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ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL (INSS). EQUÍVOCO NA CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. PEDIDO DE ALTERAÇÃO DA ESPÉ...

Data da publicação: 21/12/2024, 23:22:32

ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL (INSS). EQUÍVOCO NA CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. PEDIDO DE ALTERAÇÃO DA ESPÉCIE DE BENEFÍCIO PARA ACIDENTÁRIO. LEGITIMIDADE PASSIVA DO INSS CONFIGURADA. TEORIA DA ASSERÇÃO. PREJUDICIAL DE PRESCRIÇÃO REJEITADA. MORA INJUSTIFICADA E EXCESSIVA NA APRECIAÇÃO DO PEDIDO ADMINISTRATIVO. DANO MORAL CONFIGURADO. 1. A questão controvertida diz respeito a ocorrência de danos morais em razão do errôneo enquadramento do benefício previdenciário concedido ao autor como auxílio-doença, convertido posteriormente em aposentadoria por invalidez, e demora na retificação para o benefício correto, qual seja, aposentadoria decorrente de acidente de trabalho. 2. O Superior Tribunal de Justiça considera, majoritariamente, que "as condições da ação, incluída a legitimidade, devem ser aferidas com base na teoria da asserção, isto é, à luz das afirmações deduzidas na petição inicial" (cf. REsp 1.834.003/SP, Terceira Turma, da relatoria do ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, DJe 20/9/2019). Dessa feita, considerando a imputação de ato ilícito ao Inss na inicial, evidenciada a legitimidade deste para responder à referida afirmação, sendo a procedência ou não do pedido questão atinente ao mérito, devendo como tal ser tratada. Preliminar rejeitada. 3. No que se refere ao decurso do prazo prescricional, cumpre consignar que o Superior Tribunal de Justiça firmou o posicionamento de que a prescrição quinquenal, prevista no art. 1.º do Decreto 20.910/32, deve ser aplicada a todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda Pública, seja ela federal, estadual ou municipal, independentemente da natureza da relação jurídica estabelecida entre a Administração Pública e o particular. Nesse contexto, o termo a quo do prazo quinquenal para o ajuizamento de ação de indenização contra ato do Estado, por dano moral, é a data da ciência inequívoca dos efeitos decorrentes do ato lesivo. Nada a alterar, portanto, no entendimento adotado pelo Julgador a quo, pois a manifestação da autarquia, no âmbito administrativo, alterando a espécie do benefício anteriormente concedido, foi proferida em 13/06/2017, incidindo, no caso, o art. 1.º do Decreto 20.910/32, de modo que não está fulminada pelo decurso do lapso prescricional a pretensão indenizatória proposta em 07/05/2020, ou seja, há menos de 5 (cinco) anos do ato que se reputa causador do dano moral buscado. Jurisprudência selecionada. 4. Impende consignar que a responsabilidade do Estado decorre da teoria objetiva, consagrada no art. 37, § 6.º, da Constituição Federal, com base no risco administrativo, o qual prevê a obrigação de indenizar, independentemente de culpa ou dolo, desde que comprovado o nexo de causalidade entre o dano e o ato do agente. Noutra toada, conferindo exegese à norma constitucional, a orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça firmou-se na direção de que, em respeito aos princípios constitucionais da legalidade, moralidade, eficiência e razoável duração do processo (CF/88, arts. 37, caput, e 5.º, inciso LXXVIII), a demora desarrazoada da Administração para apreciar processo administrativo legitima ao Poder Judiciário a fixar, inclusive, se for o caso, prazo para a conclusão do procedimento. Demora essa que configura verdadeira situação de abuso de direito. Jurisprudência selecionada. 5. O dever de ressarcir os danos, inclusive morais, causados pela inadequação ou falha na prestação de serviços públicos, por omissão estatal, decorre diretamente do art. 37, § 6.º, da Carta Constitucional, bastando, para a sua configuração, a comprovação do dano, do nexo de causalidade e da deficiência na prestação do serviço. Ainda, não é demais lembrar que o nexo de causalidade somente excluirá a responsabilidade civil quando verificada a culpa exclusiva ou fato exclusivo da vítima, culpa exclusiva ou fato exclusivo de terceiro ou o caso fortuito ou força maior. Precedentes do STF. 6. Na concreta situação dos autos, a análise da documentação que instrui a lide revela que, em 11/02/2011, a parte autora foi vítima de disparo de arma de fogo durante assalto ocorrido no ônibus em que viajava de retorno à sua residência, sendo certo que, naquela mesma data, foi emitida Comunicação de Acidente de Trabalho, a qual, desde o requerimento inicial de concessão do benefício, foi apresentada ao Inss. Ocorre que a autarquia equivocadamente concedeu o benefício de auxílio-doença e, posteriormente, o converteu em aposentadoria por invalidez. O pedido de alteração da espécie do benefício foi formulado em 17/06/2011, mas somente apreciado em 29/04/2016 e, finalmente, levado a efeito em 13/06/2017. Constata-se, portanto, que o demandado levou praticamente 6 (seis) anos para promover a conversão da aposentadoria por invalidez em espécie acidentária, sem nenhum motivo a justificar tamanha demora. 7. É imperioso reconhecer que a demora ocorrida desde o pedido de retificação, no âmbito administrativo, até final solução foi demasiadamente prolongada e sem a apresentação, por parte da autarquia, de justificativa razoável a amparar o considerável tempo decorrido para a adoção de medida que não pode ser considerada complexa. Há nítida responsabilidade da autarquia a ensejar a reparação dos danos causados, estando presente o nexo entre o ilícito perpetrado e o dano, esse configurado pelo abalo psicológico sofrido pela parte autora ao se ver privada da indenização pelo empregador em razão da demora injustiçada da autarquia previdenciária. 8. Quanto aos honorários advocatícios, sua vez fixação ocorreu dentro do valor mínimo estabelecido pelos §§ 2.º e 3.º do inciso I do art. 85 do CPC/2015, motivo pelo qual é impossível sua redução. 9. Quanto ao índice de correção monetária da condenação, o Manual de Cálculos da Justiça Federal é instrumento eficaz de aplicação dos corretos índices, inclusive com observância quanto ao decidido no julgamento do RE 870.947/SE, submetido ao rito da repercussão geral (Tema 810), pelo Supremo Tribunal Federal, e do REsp 1.495.146/MG, em sede de recurso repetitivo (Tema 905) pelo Superior Tribunal de Justiça, não existindo qualquer prova em contrário. 10. Apelação não provida. 11. Nos termos do art. 85, § 11, do CPC/2015, majorados os honorários advocatícios em desfavor da parte recorrente em 10% (dez por cento) sobre o valor já arbitrado na instância de origem, observados, se aplicáveis, os limites percentuais previstos nos §§ 2.º e 3.º do referido dispositivo legal. (TRF 1ª Região, SEXTA TURMA, APELAÇÃO CIVEL (AC) - 1019308-33.2020.4.01.3300, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL JOAO CARLOS MAYER SOARES, julgado em 18/09/2024, DJEN DATA: 18/09/2024)

