
POLO ATIVO: MARIA CAVALCANTE AMBROZIO
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: CHIARA SANTANA FERREIRA DE OLIVEIRA - BA30784-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):NILZA MARIA COSTA DOS REIS
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
APELAÇÃO CÍVEL (198)1021252-47.2023.4.01.9999
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
Trata-se de apelação interposta pela parte autora de sentença na qual foi julgado improcedente o pedido de concessão de aposentadoria de trabalhador rural, por idade (fls.24/28).1
Nas suas razões, a parte apelante pugna pela reforma da sentença para que seja julgado procedente o seu pedido, sustentando haver implementado os requisitos legais necessários a obtenção do benefício (fls. 07/19).
Sem contrarrazões.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS (RELATORA):
O recurso reúne os requisitos de admissibilidade, merecendo, portanto, ser conhecido.
MÉRITO
Da aposentadoria rural, por idade.
Nos termos do art. 48 da Lei nº 8.213/91, a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural exige a demonstração da atividade campesina, cumprindo-se o prazo de carência previsto no artigo 142 da Lei nº 8.213/91, mediante prova documental plena ou, ao menos, um início razoável de prova material, corroborada por prova testemunhal. Como requisito etário, a lei exige a idade superior a 60 (sessenta) anos para o homem e 55 (cinquenta e cinco) anos para a mulher.
Da carência
Esse requisito deve ser cumprido em período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, consoante decidido pelo Superior Tribunal de Justiça em sede de recurso repetitivo (Tema 642), cuja tese ficou assim redigida:
“O segurado especial tem que estar laborando no campo quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer o benefício. Ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos carência e idade” (REsp 1.354.908 SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 09/09/2015, DJe 10/02/2016).
Do regime de economia familiar
Nos termos do art. 11 da Lei do Regime Geral da Previdência Social, considera-se trabalho rural em regime de economia familiar a atividade campesina em que o labor dos membros da família é indispensável à própria subsistência e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes.
Das provas
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou orientação no sentido de que, diante da dificuldade do segurado especial na obtenção de prova escrita do exercício de sua profissão, o rol de documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, inscrito no art. 106, parágrafo único, da Lei 8.213/1991, é meramente exemplificativo, e não taxativo, sendo admissíveis outros documentos além dos previstos no mencionado dispositivo, inclusive aqueles que estejam em nome de membros do grupo familiar (REsp n. 1.354.908/SP, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 9/9/2015, DJe de 10/2/2016).
A Primeira Seção da Corte Superior sedimentou entendimento, inclusive sob a sistemática do art. 543-C do Código de Processo Civil, acerca da possibilidade de extensão da eficácia probatória da prova material, tanto para o período anterior quanto para o período posterior à data do documento apresentado, desde que corroborada por robusta prova testemunhal (Súmula n. 577/STJ), não admitindo, nos termos da Súmula 149, a prova exclusivamente testemunhal (AgInt no REsp n. 1.949.509/MS, relatora Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, julgado em 14/2/2022, DJe de 17/2/2022.).
Do caso em exame.
A parte autora, nascida em 28/06/1960, implementou o requisito etário em 06/12/2015 (55 anos), tendo formulado o seu requerimento administrativo em04/07/2022.
Para a comprovação da qualidade de segurado e carência, foram apresentados, os seguintes documentos: Cópia do ITRs no nome do genitor da parte autora, exercícios 1997, 1999, 2001, 2002, 2003, 2005 a 2008, 2011 e 2016 a 2020, relativos à uma área de 3,0 há denominado Sítio Cumbe do Gato e cópia de Título Definitivo do Imóvel Rural.
Aliado a tais elementos, foram tomados os depoimentos das testemunhas, as quais confirmaram, de forma segura e convincente, o labor rural desenvolvido pela parte autora. Sobre os depoimentos colhidos em Juízo assim restou consignado na sentença:“A testemunha MARIA ALVES DAMASCENA CAVALCANTE. Foi dito QUE conhece a autora desde pequena. QUE a autora não é casada. QUE os filhos da autora foram criados na Bahia e foram para São Paulo depois de maiores. QUE a autora trabalha na roça do pai. QUE a autora passa curtos períodos em São Paulo para cuidar da saúde, mas mora na Lagoa do Junco. QUE a autora tem nove irmãos. QUE a terra tem 3 hectares. QUE a autora trabalha em uma tarefa. QUE a autora vive da atividade rural e de ajuda dos filhos. MARIA CAVALCANTE. Foi dito QUE conhece a autora desde criança. QUE a autora vive no Povoado lagoa do Junco. QUE sempre vai a São Paulo visitar os filhos. QUE a autora mora com a mãe, aposentada. QUE vive do plantio de roça. QUE um mês ou dois quando precisa realizar exames. QUE nunca morou definitivamente em São Paulo. QUE planta em uma tarefa, mas a roça tem 3 hectares. QUE a autora trabalha com um irmão. QUE a requerente tem 9 irmãos e só um trabalha na roça. QUE os filhos da autora foram morar em São Paulo depois que eram adultos.
