
POLO ATIVO: EDMEA DE ALMEIDA RAMOS SANTOS
REPRESENTANTE(S) POLO ATIVO: LAINA TAINA PRAZERES CONCEICAO - BA60490-A
POLO PASSIVO:INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATOR(A):MARCELO VELASCO NASCIMENTO ALBERNAZ
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) 1046456-20.2023.4.01.0000
AGRAVANTE: EDMEA DE ALMEIDA RAMOS SANTOS
Advogado do(a) AGRAVANTE: LAINA TAINA PRAZERES CONCEICAO - BA60490-A
AGRAVADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
Trata-se de agravo de instrumento interposto por Edmea de Almeida Ramos Santos em face de decisão proferida pelo Juízo da 12ª Vara Federal Cível da SJBA que, acatando parecer do Ministério Público Federal, ordenou a juntada aos autos da ação de concessão de benefício de assistência à pessoa com deficiência nº 1087118-88.2021.4.01.3300, do termo de curatela, ou a comprovação do ajuizamento de ação de interdição.
Alega, em síntese, que a curatela é medida extraordinária, consiste num encargo pelo qual o curador se compromete a cuidar e proteger um indivíduo que não pode se autodeterminar patrimonialmente por conta de uma incapacidade, o absolutamente incapaz. E que, no caso em tela, a perícia deixa claro que a agravante possui condições, apesar da deficiência, de administrar atos da vida civil. Logo, tal medida não é necessária.
Requer seja dado provimento ao recurso para modificar a decisão agravada e determinar desnecessário o termo de curatela com o respectivo o prosseguimento do feito na forma da lei.
Sem contrarrazões.
É o relatório.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) 1046456-20.2023.4.01.0000
AGRAVANTE: EDMEA DE ALMEIDA RAMOS SANTOS
Advogado do(a) AGRAVANTE: LAINA TAINA PRAZERES CONCEICAO - BA60490-A
AGRAVADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ (RELATOR):
O direito ao benefício assistencial, previsto no art. 203, V, da Constituição Federal e nos arts. 20 e 21 da Lei 8.742/93 (Lei Orgânica da Assistência Social - LOAS), pressupõe o preenchimento de dois requisitos: a) condição de pessoa com deficiência ou idosa (com mais de 65 anos) e b) situação de risco social, ou seja, de miserabilidade ou de desamparo.
O referido art. 20 da LOAS detalha os critérios para concessão do benefício:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
§ 1o Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.
§ 2o Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
§ 3o Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo.(Destacamos).
§ 4o O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo os da assistência médica e da pensão especial de natureza indenizatória.
§ 5o A condição de acolhimento em instituições de longa permanência não prejudica o direito do idoso ou da pessoa com deficiência ao benefício de prestação continuada.
§ 6º A concessão do benefício ficará sujeita à avaliação da deficiência e do grau de impedimento de que trata o § 2o, composta por avaliação médica e avaliação social realizadas por médicos peritos e por assistentes sociais do Instituto Nacional de Seguro Social - INSS
§ 7o Na hipótese de não existirem serviços no município de residência do beneficiário, fica assegurado, na forma prevista em regulamento, o seu encaminhamento ao município mais próximo que contar com tal estrutura.
§ 8o A renda familiar mensal a que se refere o § 3o deverá ser declarada pelo requerente ou seu representante legal, sujeitando-se aos demais procedimentos previstos no regulamento para o deferimento do pedido.
§ 9o Os rendimentos decorrentes de estágio supervisionado e de aprendizagem não serão computados para os fins de cálculo da renda familiar per capita a que se refere o § 3o deste artigo.
§ 10. Considera-se impedimento de longo prazo, para os fins do § 2o deste artigo, aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos.
§ 11. Para concessão do benefício de que trata o caput deste artigo, poderão ser utilizados outros elementos probatórios da condição de miserabilidade do grupo familiar e da situação de vulnerabilidade, conforme regulamento.
A pretensão nos autos de origem é a concessão do benefício assistencial previsto na Lei nº 8.742/93 e o termo de curatela, ou a ação de interdição, não são requisitos para a concessão do benefício pretendido, conforme já explicitado.
Reportando-me, ainda, aos autos de origem, Verifica-se, ainda, que o laudo pericial atesta que a agravante possui Déficit Intelectual Moderado (CID 10 F71) e Epilepsia (CID 10 G40), no entanto, os quesitos 7 e 9 atestam autonomia no autocuidado, vontade própria e capacidade de responder pelos seus próprios atos.
Na hipótese, o fato de a agravante possuir limitações de natureza intelectual e doença neurológica não significa, propriamente, estar inabilitada para a prática de todos os atos da vida civil, de modo que se apresenta descabida a exigência de exibição de termo de curatela, ou abertura de processo de interdição, como condição para estar em juízo. Dispor de forma contrária destoa de toda a produção jurídica no sentido de conferir à pessoa com deficiência autonomia e dignidade.