Brasão Tribunal Regional Federal
JUSTIÇA FEDERAL
Tribunal Regional Federal da 1ª Região

PROCESSO: 1019308-33.2020.4.01.3300  PROCESSO REFERÊNCIA: 1019308-33.2020.4.01.3300
CLASSE: APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728)

POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:ARSENIO MARCOS DOS SANTOS
REPRESENTANTE(S) POLO PASSIVO: CIDIA DAYARA VIEIRA SILVA DA CONCEICAO - BA47564-A

RELATOR(A):JOAO CARLOS MAYER SOARES


Brasão Tribunal Regional Federal

PODER JUDICIÁRIO

Tribunal Regional Federal da Primeira Região

Gab. 18 - DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO CARLOS MAYER

Processo Judicial Eletrônico


APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728)  n. 1019308-33.2020.4.01.3300

R E L A T Ó R I O


O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO CARLOS MAYER SOARES (RELATOR):

Trata-se de recurso de apelação, interposto pelo réu Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), em face de sentença, proferida sob a vigência do CPC/2015, em ação de procedimento comum, na qual foi julgado procedente em parte o pedido de reparação por danos morais e materiais formulado por Arsênio Marcos dos Santos em razão do errôneo enquadramento do benefício previdenciário que lhe foi concedido como auxílio-doença e, posteriormente, aposentadoria por invalidez, ao invés de aposentadoria decorrente de acidente de trabalho.