Assim, a documentação trazida aos autos é suficiente e serve como início robusto de prova material, para demonstrar o efetivo exercício da atividade rural pela autora, durante o prazo da carência legalmente exigido.
Cumpre frisar, ainda, que o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento, no sentido de que é perfeitamente aceitável a utilização de documentos de terceiros como início de prova material para a comprovação do tempo de atividade rural, não sendo necessário que o início de prova documental abranja todo o período de carência, sobretudo quando a prova testemunhal é suficiente para corroborar o deferimento da aposentadoria.
“... Os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando dos pais ou cônjuge, consubstanciam início de prova material do labor rural..." (STJ -AREsp: 1239717 RS2018/0019782-4, Rel. Ministra ASSUSENTE MAGALHÃES, data de publicação: DJ 02/03/2018.
Nesse mesmo sentido, vale ainda conferir o seguinte precedente deste egrégio TRF – 1ª Região:
PREVIDENCIÁRIO.APOSENTADORIA POR IDADE.SEGURADO ESPECIAL.APOSENTADORIA RURAL.INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO POR PROVA ORAL FAVORÁVEL.INÍCIO DE PROVA MATERIAL DOS GENITORES.POSSIBILIDADE DE EXTENSÃO.ADEQUAÇÃO, DE OFÍCIO, DOS JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA.ENTENDIMENTO DOS TRIBUNAIS SUPERIORES.
1. A concessão do benefício de aposentadoria por idade (trabalhador rural), conforme disposto nos arts.48,§§ 1ºe2º, e143da Lei8.213/91, condiciona-se à verificação do requisito etário, 60 anos para homens e 55 anos para mulheres, associado à demonstração do efetivo exercício da atividade rural por tempo equivalente ao da carência do benefício pretendido (180 contribuições mensais), observada a regra de transição prevista no art.142do mencionado diploma legal, desde que o período seja imediatamente anterior à data do requerimento, ainda que o serviço tenha sido prestado de forma descontínua.
2. Tratando-se de trabalhador rural, a concessão do benefício está subordinada à comprovação da atividade rural exercida pelo período de carência, mediante início razoável de prova material, coadjuvada de prova testemunhal coerente e robusta, ou prova documental plena, não sendo admissível a prova exclusivamente testemunhal.
3. Não se pode olvidar ainda que deve ser considerado o aspecto social subjacente aos benefícios previdenciários destinados aos segurados especiais, no sentido de se evitar rigor excessivo na análise dos documentos comprobatórios da atividade rural, sob pena de inviabilizar a própria proteção social prevista na norma, em razão das limitações próprias do meio e formação daqueles trabalhadores.
4. Forçoso convir, portanto, que é a análise global do conjunto probatório, cotejado com as impressões colhidas pelo juiz sentenciante em audiência (que identifica a postura, fala e características próprias de segurado especial, bem como o próprio conhecimento do labor rural), que permite entrever o verdadeiro valor do início de prova material acostado aos autos. Por outro modo de dizer, a extensão da eficácia probatória do documento depende de seu exame conjunto com a prova testemunhal complementar convincente e harmônica, bem como com as impressões pessoais colhidas pelo juiz em audiência.
5. No caso dos autos, a parte autora completou 55 anos em 2002, correspondendo ao período de carência, portanto, há 126 meses, tendo apresentado, ainda, requerimento administrativo em 15/10/2013.
6. A parte autora colacionou aos autos, de relevante, os seguintes documentos: Certidão de Nascimento do seu irmão ocorrido em 12/01/1971 à fl. 17, que qualifica o genitor da autora como "agricultor" e Título de Propriedade datada em 16/03/1967 à fl. 19 em nome do genitor da autora.
7. No ponto, importante destacar o entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça no sentido de que "...Os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando dos pais ou cônjuge, consubstanciam início de prova material do labor rural..." (STJ -AREsp: 1239717 RS2018/0019782-4, Rel. Ministra ASSUSENTE MAGALHÃES, data de publicação: DJ 02/03/2018.
