
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:ROSALIA DE SOUZA SENA
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: MARCELO RODRIGUES SILVA - BA67108-A e LUCIANA VILLAS BOAS MARTINS BANDECA - SP213927-A
RELATOR(A):URBANO LEAL BERQUO NETO

PROCESSO: 1013884-11.2023.4.01.0000 PROCESSO REFERÊNCIA: 0000195-32.2011.8.05.0277
CLASSE: APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728)
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:ROSALIA DE SOUZA SENA
REPRESENTANTES POLO PASSIVO: MARCELO RODRIGUES SILVA - BA67108-A e LUCIANA VILLAS BOAS MARTINS BANDECA - SP213927-A
RELATÓRIO
O Excelentíssimo Desembargador Federal Urbano Leal Berquó Neto (Relator):
Trata-se de remessa oficial e de apelação interposta pelo INSS em face de sentença que julgou procedente o pedido de concessão de benefício de aposentadoria por idade de trabalhadora rural, com DIB na data da citação válida, e condenação ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% sobre as parcelas vencidas.
Em suas razões, requer a reforma da sentença para que seja julgado improcedente o pedido ao argumento de inexistência de início de prova material idônea do labor rural e de existência de provas que afastam a qualidade de segurada especial da autora.
A apelada, devidamente intimada, apresentou contrarrazões.
É o relatório.

PROCESSO: 1013884-11.2023.4.01.0000 PROCESSO REFERÊNCIA: 0000195-32.2011.8.05.0277
CLASSE: APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728)
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:ROSALIA DE SOUZA SENA
REPRESENTANTES POLO PASSIVO: MARCELO RODRIGUES SILVA - BA67108-A e LUCIANA VILLAS BOAS MARTINS BANDECA - SP213927-A
V O T O
O Excelentíssimo Desembargador Federal Urbano Leal Berquó Neto (Relator):
Não se dá cognição à remessa necessária, pois embora ilíquida a sentença, a condenação não ultrapassará os mil salários-mínimos, o que afasta o duplo grau.
Lado outro, estão presentes os pressupostos recursais do apelo voluntário e dele conheço.
Diante da inexistência de preliminares ou/e defesa indireta de mérito, mister a depuração, de pronto, do cerne da pretensão, ora vertida em base recursal, lembrando que se trata de conflito de interesses condizente à aposentadoria rural.
Nada obstante o ditame do art. 38-B, § 1º, da Lei nº 8.213/1991 rezar que “a partir de 1º de janeiro de 2023, a comprovação da condição e do exercício da atividade rural do segurado especial ocorrerá, exclusivamente, pelas informações constantes do cadastro a que se refere o art. 38-A desta Lei” - sendo que o aludido repositório é o Cadastro Nacional de Informações Sociais, CNIS -, admite-se, para momentos anteriores de labor o uso de outras modalidades probatórias (art. cit, § 2º). Tal se mostra compreensível dada a precariedade da inserção efetiva de elementos testificadores de trabalho campesino a quem o desenvolve, sobretudo quando se tratar de exercício da atividade em localidades afastadas, insertas a grandes distâncias dos centros urbanos.
Consignada dita premissa, convém destacar que a jurisprudência admite como requisitos para a aposentadoria rural: 1) a idade (se homem 60 anos e se mulher 55 anos, conforme art. 201, § 7º, II, da Lei Maior e art. 48,§ 1º, da Lei nº 8213/91); 2) a carência (arts. 48, 142 e 143 todos da Lei de Benefícios da Previdência Social). Nesta trilha conferir, todos do STJ e da lavra do Min. Herman Benjamin: REsp1803581, 2ª T, DJE de 18/10/2019; AREsp 1539221, 2ª T, DJE 11/10/2019; AREsp 1539106, 2ª T, DJE 11/10/2019; e AREsp 1538240, 2ª T. DJE 11/10/2019.