O Juiz a quo concluiu que o ato ilícito está satisfatoriamente comprovado pela excessiva demora na correção da espécie do benefício sem que tenha sido apresentada nenhuma justificativa razoável, especialmente quando a Comunicação de Acidente de Trabalho já havia sido juntada ao processo administrativo desde o requerimento inicial, tornando injustificável o prazo de 6 (seis) anos para que a autarquia realizasse a transformação do benefício (fls. 193/197).

Na peça recursal (fls. 202/212), a parte apelante afirma, em síntese, sua ilegitimidade passiva, sob o argumento de que o infortúnio, causador da tetraplegia no apelado, ocorreu a bordo de um ônibus, não havendo nenhuma conduta de sua parte que possa ser considerada danosa. Sustenta o decurso do prazo prescricional trienal previsto no art. 206, § 3.º, inciso V, do CC/2202, devendo ser afastada a incidência, na espécie, do art. 1.º do Decreto 20.910/32. Assevera que a reclamação trabalhista poderia ter sido proposta independentemente da alteração da espécie do benefício previdenciário, razão por que não tem nenhuma responsabilidade por eventual prejuízo experimentado pelo recorrido.

Continua e aduz que não ficou configurada hipótese de dano indenizável, pois a simples demora na apreciação do requerimento do benefício previdenciário não dá ensejo ao pleito deduzido. Assevera, ainda, que os honorários advocatícios devem ser fixados no percentual mínimo estabelecido pelo art. 85, §§ 2.º e 3.º, do CPC/2015, com a ressalva da Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça. Por fim, requer o afastamento do Inpc/Ipca-e no caso de manutenção da condenação.

Pugna, ao final, pelo provimento do recurso para reformar a sentença para reconhecer sua ilegitimidade ou prescrição da pretensão ou, quando não, julgar improcedentes os pedidos iniciais. Subsidiariamente, pretende a redução do valor da condenação e dos honorários, bem como a retificação do índice de correção monetária.

Contrarrazões apresentadas (fls. 216/224).

Formulado pedido de prioridade na tramitação do processo em razão de ser portador de doença grave (fls. 234 e 235).

Os autos vieram redistribuídos a esta Seção e Turma em cumprimento a decisão que declinou a competência em razão da matéria (fls. 236 e 237).

É o breve relatório.

  Desembargador Federal JOÃO CARLOS MAYER SOARES

Relator


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Gab. 18 - DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO CARLOS MAYER

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APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728)  n. 1019308-33.2020.4.01.3300

V O T O


O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO CARLOS MAYER SOARES (RELATOR):

Presentes os pressupostos genéricos e específicos de admissibilidade, conheço da apelação para negar-lhe provimento. 

A questão controvertida diz respeito à ocorrência de danos morais em razão do errôneo enquadramento do benefício previdenciário concedido ao autor como auxílio-doença, convertido posteriormente em aposentadoria por invalidez, e demora na retificação para o benefício correto, qual seja, aposentadoria decorrente de acidente de trabalho.

Inicialmente, o Superior Tribunal de Justiça considera, majoritariamente, que "as condições da ação, incluída a legitimidade, devem ser aferidas com base na teoria da asserção, isto é, à luz das afirmações deduzidas na petição inicial"  (cf. REsp 1.834.003/SP, Terceira Turma, da relatoria do ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, DJe 20/9/2019). Dessa feita, considerando a imputação de ato ilícito ao Inss na inicial, evidenciada a legitimidade deste para responder à referida afirmação, sendo a procedência ou não do pedido questão atinente ao mérito, devendo como tal ser tratada.