A propósito, nesse sentido, confira-se Jurisprudência desta Corte:
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. RECADASTRAMENTO ANUAL. APRESENTAÇÃO DE TERMO DE CURATELA. DESNECESSIDADE. IMPOSIÇÃO DE REQUISITO NÃO PREVISTO EM LEI. ARBITRARIEDADE. CURATELA. INSTITUTO PROTETIVO EXTRAORDINÁRIO E TEMPORÁRIO. PRESERVAÇÃO DA AUTONOMIA E DA DIGNIDADE DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA. APELO DESPROVIDO. 1. Visa o autor, ex-servidor do Supremo Tribunal Federal, à declaração de nulidade do ato administrativo que exige, no ato de recadastramento anual, o termo de curatela como pressuposto para a continuidade do pagamento de seus proventos. 2. O artigo 56, § 3º da Orientação Normativa MPS/SPS nº 2/2009 dispõe que o pagamento do benefício de invalidez decorrente de doença mental será feito ao curador do segurado, condicionado à apresentação do termo de curatela. Todavia a Lei 9.527/1997, que, em seu artigo 9º, dispôs sobre a necessidade de recadastramento anual dos aposentados e pensionistas, nada previu acerca da necessidade de apresentação de termo de curatela para os aposentados por invalidez com o mencionado diagnóstico, do que se pode concluir que a regulamentação do tema inovou ilegalmente no ordenamento jurídico, prevendo requisitos não dispostos na lei de regência. Ademais, tal previsão normativa deve ser interpretada à luz do novo tratamento dado pelo ordenamento jurídico à pessoa com deficiência, o qual busca, nos termos do artigo 1º da Lei Brasileira de Inclusão Lei 13.146/2015, assegurar e promover, em igualdade de condições, o exercício dos direitos e liberdades fundamentais pela pessoa com deficiência, objetivando sua inclusão social e sua cidadania. 3. Consoante disposto nos artigos 84, § 3º e 85, § 2º, da Lei 13.146/2015, a curatela constitui medida protetiva extraordinária, proporcional às necessidades e circunstâncias de cada caso, devendo durar o menor tempo possível. Além disso, deverão constar da sentença as razões e motivações da definição da curatela, preservando-se os interesses do curatelado. Entender como pressuposto para o recadastramento do aposentado por invalidez a apresentação de um termo de curatela, instituto previsto no ordenamento jurídico como algo excepcional e temporário, a ser fixado de forma proporcional às necessidades do curatelado, é ir na contramão de toda a construção legislativa que buscou conferir autonomia e dignidade à pessoa com deficiência. 4. Despicienda a apresentação de termo de curatela pelo autor a fim de que continue a perceber o benefício de aposentadoria por invalidez, concedido em 31.08.1993, mormente ao se considerar que a incapacidade para certos atos da vida civil não encontra relação necessária com a invalidez para o exercício do cargo público. Precedentes desta Corte. 5. Apelação e remessa oficial desprovidas.
(TRF-1 - AC: 00345632520094013400, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO LUIZ DE SOUSA, Data de Julgamento: 25/08/2022, 2ª Turma, Data de Publicação: PJe 25/08/2022 PAG PJe 25/08/2022 PAG).
Não restou demonstrado que a agravante possui incapacidade que a impossibilite de litigar sozinha e de receber o benefício.
Face ao exposto, dou provimento ao agravo de instrumento para afastar a necessidade de termo de curatela ou abertura de processo de interdição, devendo o Juízo de origem dar seguimento ao pleito na forma da lei.
É como voto.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
Gab. 03 - DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO ALBERNAZ
Processo Judicial Eletrônico
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) 1046456-20.2023.4.01.0000
AGRAVANTE: EDMEA DE ALMEIDA RAMOS SANTOS
Advogado do(a) AGRAVANTE: LAINA TAINA PRAZERES CONCEICAO - BA60490-A
AGRAVADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. BPC. LOAS. JUNTADA DE TERMO DE CURATELA OU ABERTURA DE PROCESSO DE INTERDIÇÃO. IMPOSIÇÃO DE REQUISITO NÃO PREVISTO EM LEI. PRESERVAÇÃO DA AUTONOMIA E DA DIGNIDADE DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA. AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO.
1. O direito ao benefício assistencial, previsto no art. 203, V, da Constituição Federal e nos arts. 20 e 21 da Lei 8.742/93 (Lei Orgânica da Assistência Social - LOAS), pressupõe o preenchimento de dois requisitos: a) condição de pessoa com deficiência ou idosa (com mais de 65 anos) e b) situação de risco social, ou seja, de miserabilidade ou de desamparo. O referido art. 20 da LOAS detalha os critérios para concessão do benefício: (...) § 2o Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. § 3o Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. (Destacamos) (...).