De outra perspectiva, não se olvide que o(a) trabalhador(a) deve permanecer “...nas lides campesinas até o momento imediatamente anterior ao requerimento ou até às vésperas do preenchimento do requisito etário(...”), pois, o STJ, através da Primeira Seção, no julgamento do REsp. 1.354.908/SP, sob o rito do art. 543-C do CPC, DJe 10/02/2016, Rel. Min. MAURO CAMBPELL MARQUES, consolidou o entendimento no sentido de que apenas se revela possível excetuar a regra que impõe o exercício de atividade rural até o momento imediatamente anterior ao requerimento administrativo na hipótese em que o segurado tenha desenvolvido seu mister no campo pelo número de meses correspondente ao exigido para fins de carência, até o momento em que implementado o requisito etário. Trata-se de resguardar o direito adquirido daquele que, não obstante o cumprimento dos requisitos necessários, não tenha requerido, de imediato, a aposentadoria rural por idade”. (AIREsp 1786781, STJ, Rel. Min. Sergio Kukina, 1ª T, DJE de 02/09/2019).
No caso dos autos, a sentença de primeira instância reconheceu a faina rural exercida pelo autor levando em consideração a instrução do processo com início de prova material do efetivo labor campesino, o que, corroborado pela prova testemunhal, seria suficiente para a comprovação da alegada condição de segurado especial pelo período de carência necessário a concessão do benefício.
A controvérsia recursal, portanto, reside na comprovação ou não do exercício de atividade rural pelo período de carência necessário para fazer jus ao recebimento do benefício (180 meses imediatamente anterior ao adimplemento do requisito etário ou imediatamente anterior a DER).
No que tange à caracterização da condição de segurado especial, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de Incidente de Uniformização de Jurisprudência, firmou o entendimento de que para o reconhecimento do tempo de serviço do trabalho rural, apesar de não haver exigência legal de que o documento apresentado como início de prova material abranja todo o período que se busca comprovar, é preciso que tal prova seja contemporânea ao menos por uma fração do lapso de trabalho rural pretendido (Pet 7.475/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 09/11/2016, DJe 29/11/2016).
Daí porque inexistindo início de prova material, a simples alegação da parte interessada aliada ao depoimento das testemunhas não são capazes de comprovar o desempenho do labor rural. Nesse sentido é o verbete Sumular nº 149/STJ: “A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário”.
Portanto, o reconhecimento da qualidade de segurado especial, trabalhador rural, desafia o preenchimento dos requisitos fundamentais da existência de início de prova material da atividade rural exercida e a corroboração dessa prova indiciária por robusta prova testemunhal.
Sobre os documentos admitidos como prova material, é pacífica a jurisprudência do STJ e desta Corte no sentido de que o rol do art. 106 da Lei 8.213/91 é meramente exemplificativo, (STJ AgRG no REsp 1073730/CE) sendo admissíveis, portanto, outros documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, além dos ali previstos.
No caso dos autos, a autora implementou o requisito etário para aposentadoria rural no ano de 2008 (nascida em 4/7/1953), razão pela qual para fazer jus ao benefício deve comprovar carência pelo período de 162 meses imediatamente anterior ao adimplemento do requisito etário ou da DER, ocorrida em 25/10/2019.
Assim, considerando o conjunto probatório dos autos, verifica-se que a autora juntou documentos suficientes para provar sua atividade campesina. Dentre os documentos trazidos pela autora destacam-se: ITR do ano de 2001 do Sitio Silva, em nome de Valmir Alves da Silva e declaração em nome de Valmir que recebeu sementes do Programa de distribuição de sementes do Governo do Estado da Bahia datado em 2001.
Importante registrar que o segurado especial, para efeitos de aposentadoria e outros benefícios previdenciários, é conceito que engloba o trabalhador rural diarista, safrista ou boia-fria, assim como o pequeno proprietário de área rural que exerce sua atividade em regime de economia familiar, explorando diretamente a terra para a garantia do sustento da família.
Com efeito, diante das dificuldades enfrentadas pelos trabalhadores rurais para comprovar o exercício de atividade rurícola, em razão das peculiaridades inerentes ao meio campestre, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem adotado a solução pro mísero, em que se admite a prova testemunhal para demonstrar a qualidade de segurado, desde que acompanhada de início de prova material.