De mais a mais, reputo que a questão relativa à legitimidade passiva do Instituto Nacional do Seguro Social (Inss) também foi satisfatoriamente apreciada pela magistrada singular, mediante decisão (fls. 184 e 185), ao pontificar que a conduta ilícita apontada como causadora dos danos ao postulante é decorrente da demora excessiva na análise do pedido de transformação do benefício de aposentadoria por invalidez em acidentária.

Rejeito, pois, a preliminar em referência.

No que se refere ao decurso do prazo prescricional, cumpre consignar que o Superior Tribunal de Justiça firmou o posicionamento de que a prescrição quinquenal, prevista no art. 1.º do Decreto 20.910/32, deve ser aplicada a todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda Pública, seja ela federal, estadual ou municipal, independentemente da natureza da relação jurídica estabelecida entre a Administração Pública e o particular. (Cf. AgRg no AREsp 507.161/AP, Primeira Turma, da relatoria do ministro Sérgio Kukina, DJ 27/05/2014; AgRg no AREsp 202.429/AP, Segunda Turma, da relatoria do ministro Herman Benjamin, DJ 12/09/2013; AgRg no Ag 1.397.139/PR, Segunda Turma, da relatoria do ministro Castro Meira, DJ 12/02/2012.)

Nesse contexto, o termo a quo do prazo quinquenal para o ajuizamento de ação de indenização contra ato do Estado, por dano moral, é a data da ciência inequívoca dos efeitos decorrentes do ato lesivo. Nada a alterar, portanto, no entendimento adotado pelo Julgador a quo, pois a manifestação da autarquia, no âmbito administrativo, alterando a espécie do benefício anteriormente concedido, foi proferida em 13/06/2017 (fl. 178), incidindo, no caso, o art. 1.º do Decreto 20.910/32, de modo que não está fulminada pelo decurso do lapso prescricional a pretensão indenizatória proposta em 07/05/2020, ou seja, há menos de 5 anos do ato que reputa-se causador do dano moral buscado e que a parte recorrente busca se eximir do pagamento da reparação. (Cf. TRF4, AC 5079307-81.2015.4.04.7100, Terceira Turma, da relatoria da desembargadora federal Marga Inge Barth Tessler, julgado em 04/07/2018.)

Superadas as questões prefaciais, passo ao exame do mérito recursal.

Impende consignar que a responsabilidade do Estado decorre da teoria objetiva, consagrada no art. 37, § 6.º, da Constituição Federal, com base no risco administrativo, o qual prevê a obrigação de indenizar, independentemente de culpa ou dolo, desde que comprovado o nexo de causalidade entre o dano e o ato do agente. (Cf. STJ, AgInt nos EDcl no REsp 1.428.475/PR, Primeira Turma, da relatoria do ministro Sérgio Kukina, DJ 02/09/2016; EREsp 1.388.822/RN, Primeira Seção, da relatoria do ministro Og Fernandes, DJ 03/06/2015; REsp 1.117.258/PR, Segunda Turma, da relatoria do ministro Herman Benjamin, DJ 11/12/2009.) 

Noutra toada, a Constituição do Brasil preceitua que "a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação" (art. 5.º, inciso LXXVIII). 

Conferindo exegese à norma constitucional, a orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça firmou-se na direção de que, em respeito aos princípios constitucionais da legalidade, moralidade, eficiência e razoável duração do processo (CF/88, arts. 37, caput, e 5.º, inciso LXXVIII), a demora desarrazoada da Administração para apreciar processo administrativo legitima ao Poder Judiciário a fixar, inclusive, se for o caso, prazo para a conclusão do procedimento. Demora essa que configura verdadeira situação de abuso de direito. (Cf. AgRg no Ag 1.393.653/RS, Primeira Turma, da relatoria do ministro Benedito Gonçalves, DJ 10/06/2011; AgRg no Ag 1.353.436/SC, Primeira Turma, da relatoria do ministro Arnaldo Esteves, DJ 24/03/2011; MS 12.701/DF, Terceira Seção, da relatoria da ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJ 03/03/2011; EDcl no AgRg no Ag 1.161.445/RS, Segunda Turma, da relatoria do ministro Mauro Campbell Marques, DJ 24/08/2010; EREsp 1.100.057/RS, Primeira Turma, da relatoria da ministra Eliana Calmon, DJ 10/11/2009.) 