2. A pretensão nos autos de origem é a concessão do benefício assistencial previsto na Lei nº 8.742/93 e o termo de curatela, ou a ação de interdição, não são requisitos para a concessão do benefício pretendido, conforme já explicitado. Verifica-se, ainda, que o laudo pericial atesta que a agravante possui Déficit Intelectual Moderado (CID 10 F71) e Epilepsia (CID 10 G40), no entanto, os quesitos 7 e 9 atestam autonomia no autocuidado, vontade própria e capacidade de responder pelos seus próprios atos. Na hipótese, o fato de a agravante possuir limitações de natureza intelectual e doença neurológica não significa, propriamente, estar inabilitada para a prática de todos os atos da vida civil, de modo que se apresenta descabida a exigência de exibição de termo de curatela, ou abertura de processo de interdição, como condição para estar em juízo. Dispor de forma contrária destoa de toda a produção jurídica no sentido de conferir à pessoa com deficiência autonomia e dignidade.
3. Confira-se Jurisprudência desta Corte: ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. RECADASTRAMENTO ANUAL. APRESENTAÇÃO DE TERMO DE CURATELA. DESNECESSIDADE. IMPOSIÇÃO DE REQUISITO NÃO PREVISTO EM LEI. ARBITRARIEDADE. CURATELA. INSTITUTO PROTETIVO EXTRAORDINÁRIO E TEMPORÁRIO. PRESERVAÇÃO DA AUTONOMIA E DA DIGNIDADE DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA. APELO DESPROVIDO. 1. Visa o autor, ex-servidor do Supremo Tribunal Federal, à declaração de nulidade do ato administrativo que exige, no ato de recadastramento anual, o termo de curatela como pressuposto para a continuidade do pagamento de seus proventos. 2. O artigo 56, § 3º da Orientação Normativa MPS/SPS nº 2/2009 dispõe que o pagamento do benefício de invalidez decorrente de doença mental será feito ao curador do segurado, condicionado à apresentação do termo de curatela. Todavia a Lei 9.527/1997, que, em seu artigo 9º, dispôs sobre a necessidade de recadastramento anual dos aposentados e pensionistas, nada previu acerca da necessidade de apresentação de termo de curatela para os aposentados por invalidez com o mencionado diagnóstico, do que se pode concluir que a regulamentação do tema inovou ilegalmente no ordenamento jurídico, prevendo requisitos não dispostos na lei de regência. Ademais, tal previsão normativa deve ser interpretada à luz do novo tratamento dado pelo ordenamento jurídico à pessoa com deficiência, o qual busca, nos termos do artigo 1º da Lei Brasileira de Inclusão Lei 13.146/2015, assegurar e promover, em igualdade de condições, o exercício dos direitos e liberdades fundamentais
pela pessoa com deficiência, objetivando sua inclusão social e sua cidadania. 3. Consoante disposto nos artigos 84, § 3º e 85, § 2º, da Lei 13.146/2015, a curatela constitui medida protetiva extraordinária, proporcional às necessidades e circunstâncias de cada caso, devendo durar o menor tempo possível. Além disso, deverão constar da sentença as razões e motivações da definição da curatela, preservando-se os interesses do curatelado. Entender como pressuposto para o recadastramento do aposentado por invalidez a apresentação de um termo de curatela, instituto previsto no ordenamento jurídico como algo excepcional e temporário, a ser fixado de forma proporcional às necessidades do curatelado, é ir na contramão de toda a construção legislativa que buscou conferir autonomia e dignidade à pessoa com deficiência. 4. Despicienda a apresentação de termo de curatela pelo autor a fim de que continue a perceber o benefício de aposentadoria por invalidez, concedido em 31.08.1993, mormente ao se considerar que a incapacidade para certos atos da vida civil não encontra relação necessária com a invalidez para o exercício do cargo público. Precedentes desta Corte. 5. Apelação e remessa oficial desprovidas. (TRF-1 - AC: 00345632520094013400, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO LUIZ DE SOUSA, Data de Julgamento: 25/08/2022, 2ª Turma, Data de Publicação: PJe 25/08/2022 PAG PJe 25/08/2022 PAG).
4. Não restou demonstrado, no caso concreto, que a agravante possui incapacidade que a impossibilite de litigar sozinha e de receber o benefício.
5. Agravo de instrumento provido para afastar a necessidade de termo de curatela ou abertura de processo de interdição, devendo o Juízo de origem dar seguimento ao pleito na forma da lei.
ACÓRDÃO
Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do voto do Relator.
Brasília/DF.
Desembargador Federal MARCELO ALBERNAZ
Relator