E nesse ponto, registra-se que a testemunha afirmou, que conhece a autora desde 1995. Afirmou também que durante todo o tempo que conhece a autora ela sempre trabalhou no meio rural, plantando e colhendo para sobreviver, trabalhou na roça no Rio verde, trabalhou sempre no meio rural não tendo outra atividade, e tendo se mudado para o meio urbano por conta de uma doença na coluna que a impossibilitou de trabalhar.
É de se salientar que “...para o reconhecimento do labor agrícola é desnecessário que o início de prova material seja contemporâneo a todo o período de carência exigido, desde que a eficácia daquele (início) seja ampliada por prova testemunhal” (AIREsp 1579587, STJ, 1ª T, Min. Gurgel de Faria, DJE 21/09/217), situação externada no particular.
Portanto, tendo havido confirmação por testemunhas, não há que se falar em insuficiência da prova material. Neste sentido:
..EMEN: PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. VOTO-VISTA DO MIN. MAURO CAMPBELL MARQUES. ALINHAMENTO COM A POSIÇÃO DO NOBRE COLEGA. APOSENTADORIA POR IDADE. ATIVIDADE RURAL. INÍCIO RAZOÁVEL DE PROVA MATERIAL RECONHECIDO PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS E CORROBORADO POR PROVA TESTEMUNHAL. VALORAÇÃO DO CONJUNTO PROBATÓRIO. POSSIBILIDADE. ÓBICE DA SÚMULA 7/STJ AFASTADO. 1. A controvérsia gira em torno do preenchimento dos requisitos para a concessão de pensão por morte à autora. 2. A jurisprudência do STJ se mostra firme no sentido de que o reconhecimento de tempo de serviço rurícola exige que a prova testemunhal corrobore um início razoável de prova material, sendo certo que o rol de documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, inscrito no art. 106, parágrafo único, da Lei 8.213/1991, é meramente exemplificativo, e não taxativo. 3. Segundo a orientação do STJ, as certidões de nascimento, casamento e óbito, bem como certidão da Justiça Eleitoral, carteira de associação ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais, ficha de inscrição em Sindicato Rural, contratos de parceria agrícola, podem servir como início da prova material nos casos em que a profissão de rurícola estiver expressamente mencionada desde que amparados por convincente prova testemunhal. Precedentes: AgRg no AREsp 577.360/MS, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 22/6/2016, e AR 4.507/SP, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, Terceira Seção, DJe 24/8/2015. 4. O acórdão recorrido concluiu desconsiderar as provas materiais, afastando a decisão do juízo sentenciante que presidiu a instrução do feito, que bem valorou as provas ao ter estabelecido contato direto com as partes, encontrando-se em melhores condições de aferir a condição de trabalhador rural afirmada pelo autor e testemunhas ouvidas. 5. O juízo acerca da validade e eficácia dos documentos apresentados como o início de prova material do labor campesino não enseja reexame de prova, vedado pela Súmula 7/STJ, mas sim valoração do conjunto probatório existente. Precedentes: AgRg no REsp 1.309.942/MG, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe 11/4/2014, e AgRg no AREsp 652.962/SP, Rel. Min. Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 3/9/2015. 6. Recurso Especial provido. ..EMEN:
(RESP - RECURSO ESPECIAL - 1650326 2017.00.05876-0, HERMAN BENJAMIN, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:30/06/2017 ..DTPB:.)
Sobre a residência do autor, “o fato de a parte autora possuir endereço urbano não descaracteriza a sua qualidade de segurada especial, uma vez que a própria redação do inciso VII do art. 11 da Lei n. 8.213/91 prevê expressamente que o trabalhador rural pode residir (...) no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural próximo a ele. (TRF1, AC n. 0051395-26.2014.4.01.9199/BA, Relator Juíza Federal Renata Mesquita Ribeiro Quadros, 1ª Câmara Regional Previdenciária da Bahia, e-DJF1 28/04/2022).