Nesse mesmo sentido, a título exemplificativo, confiram-se os seguintes julgados do Tribunal Regional Federal da 1.ª Região: AC 0006357-33.2007.4.01.3800/MG, Sexta Turma, da relatoria do desembargador federal Jirair Aram Meguerian, DJ 13/08/2013; REOMS 0028178-66.2006.4.01.3400/DF, Sexta Turma, da relatoria do desembargador federal Souza Prudente, DJ 09/06/2008; REOMS 2005.34.00.013527-8/DF, Sexta Turma, da relatoria do desembargador federal Souza Prudente, DJ 12/03/2007. 

Ainda no tema, o entendimento no âmbito do Supremo Tribunal Federal, sob o rito da repercussão geral, aponta que a responsabilidade objetiva prevista no § 6.º do art. 37 da Constituição Federal abrange as condutas omissivas do Poder Público. Assim é que “a omissão do Estado reclama nexo de causalidade em relação ao dano sofrido pela vítima nos casos em que o Poder Público ostenta o dever legal e a efetiva possibilidade de agir para impedir o resultado danoso” (cf. RE 841.526/RS, Tribunal Pleno, da relatoria do ministro Luiz Fux, DJ 1.º/08/2016).  

Com efeito, o dever de ressarcir os danos, inclusive morais, causados pela inadequação ou falha na prestação de serviços públicos, por omissão estatal, decorre diretamente do art. 37, § 6.º, da Carta Constitucional, bastando, para a sua configuração, a comprovação do dano, do nexo de causalidade e da deficiência na prestação do serviço. (Cf. STF, RE 580.252/MS, Tribunal Pleno, relator para o acórdão o ministro Gilmar Mendes, DJ 11/09/2017; RE 990.117-AgR/AC, Primeira Turma, da relatoria da ministra Rosa Weber, DJ 14/12/2016; AI 724.098-AgR-segundo/RJ, Segunda Turma, da relatoria do ministro Teori Zavascki, DJ 29/04/2013; RE 633.138-AgR/DF, Primeira Turma, da relatoria do ministro Luiz Fux, DJ 21/09/2012.) 

Ainda, não é demais lembrar que o nexo de causalidade somente excluirá a responsabilidade civil quando verificada a culpa exclusiva ou fato exclusivo da vítima, culpa exclusiva ou fato exclusivo de terceiro ou o caso fortuito ou força maior. 

Postas tais premissas, a análise da documentação que instrui a lide revela que, em 11/02/2011, a parte autora foi vítima de disparo de arma de fog, durante assalto ocorrido no ônibus em que viajava de retorno à sua residência, ficando paraplégica (fls. 28 e 30/32), sendo certo que, naquela mesma data, foi emitida Comunicação de Acidente de Trabalho (fls. 19 e 166), a qual desde o requerimento inicial de concessão do benefício foi apresentada ao Inss (fl. 24).

Ocorre que a autarquia equivocadamente concedeu o benefício de auxílio-doença e, posteriormente, o converteu em aposentadoria por invalidez (fls. 36/38). O pedido de alteração da espécie do benefício foi formulado em 17/06/2011 (fls. 24 e 165), mas somente apreciado em 29/04/2016 (fls. 172 e 173) e, finalmente, levado a efeito em 13/06/2017 (fl. 178).

Constata-se, portanto, que o demandado levou praticamente 6 (seis) anos para promover a conversão da aposentadoria por invalidez em espécie acidentária, sem nenhum motivo a justificar tamanha demora.

