, deverão ser observados os índices da remuneração da poupança, em conformidade com o art. 1º-F da Lei n. 9.494/97, com a redação dada pela Lei n. 11.960/09.
c) Honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data do acórdão, nos termos do art. 85 do CPC/2015 e em conformidade com o enunciado 111 da Súmula do STJ.
d) Nas causas ajuizadas perante a Justiça Federal, o INSS está isento de custas (inclusive despesas com oficial de justiça) por força do art. 4º, I, da Lei n. 9.289/96. A isenção se repete nos Estados onde houver lei estadual assim prescrevendo, a exemplo do que ocorre em Estados como Acre, Tocantins, Minas Gerais, Goiás, Rondônia e Piauí.
e) Em se tratando de verba alimentar e porque fortes os elementos evidenciadores da probabilidade do reconhecimento definitivo do direito postulado (art. 300 do CPC), é de ser deferida a tutela provisória de urgência para que se viabilize o pagamento dos valores devidos, devendo o INSS adotar tal providência no prazo de 30 (trinta) dias contados de sua intimação.
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO à apelação interposta pela parte autora, para reformar a sentença e julgar procedente o pedido, condenando o INSS a conceder-lhe o benefício assistencial de prestação continuada à pessoa com deficiência, desde a data do requerimento administrativo, mas com cessação na data em que seu filho voltou a laborar e, por conseguinte, a renda familiar mensal per capita do núcleo familiar da parte autora/apelante passou a superar expressivamente o patamar de 1/4 (um quarto) do salário mínimo (art. 20, § 3º, da Lei n. 8.8742/93).
É como voto.
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
GAB. 05 - DESEMBARGADOR FEDERAL RUI GONÇALVES
Processo Judicial Eletrônico
PROCESSO: 1004255-52.2024.4.01.9999
PROCESSO REFERÊNCIA: 1004009-25.2022.8.11.0037
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
APELANTE: ROSIMEIRE GOMES DA COSTA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
E M E N T A
ASSISTENCIAL E PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO DE AMPARO SOCIAL À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. ART. 203, V, CRFB/88. LEI 8.742/93. CONDIÇÃO DE PESSOA COM DEFICIÊNCIA COMPROVADA. REQUISITOS LEGAIS PREENCHIDOS. BENEFÍCIO DEVIDO. ALTERAÇÃO DA RENDA FAMILIAR MENSAL PER CAPITA NO CURSO DO PROCESSO. FIXAÇÃO DA DATA DE CESSAÇÃO DO BENEFÍCIO. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PROVIDA. SENTENÇA REFORMADA.
1. A questão em apreço diz respeito à verificação da existência do direito da parte autora à percepção do benefício assistencial de prestação continuada, que possui fundamento de validade constitucional no art. 203, V, da CRFB/88 e é disciplinado essencialmente pelo art. 20 da Lei n. 8.742/93, cujo caput estabelece o seguinte: “O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família” (redação dada pela Lei n.º 12.435, de 2011).
2. Extraem-se, também do art. 20 da Lei n. 8.742/93, os dois requisitos cumulativos para a concessão do supramencionado benefício assistencial: requisito subjetivo – exigência de que o postulante ao benefício seja pessoa com deficiência ou pessoa idosa com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais – e requisito socioeconômico – o requerente deve comprovar “não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família” (situação de “miserabilidade”), utilizando-se como critério de avaliação a renda familiar mensal per capita, que, de acordo com a literalidade do § 3º do art. 20 da Lei n. 8.742/93 e ao menos em regra, deve ser igual ou inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo. Tratando-se de requisitos cumulativos, a concessão do benefício demanda o cumprimento de ambos, de modo que a ausência de um deles prejudica a análise do outro.
3. De acordo com o § 14 do art. 20 da Lei n. 8.742/93, “[o] benefício de prestação continuada ou o benefício previdenciário no valor de até 1 (um) salário-mínimo concedido a idoso acima de 65 (sessenta e cinco) anos de idade ou pessoa com deficiência não será computado, para fins de concessão do benefício de prestação continuada a outro idoso ou pessoa com deficiência da mesma família, no cálculo da renda a que se refere o § 3º deste artigo”. Ademais, segundo o § 15 do mesmo dispositivo legal, “[o] benefício de prestação continuada será devido a mais de um membro da mesma família enquanto atendidos os requisitos exigidos nesta Lei”.
4. Em consonância com a jurisprudência dos Tribunais Superiores (STF, Tribunal Pleno, RE n. 567.985 e 580.963; STJ, 3ª Seção, REsp n. 1.112.557/MG, Tema Repetitivo n. 185), este Tribunal Regional Federal reconhece que o patamar legal de um quarto do salário mínimo corresponde a padrão mínimo para reconhecimento da miserabilidade, sendo que a carência econômica pode ser aferida no caso concreto por critérios diversos, ainda que superado tal patamar (TRF-1ª Região, 2ª Turma, AC n. 0014219-47.2013.4.01.9199, Relator Desembargador Federal João Luiz de Souza, e-DJF1 27/05/2019).
5. No que tange ao requisito subjetivo, o juízo a quo entendeu que “restou demonstrado, através do laudo pericial que a parte autora não está totalmente incapacitada para o exercício de atividades laborativas, de modo que constato que a parte requerente não faz jus ao benefício assistencial de prestação continuada, nos termos da Lei nº 8.742/93 c/c artigo 203, V, da Constituição Federal, haja vista que não foram preenchidos os requisitos legais”.