8. Sobre as parcelas pretéritas deve incidir correção monetária de acordo com o Manual de Cálculos da Justiça Federal, além de juros moratórios, estes desde a citação quanto às diferenças a ela anteriores, e, em relação às vencidas posteriormente, a partir de cada mês de referência, conforme o referido manual, cujos parâmetros se harmonizam com a orientação que se extrai do julgamento doRE 870.947/SE(Tema 810 da repercussão geral) e do REsp Rep. 1.495.146-MG (Tema 905).
9. Apelação do INSS desprovida. Determina-se ainda, ex officio, a alteração do regime de correção monetária e de juros moratórios. (AC 0019193-59.2015.4.01.9199, JUÍZA FEDERAL OLÍVIA MERLIN SILVA, 1ª CÂMARA REGIONAL PREVIDENCIÁRIA DA BAHIA, e-DJF108/10/2020)
Assim sendo, restando demonstrada a condição de segurado especial rural durante o período de carência, conforme previsão do art. 142 da Lei 8.213/91, a parte autora faz jus ao benefício de aposentadoria rural, por idade, correspondente a um salário mínimo, nos termos da sentença.
Dos acessórios
O termo inicial do benefício deve ser fixado a partir do requerimento administrativo, e, na sua ausência, a partir da citação, conforme definição a respeito do tema em decisão proferida pelo e. STJ, em sede de recurso representativo de controvérsia, respeitados os limites do pedido inicial e da pretensão recursal, sob pena de violação ao princípio dano reformatio in pejus.
No caso, o respectivo termo inicial deve coincidir com a data do requerimento administrativo (04/07/2022), conforme art.49, inciso II, da Lei n.º8.213/91.
As parcelas vencidas devem ser corrigidas monetariamente pelo INPC e acrescidas de juros moratórios conforme Manual de Cálculos da Justiça Federal, que se encontra atualizado nos termos do julgamento proferido pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº 870.947-SE, em sede de repercussão geral e pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp 1.495.146/MG (Tema 905).
Honorários advocatícios em favor da parte autora, fixando-se em 10% (dez por cento) sobre o valor das diferenças vencidas até a data da prolação deste acórdão, a teor do disposto no art. 85, §§ 2º e 3º e 11 do CPC.
Ante o exposto, dou provimento à apelação para reformar a sentença e condenar o INSS à obrigação de conceder o benefício da aposentadoria rural, por idade, à parte autora, nos termos do voto.
É como voto.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
DESEMBARGADORA FEDERAL NILZA REIS
RELATORA
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
Gab. 27 - Desembargadora Federal Nilza Reis
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APELAÇÃO CÍVEL (198)1021252-47.2023.4.01.9999
MARIA CAVALCANTE AMBROZIO
Advogado do(a) APELANTE: CHIARA SANTANA FERREIRA DE OLIVEIRA - BA30784-A
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. PREVIDENCIÁRIO. IDADE E ATIVIDADE RURAL COMPROVADAS. INÍCIO DE PROVA MATERIAL DO GENITOR CORROBORADO POR PROVA TESTEMUNHAL. SENTENÇA REFORMADA. BENEFÍCIO CONCEDIDO.
1. São requisitos para aposentadoria de trabalhador rural: contar 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, e 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondentes à carência do benefício pretendido (art. 48, §§ 1º e 2º, da Lei 8.213/91).
2. Na hipótese, constata-se que a parte autora atingiu a idade mínima e cumpriu o período equivalente ao prazo de carência exigidos em lei. O início razoável de prova material, representado pelos documentos catalogados à inaugural, corroborado por prova testemunhal idônea e inequívoca, comprova a condição de segurado especial da parte autora.
3. A jurisprudência entende que os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando dos pais ou cônjuge, consubstanciam início de prova material do labor rural..." (STJ -AREsp: 1239717 RS2018/0019782-4, Rel. Ministra ASSUSENTE MAGALHÃES, data de publicação: DJ 02/03/2018.
4. O termo inicial deve ser fixado a partir do requerimento administrativo, conforme art.49, inciso II, da Lei n.º8.213/91.
5. Honorários advocatícios em favor da parte autora, fixando-se em 10% (dez por cento) sobre o valor das diferenças vencidas até a data da prolação deste acórdão, a teor do disposto no art. 85, §§ 2º e 3º e 11 do CPC.
6. Juros de mora e correção monetária nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal, em sua versão mais atualizada.
7. Apelação provida para reformar a sentença, condenando o INSS a conceder à parte autora o benefício da aposentadoria rural por idade.
ACÓRDÃO
Decide a Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação, nos termos do voto da relatora.
Brasília, data da assinatura eletrônica.
Desembargadora Federal NILZA REIS Relatora