Não se desconhece o entendimento deste Tribunal no sentido de que a Administração tem o poder-dever de decidir os assuntos de sua competência e de rever seus atos, pautada sempre nos princípios que regem a atividade administrativa, sem que a demora não prolongada no exame do pedido, a sua negativa ou a adoção de entendimento diverso do interessado, com razoável fundamentação, importe em dano moral ao administrado.

No caso, porém, é imperioso reconhecer que a demora ocorrida desde o pedido de retificação, no âmbito administrativo, até final solução foi demasiadamente prolongada e sem a apresentação, por parte da autarquia, de justificativa razoável a amparar o considerável tempo decorrido para a adoção de medida que não pode ser considerada complexa.

A questão foi apreciada com acuidade pelo magistrado sentenciante ao fundamentar (fl. 195):

Para a caracterização da responsabilidade, faz-se necessária a existência de três elementos: o ato ilícito, a ocorrência do dano moral e/ou patrimonial certo e efetivo, e, o nexo de causalidade entre o dano e o comportamento do agente (causalidade direta e imediata). Além disso, é preciso que não concorra nenhuma das causas de exclusão da ilicitude ou a culpa exclusiva da vítima.

O ato ilícito está comprovado nos autos pela excessiva demora na correção da espécie do benefício por incapacidade do autor sem qualquer justificativa razoável, haja vista que a CAT já havia sido juntado ao processo administrativo desde o requerimento inicial e, mesmo o autor tendo pedido a correção, o INSS levou inexplicáveis seis anos para fazer a transformação do benefício (id 231231410 e id 231224891).

Embora não se negue que a Administração Pública tenha que se ater a procedimentos para a classificação de benefícios em acidentários e previdenciários, não restou comprovada qualquer justificativa para a demora na transformação e correção da espécie do benefício.

O dano moral, no caso, dispensa maiores elucubrações, porquanto é evidente o abalo psicológico sofrido pela parte autora ao se ver privado da indenização pelo empregador em razão da demora injustiçada da autarquia previdenciária. O sentimento de insegurança, frustração e revolta é patente.

Também restou comprovado o nexo causal entre a conduta do INSS e o dano do demandante.

Resta analisar se ocorreu uma das excludentes (exercício regular de um direito e estrito cumprimento do dever legal).

Não se pode dizer que a conduta da Administração neste caso está amparada por nenhuma das duas excludentes acima.

Isto porque se trata de erro grave da Administração que indica que a CAT já se encontrava no requerimento administrativo e classificou o benefício como acidentário e mesmo depois do pedido de correção do autor levou mais seis anos para corrigir a espécie de benefício provocando imenso abalo psicológico e prejuízo financeiro ao segurado, que já se encontrava com a saúde debilidade pela sequela do acidente do qual fora vítima ocasionando a perda da sua capacidade motora.

Tais fundamentos, aos quais também adiro, devem prevalecer, havendo nítida responsabilidade da autarquia a ensejar a reparação dos danos causados, estando presente o nexo entre o ilícito perpetrado e o dano, esse configurado pelo abalo psicológico sofrido pela parte autora ao se ver privada da indenização pelo empregador em razão da demora injustiçada da autarquia previdenciária.

No que diz respeito aos honorários advocatícios, nada a alterar, vez que a fixação do valor ocorreu dentro do valor mínimo estabelecido pelos §§ 2.º e 3.º do inciso I do art. 85 do CPC/2015.

Por fim, quanto ao índice de correção monetária da condenação, o Manual de Cálculos da Justiça Federal é instrumento eficaz de aplicação dos corretos índices, inclusive com observância quanto ao decidido no julgamento do RE 870.947/SE, submetido ao rito da repercussão geral (Tema 810), pelo Supremo Tribunal Federal, e do REsp 1.495.146/MG, em sede de recurso repetitivo (Tema 905) pelo Superior Tribunal de Justiça, não existindo qualquer prova em contrário.

Portanto, verifica-se que a sentença julgou adequadamente a situação em concreto e não merece qualquer reparo.