Quanto a acumulação da pensão por morte com a aposentadoria rural, cumpre salientar que, por se tratar de espécies distintas de benefícios previdenciários, inexiste vedação legal para tanto (art. 124, da Lei 8.213/91). Ademais, o fato da pensão por morte urbana do ex-cônjuge da autora, não descaracteriza a qualidade de segurado especial dela, visto que continuou residindo em meio rural e exercendo as mesmas atividades rurais com o novo companheiro.
Neste sentido, confiram-se os seguintes precedentes:
"RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. RURÍCOLA. PENSÃO POR MORTE. APOSENTADORIA POR VELHICE. CUMULAÇÃO. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. 1. A Terceira Seção desta Corte tem entendimento assente no sentido de que, em decorrência da relevância da questão social e do caráter benéfico da Lei nº 8.213/91, é legítima a acumulação de aposentadoria e benefício de natureza rural. 2. Recurso conhecido." (REsp 425.239/RS, Rel. Ministro FERNANDO GONÇALVES, DJU de 02.09.2002)
"PREVIDENCIÁRIO. RURÍCOLA. PENSÃO POR MORTE. CUMULAÇÃO COM APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. POSSIBILIDADE. RECURSO ESPECIAL. 1. Por apresentarem fatos geradores diversos e pressupostos básicos também distintos, plenamente cumuláveis tais benefícios previdenciários. 2. Recurso conhecido e provido." (REsp 268.254/RS, Rel. Ministro EDSON VIDIGAL, DJU de 04.02.2002)
Assim, o conjunto probatório revela o exercício do labor rural, bem como o cumprimento da carência prevista no art. 142 da Lei n. 8.213/91. Portanto, atendidos os requisitos indispensáveis à concessão do benefício previdenciário - início de prova material apta a demonstrar a condição de rurícola da autora, corroborada por prova testemunhal, e idade mínima, é devido o benefício de aposentadoria por idade rural.
Posto isto, NEGO PROVIMENTO AO RECURSO interposto pelo INSS e não conheço da remessa oficial, nos termos da fundamentação supra.
É como voto.
Desembargador Federal URBANO LEAL BERQUÓ NETO
Relator

PROCESSO: 1013884-11.2023.4.01.0000 PROCESSO REFERÊNCIA: 0000195-32.2011.8.05.0277
CLASSE: APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728)
POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:ROSALIA DE SOUZA SENA
REPRESENTANTES POLO PASSIVO: MARCELO RODRIGUES SILVA - BA67108-A e LUCIANA VILLAS BOAS MARTINS BANDECA - SP213927-A
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. PENSÃO POR MORTE. CUMULAÇÃO. POSSIBILIDADE. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO POR PROVA TESTEMUNHAL. ROL DO ART. 106 DA LEI 8.213/91 É MERAMENTE EXEMPLIFICATIVO. REQUISITOS PREENCHIDOS. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO IMPROVIDO. REMESSA OFICIAL NÃO CONHECIDA.
1. São requisitos para aposentadoria do trabalhador rural: contar 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondentes à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei 8.213/91).
2. In casu, a autora implementou o requisito etário para aposentadoria rural no ano de 2008 (nascida em 4/7/1953), razão pela qual para fazer jus ao benefício deve comprovar carência pelo período de 162 meses imediatamente anterior ao adimplemento do requisito etário ou da DER, ocorrida em 25/10/2019.
3. Considera-se provada a atividade rural do segurado especial mediante prova material complementado por idônea prova testemunhal, restando suficientemente comprovada à atividade campesina da autora no número de meses necessários ao cumprimento da carência, razão pela qual o benefício lhe é devido.
4. A aposentadoria rural e a pensão por morte são espécies de benefícios previdenciários distintas. Não há vedação legal que impossibilite sua cumulação, tanto em virtude de sua natureza, como de sua origem. Precedentes.
5. Remessa oficial não conhecida. Apelação a que se nega provimento.
A C Ó R D Ã O
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, por unanimidade, NEGAR PROVIMENTO à apelação interposta e não conhecer da remessa necessária, nos termos do voto do relator.
Desembargador Federal URBANO LEAL BERQUÓ NETO
Relator