6. Não parece, porém, a conclusão mais adequada, pois, conforme se depreende do laudo médico-pericial, a parte autora/apelante é, há mais de 7 (sete) anos, portadora de “espondiloartrose lombar, lordose cervical, espondiloartrose cervical, dispneia sibilante (CID J 45.9, CID 10 M50.1), bem como de transtorno do disco cervical com radiculopatia e CID M54. 4 – Lumbago com ciática se caracteriza por dor intermitente na coluna lombar”, quadro de origem multifatorial, degenerativa e com provável concausa por anos de trabalho braçal, encontrando-se, por conseguinte, parcial e permanentemente incapacitada, com prejuízo funcional da coluna cervical/lombar e respiratória, razões pelas quais o médico perito concluiu categoricamente pela existência de deficiência/impedimento de longo prazo para o exercício de suas atividades habituais ou de quaisquer atividades que lhe garantam subsistência.
7. É fundamental frisar, nesse particular, que, desde o advento da Lei n. 12.470/11 (que alterou a redação do § 2º do art. 20 da Lei n. 8.742/93), para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência não aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho, mas sim “aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas”, nos termos da redação atual do dispositivo, dada pela Lei n. 13.146/15.
8. Destaque-se, nesse sentido, o enunciado 48 da Súmula da Turma Nacional de Uniformização: “Para fins de concessão do benefício assistencial de prestação continuada, o conceito de pessoa com deficiência, que não se confunde necessariamente com situação de incapacidade laborativa, exige a configuração de impedimento de longo prazo com duração mínima de 2 (dois) anos, a ser aferido no caso concreto, desde o início do impedimento até a data prevista para a sua cessação”.
9. Comprovada, portanto, a condição de pessoa com deficiência, nos termos do art. 20, 2º, da Lei n. 8.742/93 e com suporte no laudo médico-pericial antes referido, que não destoa dos demais elementos componentes do acervo probatório reunido nos autos, notadamente, dos documentos médicos apresentados pela parte autora/apelante.
10. Por outro lado, o laudo socioeconômico indica que, por ocasião da avaliação social, a parte autora/apelante encontrava-se em situação de acentuada vulnerabilidade e necessitava do benefício pleiteado, na medida em que seu núcleo familiar – composto por ela e seu filho adulto – sobrevivia em casa simples cedida e com o auxílio material de terceiros, de modo que a assistente social responsável pela avaliação concluiu que “a requerente em questão vivencia situação de vulnerabilidade social, não possui renda nem meios de prover sua própria subsistência, atendendo ao critério econômico para fazer jus ao Benefício de Prestação Continuada – BPC, consideramos que a concessão do BPC contribuíra para suprir as necessidades básicas da requerente”. Ressalte-se, porém, que, consoante se infere também do laudo socioeconômico, a assistente social não foi capaz de determinar o valor aproximado da renda familiar mensal, na medida em que não foram apresentados quaisquer comprovantes de renda, baseando-se suas conclusões somente nas declarações obtidas quando da visita social.
11. Ademais, em consulta ao Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS), constatam-se alguns dados importantes a respeito do contexto socioeconômico do caso. Com efeito, verifica-se que a filha da parte autora/apelante – que, de acordo com o estudo social, auxilia em alguma medida sua mãe – reside no mesmo endereço e, desde setembro de 2023, está empregada e auferindo remuneração mensal que, ao longo do período, variou entre R$ 2.022,48 e R$ 3.395,40. Apesar disso, por ser casada, ela não pode ser considerada componente da família para fins de cálculo da renda familiar mensal per capita, em razão do que dispõe o § 1º do art. 20 da Lei n. 8.742/93. No entanto, o mesmo não pode ser dito em relação ao filho da parte autora/apelante, que é solteiro, também reside no mesmo endereço e, desde 10 de julho de 2023, está trabalhando e auferindo remuneração mensal de R$ 2.000,00 (sendo conveniente destacar que, em diversos meses ao longo desse período, a remuneração mensal superou esse patamar).
12. Diante desse panorama, tem-se que o laudo socioeconômico confirma a condição de miserabilidade justificadora do deferimento do benefício assistencial almejado, mas apenas até 10 de julho de 2023, quando então a renda familiar mensal per capita do núcleo familiar da parte autora/apelante passou a superar significativamente o patamar de 1/4 (um quarto) do salário mínimo (art. 20, § 3º, da Lei n. 8.8742/93).
13. Apelação da parte autora provida, para reformar a sentença e julgar procedente o pedido, condenando o INSS a conceder-lhe o benefício assistencial de prestação continuada à pessoa com deficiência, desde a data do requerimento administrativo, mas com cessação na data em que seu filho voltou a laborar e, por conseguinte, a renda familiar mensal per capita do núcleo familiar da parte autora/apelante passou a superar expressivamente o patamar de 1/4 (um quarto) do salário mínimo (art. 20, § 3º, da Lei n. 8.8742/93).
15. Honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data do acórdão, nos termos do art. 85 do CPC/2015 e em conformidade com o enunciado 111 da Súmula do STJ.
16. Concedida a tutela provisória de urgência, para que se viabilize o pagamento dos valores devidos no prazo de 30 (trinta) dias.
A C Ó R D Ã O
Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, dar provimento à apelação interposta pela parte autora, nos termos do voto do relator.
Brasília/DF, data da assinatura eletrônica.
Desembargador Federal RUI GONÇALVES
Relator