À vista do exposto, nego provimento à apelação.

Nos termos do art. 85, § 11, do CPC/2015, majoro os honorários advocatícios em desfavor da parte recorrente em 10% (dez por cento) sobre o valor já arbitrado na instância de origem, observados, se aplicáveis, os limites percentuais previstos nos §§ 2.º e 3.º do referido dispositivo legal.

É como voto.

Desembargador Federal JOÃO CARLOS MAYER SOARES

Relator

 


Brasão Tribunal Regional Federal

PODER JUDICIÁRIO

Tribunal Regional Federal da Primeira Região

Gab. 18 - DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO CARLOS MAYER

Processo Judicial Eletrônico


PROCESSO: 1019308-33.2020.4.01.3300

PROCESSO REFERÊNCIA: 1019308-33.2020.4.01.3300

CLASSE: APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) 

POLO ATIVO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
POLO PASSIVO:ARSENIO MARCOS DOS SANTOS
REPRESENTANTES POLO PASSIVO: CIDIA DAYARA VIEIRA SILVA DA CONCEICAO - BA47564-A


E M E N T A

 

ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL (INSS). EQUÍVOCO NA CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. PEDIDO DE ALTERAÇÃO DA ESPÉCIE DE BENEFÍCIO PARA ACIDENTÁRIO. LEGITIMIDADE PASSIVA DO INSS CONFIGURADA. TEORIA DA ASSERÇÃO. PREJUDICIAL DE PRESCRIÇÃO REJEITADA. MORA INJUSTIFICADA E EXCESSIVA NA APRECIAÇÃO DO PEDIDO ADMINISTRATIVO. DANO MORAL CONFIGURADO.

1. A questão controvertida diz respeito a ocorrência de danos morais em razão do errôneo enquadramento do benefício previdenciário concedido ao autor como auxílio-doença, convertido posteriormente em aposentadoria por invalidez, e demora na retificação para o benefício correto, qual seja, aposentadoria decorrente de acidente de trabalho.

2. O Superior Tribunal de Justiça considera, majoritariamente, que "as condições da ação, incluída a legitimidade, devem ser aferidas com base na teoria da asserção, isto é, à luz das afirmações deduzidas na petição inicial"  (cf. REsp 1.834.003/SP, Terceira Turma, da relatoria do ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, DJe 20/9/2019). Dessa feita, considerando a imputação de ato ilícito ao Inss na inicial, evidenciada a legitimidade deste para responder à referida afirmação, sendo a procedência ou não do pedido questão atinente ao mérito, devendo como tal ser tratada. Preliminar rejeitada.

3. No que se refere ao decurso do prazo prescricional, cumpre consignar que o Superior Tribunal de Justiça firmou o posicionamento de que a prescrição quinquenal, prevista no art. 1.º do Decreto 20.910/32, deve ser aplicada a todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda Pública, seja ela federal, estadual ou municipal, independentemente da natureza da relação jurídica estabelecida entre a Administração Pública e o particular. Nesse contexto, o termo a quo do prazo quinquenal para o ajuizamento de ação de indenização contra ato do Estado, por dano moral, é a data da ciência inequívoca dos efeitos decorrentes do ato lesivo. Nada a alterar, portanto, no entendimento adotado pelo Julgador a quo, pois a manifestação da autarquia, no âmbito administrativo, alterando a espécie do benefício anteriormente concedido, foi proferida em 13/06/2017, incidindo, no caso, o art. 1.º do Decreto 20.910/32, de modo que não está fulminada pelo decurso do lapso prescricional a pretensão indenizatória proposta em 07/05/2020, ou seja, há menos de 5 (cinco) anos do ato que se reputa causador do dano moral buscado. Jurisprudência selecionada.

4. Impende consignar que a responsabilidade do Estado decorre da teoria objetiva, consagrada no art. 37, § 6.º, da Constituição Federal, com base no risco administrativo, o qual prevê a obrigação de indenizar, independentemente de culpa ou dolo, desde que comprovado o nexo de causalidade entre o dano e o ato do agente. Noutra toada, conferindo exegese à norma constitucional, a orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça firmou-se na direção de que, em respeito aos princípios constitucionais da legalidade, moralidade, eficiência e razoável duração do processo (CF/88, arts. 37, caput, e 5.º, inciso LXXVIII), a demora desarrazoada da Administração para apreciar processo administrativo legitima ao Poder Judiciário a fixar, inclusive, se for o caso, prazo para a conclusão do procedimento. Demora essa que configura verdadeira situação de abuso de direito. Jurisprudência selecionada.

5. O dever de ressarcir os danos, inclusive morais, causados pela inadequação ou falha na prestação de serviços públicos, por omissão estatal, decorre diretamente do art. 37, § 6.º, da Carta Constitucional, bastando, para a sua configuração, a comprovação do dano, do nexo de causalidade e da deficiência na prestação do serviço. Ainda, não é demais lembrar que o nexo de causalidade somente excluirá a responsabilidade civil quando verificada a culpa exclusiva ou fato exclusivo da vítima, culpa exclusiva ou fato exclusivo de terceiro ou o caso fortuito ou força maior. Precedentes do STF.

6. Na concreta situação dos autos, a análise da documentação que instrui a lide revela que, em 11/02/2011, a parte autora foi vítima de disparo de arma de fogo durante assalto ocorrido no ônibus em que viajava de retorno à sua residência, sendo certo que, naquela mesma data, foi emitida Comunicação de Acidente de Trabalho, a qual, desde o requerimento inicial de concessão do benefício, foi apresentada ao Inss. Ocorre que a autarquia equivocadamente concedeu o benefício de auxílio-doença e, posteriormente, o converteu em aposentadoria por invalidez. O pedido de alteração da espécie do benefício foi formulado em 17/06/2011, mas somente apreciado em 29/04/2016 e, finalmente, levado a efeito em 13/06/2017. Constata-se, portanto, que o demandado levou praticamente 6 (seis) anos para promover a conversão da aposentadoria por invalidez em espécie acidentária, sem nenhum motivo a justificar tamanha demora.

7. É imperioso reconhecer que a demora ocorrida desde o pedido de retificação, no âmbito administrativo, até final solução foi demasiadamente prolongada e sem a apresentação, por parte da autarquia, de justificativa razoável a amparar o considerável tempo decorrido para a adoção de medida que não pode ser considerada complexa. Há nítida responsabilidade da autarquia a ensejar a reparação dos danos causados, estando presente o nexo entre o ilícito perpetrado e o dano, esse configurado pelo abalo psicológico sofrido pela parte autora ao se ver privada da indenização pelo empregador em razão da demora injustiçada da autarquia previdenciária.

8. Quanto aos honorários advocatícios, sua vez fixação ocorreu dentro do valor mínimo estabelecido pelos §§ 2.º e 3.º do inciso I do art. 85 do CPC/2015, motivo pelo qual é impossível sua redução.

9. Quanto ao índice de correção monetária da condenação, o Manual de Cálculos da Justiça Federal é instrumento eficaz de aplicação dos corretos índices, inclusive com observância quanto ao decidido no julgamento do RE 870.947/SE, submetido ao rito da repercussão geral (Tema 810), pelo Supremo Tribunal Federal, e do REsp 1.495.146/MG, em sede de recurso repetitivo (Tema 905) pelo Superior Tribunal de Justiça, não existindo qualquer prova em contrário.

10. Apelação não provida.

11. Nos termos do art. 85, § 11, do CPC/2015, majorados os honorários advocatícios em desfavor da parte recorrente em 10% (dez por cento) sobre o valor já arbitrado na instância de origem, observados, se aplicáveis, os limites percentuais previstos nos §§ 2.º e 3.º do referido dispositivo legal.

A C Ó R D Ã O

Decide a Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 1.ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do voto do Relator. 

Brasília/DF, 7 de fevereiro de 2024.

Desembargador Federal JOÃO CARLOS MAYER SOARES

Relator

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